Inquérito sobre declarações de Moro não pode ser sigiloso, diz Celso de Mello
5 de maio de 2020, 19h51
Os estatutos do poder, numa República fundada em bases democráticas, não podem privilegiar o mistério, porque a supressão do regime visível de governo — que tem na transparência a condição de legitimidade de seus próprios atos — sempre coincide com os tempos sombrios em que declinam as liberdades e transgridem-se os direitos dos cidadãos.
Com esse entendimento, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, determinou o regime de publicidade do inquérito 4.831, que investiga as declarações do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, sobre o presidente Jair Bolsonaro. Tal inquérito, assim, não poderá correr em sigilo, inclusive em relação ao depoimento já prestado por Moro, no último sábado (2/5).
Celso de Mello citou doutrina do publicista italiano Norberto Bobbio, cujo magistério "tem orientado os sucessivos julgados" que o ministro vem proferindo no STF.
O ministro ligou a decisão ao direito de liberdade de imprensa, destacando que a "ampla difusão da informação, o exercício irrestrito de criticar e a possibilidade de formular denúncias contra o Poder Público representam expressões essenciais dessa liberdade fundamental, cuja prática não pode ser comprometida por atos criminosos de violência política (ou de qualquer outra natureza), por interdições censórias ou por outros artifícios estatais, como a arbitrária imposição de regime de sigilo".
Oitiva de ministros
A decisão do ministro Celso de Mello ainda autoriza as oitivas requisitadas pelo procurador-geral da República, Augusto Aras. Os investigadores poderão colher depoimento dos ministros Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), Augusto Heleno Ribeiro Pereira (Gabinete de Segurança Institucional da Presidência) e Walter Souza Braga Netto (Casa Civil).
Também deporão à Polícia Federal a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) e os delegados da Polícia Federal Ricardo Saadi, Carlos Henrique de Oliveira Sousa, Alexandre Saraiva, Rodrigo Teixeira, Alexandre Ramagem Rodrigues e Maurício Leite Valeixo — este, o ex-diretor-geral da instituição e um dos pivôs da crise entre Moro e Bolsonaro.
O ministro Celso de Mello concedeu a todos as benesses do artigo 221 do Código de Processo Penal, que já conferiria aos ministros de estado e à deputada federal a prerrogativa de combinar previamente local, dia e hora para serem ouvidos pela autoridade policial federal. Caso se recusem a fazê-lo, adverte Celso de Mello, perderão essa prerrogativa.
"Redesignada nova data para seu comparecimento em até 05 dias úteis, estarão sujeitas, como qualquer cidadão, não importando o grau hierárquico que ostentem no âmbito da República, à condução coercitiva ou 'debaixo de vara', como a ela se referia o art. 95 do Código do Processo Criminal do Império de 1832", concluiu.
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Inq 4.831
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