Compartilhamento de dados

STJ nega ao Coaf a última palavra sobre licitude de movimentações financeiras

Autor

31 de maio de 2021, 18h08

Para a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, não se pode admitir que a única e última palavra sobre a licitude de movimentações de dinheiro atípicas seja do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão administrativo fiscalizador que atua como unidade de inteligência financeira.

Reprodução
Movimentações ocorreram em agência do Banco do Brasil e foram consideradas lícitas pelo Coaf, que não enviou dados ao MPF

Com esse entendimento, o colegiado reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo e deu provimento a recurso em mandado de segurança para permitir que, mediante decisão judicial, o Coaf encaminhe ao Ministério Público Federal informações abarcadas pelo sigilo fiscal, mesmo que o órgão financeiro tenha considerado esse compartilhamento desnecessário.

No caso, o MPF recebeu denúncia anônima feita por um dos funcionários do Banco do Brasil, sobre possíveis irregularidades envolvendo saques de altos valores em uma agência em Jacareí (SP).

O órgão acusador então recorreu ao Coaf, que confirmou a existência dessas transações no período indicado: saques de mais de R$ 100 mil feitos entre março de 2011 e março de 2012. No entanto, elas foram consideradas lícitas. Por isso, não foi preparado Relatório de Inteligência Financeira (RIF).

É por meio do RIF que, em regra, o compartilhamento de dados fiscais é feito de ofício pelo Coaf, sempre que recebe informações dos bancos e identifica suspeita de crime. A medida é lícita, como já reconheceu o Supremo Tribunal Federal. A jurisprudência brasileira se divide quando a hipótese é de solicitação de dados pelo MPF à Receita Federal.

Ao analisar o caso, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região entendeu que não caberia a quebra do sigilo financeiro porque a denúncia anônima foi feita por funcionário do banco que, nessa condição, tem o dever de guardar sigilo. Isso significa que, na hipótese, o MPF dependeria do envio de dados pelo Coaf para ter uma ideia sobre a ocorrência do crime.

Lucas Pricken/STJ
Relatório de Inteligência Financeira não é uma condição de procedibilidade para MPF investigar crime, disse ministro Schietti
Lucas Pricken/STJ

Relator na 6ª Turma, o ministro Rogerio Schietti apontou que a existência do Relatório de Inteligência Financeira não é uma condição de procedibilidade para que o Ministério Público possa investigar movimentações financeiras atípicas. Nada impede que haja decisão judicial a autorizar tal compartilhamento.

"O titular da ação penal é o Ministério Público, que necessita desses dados para exercer seu juízo valorativo sobre a licitude das movimentações financeiras. Não há uma condição de procedibilidade que vincule o Parquet ao entendimento do Coaf sobre a legalidade da movimentação financeira do contribuinte. Não se pode admitir que a única e última palavra sobre movimentações financeiras atípicas seja do órgão administrativo", disse.

Segundo ele, prevalecendo a tese do TRF-3, a decisão do Coaf de não encaminhar o RIF acabaria por ser definitiva, já que o MPF não teria acesso às informações de modo direto e, com base apenas na denúncia anônima, não poderia recorrer ao Judiciário para a quebra do sigilo.

"No caso concreto, não se pode negar que saques semanais de valores expressivos em moeda corrente são lícitos, porém é possível afirmar que são também sujeitos à fiscalização não apenas do Coaf mas ainda por parte do Ministério Público. As informações sobre essas operações financeiras devem ser compartilhadas porquanto, de fato, o que ocorre é apenas uma transferência de sigilo entre os órgãos", acrescentou.

A decisão foi unânime. Votaram com o relator os ministros Antonio Saldanha Palheiro, Laurita Vaz e Sebastião Reis Júnior, e o desembargador convocado Olindo Menezes.

Clique aqui para ler o acórdão
RMS 42.120

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!