Questão pacificada

TJ-CE fixa entendimento sobre contratação de consignados por analfabetos

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22 de setembro de 2020, 19h05

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TJ-CE uniformizou jurisprudência sobre contratação de empréstimos consignados por pessoas analfabetas
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A pessoa analfabeta é plenamente capaz para os atos da vida civil e pode exarar sua manifestação de vontade por quaisquer meios admitidos em direito, não sendo necessária a utilização de procuração pública ou escritura pública para a contratação de empréstimo consignado, de sorte, que eventual vício existente na contratação do empréstimo deve ser discutido à luz das hipóteses legais que autorizam a anulação por defeito do negócio jurídico.

Com base nesse entendimento, desembargadores do Tribunal de Justiça do Ceará, em seção de Direito Privado, decidiram fixar tese sobre a contratação de empréstimos consignados por pessoas analfabetas. A decisão deve impactar cerca de 10 mil processos em trâmite no Estado.

Os magistrados entenderam que a contratação de empréstimo consignado por analfabetos pode ser efetivada com a assinatura a rogo do cliente e de mais duas testemunhas. E mais: não se deve exigir para sua validade procuração pública. A decisão, com base no artigo 595 do Código Civil, foi proferida nesta segunda-feira (21/9) no julgamento de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR). Dessa forma, o TJ-CE uniformizou o entendimento sobre o tema.

Segundo o advogado Anastacio Marinho, sócio do escritório Rocha, Marinho e Sales Advogados, que representou o banco suscitante do incidente e fez a sustentação oral no TJ-CE, a decisão é importante por unificar o entendimento do Judiciário cearense sobre o tema, evitando entendimentos divergentes dentro do próprio tribunal.

"A decisão permite uma solução mais rápida para aproximadamente 10 mil processos que atualmente tramitam no Ceará, conferindo também segurança jurídica para esse tipo de contratação", avalia.

O caso foi levado à Justiça por José Joaquim dos Santos, que alegou estar sofrendo descontos indevidos em seu benefício previdenciário em razão de contrato de crédito consignado, mútuo este que não reconhece. Argumentou ainda que, para a contratação de contrato de crédito consignado com pessoas analfabetas, seria necessário instrumento público, formalidade não observada por bancos.

O banco suscitante argumentou que o empréstimo foi devidamente contratado. Isso porque, segundo Anastacio Marinho, não há exigência legal de instrumento público ou procuração pública para a contratação de empréstimo consignado com analfabeto. A exigência é apenas que o instrumento seja assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas, nos termos do artigo 595 do Código Civil.

De acordo com o advogado, o Judiciário não pode exigir requisitos não previstos em lei. Além disso, esse tipo de exigência pode dificultar o acesso ao crédito por essa parcela da população.

Durante o julgamento, que foi transmitido pelo canal oficial do tribunal no YouTube, o relator da matéria, desembargador Francisco Bezerra Cavalcante, entendeu que é legal contratação do empréstimo por analfabetos com a assinatura a pedido do contratante.

Esse tipo de assinatura é usado quando uma pessoa, impossibilitada de assinar um documento, deixa a sua digital e é representada por um terceiro, com mais duas testemunhas. O voto foi seguido por unanimidade do colegiado.

Segundo o desembargador, a exigência de procuração pública como requisito de validade de crédito consignado nos casos de pessoas analfabetas "não encontra amparo jurídico, do contrário, desafia a aplicação direta daquilo que disciplina o código civil vigente". Ele explicou que o julgamento não discutiu as fraudes na contratação de empréstimos, mas a legalidade da exigência para a efetividade do contrato. "Isso trará efetividade aos processos que estão sendo julgados por nós", disse o relator.

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0630366-67.2019.8.06.0000

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