Primeiro precedente

Contrato bancário fechado por analfabeto não depende de outorga pública, diz STJ

Autor

15 de dezembro de 2020, 15h22

No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas. A lei não exige instrumento público ou de outorga de procuração pública a terceiro para que possa assinar a seu rogo.

Reprodução
Para validade do contrato celebrado por cliente analfabeto, basta assinatura a rogo na presença de duas testemunhas

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento a quatro recursos especiais julgados em conjunto no qual se buscava a declaração de nulidade ou inexistência de contrato de empréstimo consignado assinado a rogo em nome de clientes analfabetos.

Os processos têm como origem o Tribunal de Justiça do Ceará e foram separados pela Comissão Gestora de Precedentes como passível de afetação à 2ª Seção do STJ como recursos repetitivos, para definição de tese. A afetação foi descartada, no entanto, porque trata-se de matéria que as turmas que julgam Direito Privado não enfrentaram até então.

No Ceará, a multiplicidade de casos é tanta que a corte fixou tese em julgamento de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR). No primeiro precedente sobre o tema, a 3ª Turma confirmou o entendimento do TJ-CE.

Por unanimidade, o colegiado acompanhou o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, para quem a validade do contrato firmado por pessoal analfabeta não depende de instrumento público ou de outorga de procuração pública a terceiro, simplesmente porque a lei não exige que assim seja.

Lucas Pricken/STJ
Artigo 595 do Código Civil não exige instrumento público, disse ministro Bellizze
Lucas Pricken/STJ

O procedimento está descrito no artigo 595 do Código Civil: No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas. Essa é a forma exigida para que o contrato seja válido.

Ainda assim, acrescentou o relator, embora não seja essencial para a validade do ato, poderá o analfabeto se fazer representar por um procurador. Nessa hipótese, será necessariamente constituído por instrumento público.

Vício de consentimento
O julgamento foi encerrado nesta terça-feira (15/12) com voto-vista da ministra Nancy Andrighi, que acrescentou ressalva no sentido de indicar que o uso da forma correta para firmar esses contratos não afasta a possibilidade de reconhecimento de invalidade do ato por eventual vício de consentimento.

Gustavo Lima/STJ
É possivel reconhecer vício de consentimento em contrato celebrado por analfabeto, disse a ministra Nancy Andrighi

O relator, que concordou com a ministra Nancy, não tratou do tema porque ele não foi trazido nos recursos especiais. Assim, o analfabeto pode suscitar a invalidade do contrato quando perceber que o que ele recebeu na relação jurídica não corresponde à vontade que elaborou e pretendia declarar.

" A simples interveniência de terceiro na celebração de negócio jurídico formalizado por escrito não garante que analfabeto efetivamente compreendeu os termos da contratação e seus elementos essenciais, principalmente quando for um contrato complexo, como em geral são contratos bancários", disse a ministra Nancy.

Para o reconhecimento do vício de consentimento, é preciso demonstrá-lo no caso concreto, com instrução probatória, observada possibilidade de inversão do ônus da prova.

REsp 1.862.324
REsp 1.862.330
REsp 1.868.099
REsp 1.868.103

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!