Juíza suspende decisão do INPI que negou registro de marca de posição à Louboutin
17 de agosto de 2023, 9h48
Por constatar a plausibilidade da distintividade do registro, a juíza Márcia Maria Nunes de Barros, da 13ª Vara Federal do Rio de Janeiro, determinou, em liminar, a suspensão da decisão administrativa do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) que negou o registro de marca de posição para o solado vermelho dos sapatos de salto alto da grife francesa Christian Louboutin.

de salto alto como sua marca de posiçãoReprodução
Marca de posição é "todo sinal distintivo, visualmente perceptível, que consiste na maneira específica como é aposto em determinado suporte", conforme explica a advogada Rafaela Borges Carneiro, sócia do escritório Dannemann Siemsen, especializado em Propriedade Intelectual (PI), que atuou no caso. Assim, "quanto maior for a singularidade da posição da marca no produto, maior será o grau de distintividade alcançado".
Histórico
O solado vermelho do calçado foi concebido pelo estilista e designer francês Christian Louboutin em 1992. Até então, os solados tradicionalmente tinham cores opacas, principalmente preto e bege.
A empresa registrante e licenciante do portfólio de PI da Louboutin pediu o registro de marca de posição para proteger um tom específico de vermelho na posição do solado de seus calçados, com exceção da área correspondente ao salto.
Segundo a grife, o solado vermelho já é memorizável e reconhecido em todo o planeta à primeira vista como um símbolo de "singularidade, identidade, exclusividade e requinte" da Louboutin, pois a cor está disposta de modo peculiar e distintivo.
Mesmo assim, no último mês de maio o INPI negou o registro da marca de posição, pois não constatou o requisito da distintividade do sinal aplicado, presente no seu Manual de Marcas.
Na sequência, a Louboutin acionou a Justiça alegando falta de fundamentação da decisão administrativa. Segundo a grife, o INPI não se aprofundou ao explicar como a aplicação do sinal se daria no caso concreto. A empresa também alegou que o solado vermelho já se tornou característico, devido ao seu sucesso e uso efetivo, prolongado e consistente.
A Louboutin é representada no processo por Rafaela Carneiro, pela sócia Roberta Fonteles Cabral e pelo advogado Caio Richa de Ribeiro, todos do Dannemann Siemsen.
Fundamentos
A juíza Márcia de Barros destacou que a marca pretendida é formada pela aplicação de um sinal em uma posição singular e específica de um suporte, não associada a "qualquer efeito técnico ou funcional".
A magistrada também notou que a cor não ocupa todo o suporte (o sapato), mas, sim, uma posição específica (o solado, com exceção da área correspondente ao salto). Além disso, o solado do sapato não é uma posição tradicionalmente usada para a aplicação de marcas.
Para ela, o conjunto resultante da aplicação do vermelho em solados de sapatos femininos de salto alto "apresenta, em princípio, potencial distintivo, reunindo características que o tornam capaz de ser reconhecido pelo público consumidor e associado aos produtos que visa assinalar".

Na visão de Márcia, "é de conhecimento público" que a cor vermelha para solados de sapatos do tipo vem sendo amplamente usado pela Louboutin como uma forma de identidade visual de seus produtos. Segundo ela, tal recurso é reconhecido não só pelo público consumidor de artigos de luxo, mas também de todos que têm interesse no mercado de moda e acessórios, em Direito de Marcas, em Direito da Moda e no mundo das celebridades.
Por fim, a juíza ressaltou que a Louboutin já tem registros de marca de posição em diversos países, como França, Estados Unidos, Canadá, México, Reino Unido, Índia, Rússia, Peru e tantos outros, além do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia e da Organização Mundial da Propriedade Intelectual.
Por outro lado, a magistrada lembrou que "uma eventual apropriação indiscriminada de cores para solados de sapato" pode causar malefícios para o sistema, devido à proibição de que usuários anteriores continuem a exercer usos legítimos e à ausência de cores em domínio público para uso pelos concorrentes. A juíza argumentou que tal questão deve ser examinada no julgamento de mérito.
Inovação no Brasil
As marcas de posição são mais comuns no mundo da moda, embora não estejam vinculadas apenas a esse segmento de mercado. A possibilidade de registro de um sinal distintivo em uma posição específica foi regulamentada no Brasil somente em 2021, por meio de uma portaria do INPI.
Mesmo assim, o primeiro pedido de registro de marca de posição no país só foi deferido pelo INPI no último mês de maio: os três furos na parte frontal dos tênis da empresa Osklen.
O advogado Luciano Andrade Pinheiro, especialista em PI e sócio do escritório Corrêa da Veiga Advogados, concorda que a cor vermelha no solado do calçado feminino se tornou uma característica própria da Louboutin.
Segundo Pinheiro, "o INPI deve seguir rigorosamente as normas legais e as que ele mesmo expede", enquanto "o Poder Judiciário tem como prerrogativa a análise mais abrangente das questões de PI". Assim, ele entende "que é preciso elevar a discussão sobre signos, consumo e concorrência", pois "a criatividade das empresas em se distinguir no mercado deve ser valorizada".
Já Rafaela Carneiro aponta que o pedido de registro da Louboutin busca proteger a exibição de uma coloração "em apresentação evidentemente não usual e não funcional", que "guarda inegável caráter distintivo".
Segundo ela, a aplicação do vermelho nesses solados "diverge significativamente dos hábitos e costumes da indústria de calçados e é totalmente arbitrária", além de "percebida pelo público relevante como uma indicação de origem vinculada a Christian Louboutin, distinguindo os seus produtos daqueles de outros concorrentes no mercado e exercendo função marcária".
Assim, na sua visão, a liminar "enfatiza a importância da proteção às marcas não tradicionais e está, portanto, alinhada com a tendência do consumidor de reconhecer tais marcas não tradicionais como verdadeiras fontes de origem".
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Processo 5082257-22.2023.4.02.5101
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