Carta de Pirenópolis traz novos enunciados sobre segurança pública
17 de maio de 2022, 8h04
Eventos científicos podem ser vistos como verdadeiras feiras cognitivas, lugares onde são apresentados e construídos produtos intelectivos [1]. A participação em congressos colabora para o desenvolvimento do pensamento crítico do pesquisador, o qual envolve a "capacidade de analisar ideias ou factos de forma objetiva, racional e lógica, de forma a deduzir respostas ou soluções racionais" [2].
O evento contou participação de congressistas e de professores de todo o país: Gabriel Habib (advogado e ex-defensor público federal), Nestor Távora (advogado e ex-defensor público estadual), Fábio Roque (juiz federal), Ivana David (desembargadora estadual), Henrique Hoffmann (delegado de polícia estadual), Adriano Costa (delegado de polícia estadual) e Eduardo Fontes (delegado de polícia federal). Além de exercerem variados papeis no sistema de justiça criminal, os professores são autores de literatura específica na área, a saber, o livro "Segurança Pública" [3].
No prefácio dessa obra, Samira Bueno (Doutora pela FGV e Diretora-Executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública) registrou a importância de estudos propositivos e que abordem o tema não exclusivamente com base no Direito, mas também da Ciência Política:
Os debates foram tão profícuos que foi possível, valendo-se de discussões com bastante profundidade acadêmica (verticalidade cognitiva que se espera de um evento de nível nacional), editar uma série de enunciados que materializam a visão desses estudiosos acerca da segurança pública no Brasil.
São eles:
Segundo enunciado: o desvio das funções e das vocações constitucionais impacta na efetividade do Sistema de Segurança Pública e Persecução Penal como um todo.
Terceiro enunciado: um conjunto de falhas alheias à apuração criminal, como aquelas observadas na função preventivo-ostensiva, na tutela penal, na garantia da ordem pública e no sistema acusatório, afeta negativamente a taxa de eficácia das Polícias Judiciárias e dos demais indexadores da persecução penal.
Quarto enunciado: é imperativo buscar a valorização dos policiais, sejam civis ou militares, desde que por mecanismos que não subvertam as regras constitucionais e legais, inclusive a do concurso público universalizado.
Quinto enunciado: a construção de índices reais de resolutibilidade de crimes pelas Polícias Judiciárias é essencial, sendo necessário dar idêntica ênfase na quantidade de infrações ocorridas e, portanto, não evitadas.
Sexto enunciado: é necessário buscar o aperfeiçoamento do atual Sistema de Segurança Pública e de Persecução Penal através de medidas de reforço às vocações constitucionais originais.
Sétimo enunciado: há que se reconhecer a insuficiente justificativa dos projetos de alteração do Sistema de Segurança e de Persecução Penal brasileiro, principalmente no que tange à ausência de menção aos seus possíveis efeitos deletérios, aos seus custos orçamentários e, por fim, pela falta de indicação de países-paradigmas com realidades sociais mais próximas da brasileira (México, África do Sul etc.).
Oitavo enunciado: é fundamental destacar que o sucesso da investigação policial não se dá apenas pelo fornecimento de elementos e de provas para a futura ação penal, mas também pela produção de elementos defensivos, já que o Inquérito Policial é instrumento imparcial de busca da verdade.
Nono enunciado: o delegado de polícia é o primeiro garantidor da legalidade e da Justiça a persecução criminal, sendo a investigação uma ferramenta onde a dialética deve ser assegurada para a preservação dos direitos e garantias fundamentais.
As asserções vieram em boa hora. Afinal, quem quer ser realista e ter uma visão mais ampla e mais exata do Direito, haverá de reconhecer que a doutrina constitui uma fonte muito importante e viva do mesmo, ainda que mediata [4]. E é justamente esse enfoque dogmático, por intermédio da razão jurídica, que possibilita tomada de decisões e a orientação de ações [5].
[1] SPIESS, Maiko Rafael; MATTEDI, Marcos Antonio. Eventos científicos: da Pirâmide Reputacional aos círculos persuasivos. Revista Sociedade e Estado, v. 35, nº 2, mai.-ago. 2020, p. 441-471.
[2] BARREIRO, María Piedad Rivadeneira. Et al. El pensamiento crítico y su evaluación en la educación universitária. Research, Society and Development, v. 10, nº 3, 2021.
[3] FONTES, Eduardo; HOFFMANN, Henrique, COSTA, Adriano Sousa. TÁVORA, Nestor; HABIB, Gabriel; ALVES, Leonardo Barreto Moreira; ARAÚJO, Fábio Roque; MASSON, Nathalia; DAVID, Ivana; ANSELMO, Márcio Adriano. Segurança Pública: Modelos e Evolução. Salvador: Juspodivm, 2022.
[4] DAVID, René. Los Grandes Sistemas Jurídicos Contemporáneos. Madrid: Biblioteca Jurídica Aguilar, 1969, p. 104.
[5] FERRAZ JÚNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. São Paulo: Atlas, 2003, p. 35/240.
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