No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas. A lei não exige instrumento público ou de outorga de procuração pública a terceiro para que possa assinar a seu rogo.
Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento a quatro recursos especiais julgados em conjunto no qual se buscava a declaração de nulidade ou inexistência de contrato de empréstimo consignado assinado a rogo em nome de clientes analfabetos.
Os processos têm como origem o Tribunal de Justiça do Ceará e foram separados pela Comissão Gestora de Precedentes como passível de afetação à 2ª Seção do STJ como recursos repetitivos, para definição de tese. A afetação foi descartada, no entanto, porque trata-se de matéria que as turmas que julgam Direito Privado não enfrentaram até então.
No Ceará, a multiplicidade de casos é tanta que a corte fixou tese em julgamento de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR). No primeiro precedente sobre o tema, a 3ª Turma confirmou o entendimento do TJ-CE.
Por unanimidade, o colegiado acompanhou o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, para quem a validade do contrato firmado por pessoal analfabeta não depende de instrumento público ou de outorga de procuração pública a terceiro, simplesmente porque a lei não exige que assim seja.
O procedimento está descrito no artigo 595 do Código Civil: No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas. Essa é a forma exigida para que o contrato seja válido.
Ainda assim, acrescentou o relator, embora não seja essencial para a validade do ato, poderá o analfabeto se fazer representar por um procurador. Nessa hipótese, será necessariamente constituído por instrumento público.
Vício de consentimento
O julgamento foi encerrado nesta terça-feira (15/12) com voto-vista da ministra Nancy Andrighi, que acrescentou ressalva no sentido de indicar que o uso da forma correta para firmar esses contratos não afasta a possibilidade de reconhecimento de invalidade do ato por eventual vício de consentimento.
O relator, que concordou com a ministra Nancy, não tratou do tema porque ele não foi trazido nos recursos especiais. Assim, o analfabeto pode suscitar a invalidade do contrato quando perceber que o que ele recebeu na relação jurídica não corresponde à vontade que elaborou e pretendia declarar.
" A simples interveniência de terceiro na celebração de negócio jurídico formalizado por escrito não garante que analfabeto efetivamente compreendeu os termos da contratação e seus elementos essenciais, principalmente quando for um contrato complexo, como em geral são contratos bancários", disse a ministra Nancy.
Para o reconhecimento do vício de consentimento, é preciso demonstrá-lo no caso concreto, com instrução probatória, observada possibilidade de inversão do ônus da prova.
REsp 1.862.324
REsp 1.862.330
REsp 1.868.099
REsp 1.868.103