Processo eletrônico

Plenário Virtual é polêmico para juízes e advogados

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18 de outubro de 2011, 17h32

A possibilidade de o Tribunal de Justiça de São Paulo julgar alguns recursos virtualmente vai dar mais celeridade ao andamento dos processos, mas tem dividido opiniões no estado. Em vigor desde o fim do mês passado, a Resolução 549/2011 estabelece que agravos de instrumento, agravos internos ou regimentais e embargos de declaração podem ser julgados em plenário virtual.

Também estão incluídos na Resolução os julgamentos das apelações, dos Mandados de Segurança e Habeas Corpus, desde que as partes concordem com o método. No caso dos embargos e agravos, as partes têm cinco dias para se manifestar; no segundo caso, o prazo é de dez dias.

A magistratura, de forma geral, tem visto a novidade com bons olhos, e inclusive já discutem os votos virtualmente. Deixam para as sessões apenas as decisões finais. É o que conta o presidente da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis), desembargador Paulo Dimas Mascaretti.

Segundo ele, a medida traz benefícios ao tribunal, pois os julgamentos ficam mais rápidos, além de não haver o prejuízo de os advogados não poderem se manifestar oralmente. Isso, segundo a Resolução, pode ser pedido dentro do prazo de cinco dias — à exceção dos agravos de instrumento, agravos internos e regimentais e embargos de declaração, que não permitem sustenção oral.

Mas não é assim que pensa o Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp). Em parecer técnico, a entidade afirma que a Resolução do TJ-SP propõe uma mudança de regra processual, o que implicaria em mudança no Código de Processo Civil. Isso, segundo o parecer do Iasp, só pode ser feito pelo Congresso Nacional.

Diz a entidade que um tribunal não pode mudar por meio de Resolução o sistema de julgamento público tal como determina o CPC. Segundo o advogado Antonio de Pádua Nogueira, presidente da Comissão de Processo Civil do Iasp, nem mesmo com o consentimento das partes e advogados. "Não se pode mudar o CPC mediante um acerto entre o tribunal e a parte", diz. "O que nos preocupa é essa invasão legislativa. Se não, todas as formalidades técnicas que o CPC considerou necessárias poderão ser alteradas."

Para o presidente da Aasp, Arystóbulo de Oliveira Freitas, a Resolução do TJ-SP é inconstitucional, mas por outros motivos. O julgamento virtual, para Freitas, não permite a possibilidade de defesa dos acusados, violando um princípio garantido na Constituição Federal.

Mas o presidente da Apamagis discorda. De acordo com ele, ao garantir que a parte diga se concorda ou não com o julgamento online, o Tribunal "acabou com as inimizades". Para ele, o o plenário virtual, nos casos em que está previsto na Resolução, "parece mais apropriado", pois muitas vezes os desembargadores "perdem dias inteiros" apenas discutindo agravos, que já nem permitem sustentação oral. "Isso até facilita para os advogados que podem ter conhecimento da decisão mais rapidamente."

O seu raciocínio acompanha o que diz o presidente do TJ-SP, José Roberto Bedran, na justificativa para a Resolução. Lá, afirma que a medida vem para dar mais economia de tempo para os julgadores e "para atender o princípio constitucional da razoável duração do processo". Além disso, ele afirma haver 550 mil recursos aguardando julgamento no TJ, e a Resolução é necessária para atender a Meta 2 do Conselho Nacional de Justiça, que obriga os tribunais a julgar todos os processos com mais de cinco anos.

Opcional
Apesar de integrante do Tribunal de São Paulo, o desembargador Palma Bisson não acha a resolução necessária. Ele diz que o julgamento virtual, "de certa forma", já acontece por meio da troca de votos pela internet entre os julgadores. O desembargador ressaltou o caráter opcional da Resolução.

Bisson conta que sua câmara, a 36ª de Direito Público, não pretende adotar a medida. "Até hoje não vi uma sessão em que pelo menos um advogado não tenha pedido para fazer sustentação oral. Se teremos que preparar todo um aparato para ouvir um, então já aproveitamos e ouvimos todos", justificou.

A 8ª Câmara de Direito Público do TJ-SP, da qual faz parte o desembargador Paulo Dimas, também não pretende adotar o julgamento virtual. Mas é porque está em dia com o acervo de agravos e embargos, segundo o presidente da Apamagis.

Adequação dos sistemas
Apesar de estar em vigor desde o dia 24 de setembro, um mês depois da publicação da Resolução no Diário Oficial da Justiça de São Paulo, a Resolução 549/2011 ainda não foi colocada em prática. O Tribunal paulista ainda precisa "fazer as adequações técnicas dos sistemas" para poder dar suporte à nova forma de julgar, segundo a Assessoria de Imprensa. Ainda não há previsão para o início do funcionamento do tribunal eletrônico.

Na opinião do desembargador José Luís de Palma Bisson, o problema da digitalização dos processos está na "incapacidade" de o TJ de São Paulo se informatizar. Em fala no Fenalaw SP, evento que reúne juristas em São Paulo, ele lembra quando os tribunais de alçada foram incorporados ao Tribunal de Justiça, e foi necessária a adequação de quatro linguagens de sistema diferentes. "Por isso é preciso ter cautela. Informatização funcional e eficiente não está perto de acontecer."

Mas, de acordo com o presidente da Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp), Arystóbulo de Oliveira Freitas, também presente ao evento, o problema vai além do acesso ao sistema. Ele diz que muitos processos digitalizados sofrem alterações no meio do caminho, e chegam ao tribunal "com falhas e partes faltando". Isso, acredita, é "resultado de uma falha de sistema do tribunal".

Ele também apoia a tese do Iasp, e afirma que a Resolução do TJ-SP é inconstitucional, mas por outros motivos. O julgamento virtual, para Freitas, não permite a possibilidade de defesa dos acusados, violando um princípio garantido na Constituição Federal.

Leia abaixo a íntegra da Resolução 549/2011:

RESOLUÇÃO Nº 549/2011

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO, por seu Órgão Especial, no uso de suas atribuições legais, CONSIDERANDO existir, no acervo do Tribunal de Justiça, mais de 550.000 recursos a aguardar julgamento, número que não diminui, apesar da grande produtividade média de seus Magistrados, classificado, por isso, em primeiro lugar nas estatísticas do Conselho Nacional de Justiça;

CONSIDERANDO ser necessário adotar providências de ordem prática para o julgamento mais rápido dos recursos, com economia de tempo para os julgadores, bem como para cumprimento da Meta 2 do CNJ e para o urgente atendimento do princípio constitucional da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, da CF);

CONSIDERANDO o expressivo aumento do número de agravos de instrumento, agravos internos ou regimentais de decisões monocráticas dos relatores, de embargos de declaração, de mandados de segurança e habeas corpus originários, inclusive no âmbito do direito de família, os quais são preferenciais em relação aos demais, e que, por conseguinte, as pautas das sessões de julgamento ficam sobrecarregadas, consumindo tempo que poderia ser usado para o preparo de votos em apelações;

CONSIDERANDO a possibilidade de medidas alternativas voltadas à desburocratização e racionalização de atos para uma tutela jurisdicional efetiva, especialmente no sentido de aprimorar e agilizar os julgamentos dos recursos preferenciais, inclusive por meio eletrônico, como permitido pelo art. 154 e parágrafos do Código de Processo Civil;

CONSIDERANDO não haver sustentação oral no julgamento dos recursos de agravo de instrumento, agravos internos ou regimentais e embargos de declaração, bem como a possibilidade, nos casos de apelações e de mandados de segurança e habeas corpus originários, de se facultar às partes a prévia manifestação de interesse na sustentação oral, antes da realização dos julgamentos, a viabilizar a sessão virtual, sem prejuízo aos litigantes;

CONSIDERANDO que, por serem os votos publicados pela imprensa oficial, não haverá risco de quebra da publicidade e da transparência dos atos judiciais;

CONSIDERANDO, finalmente, que a dispensa da sessão de julgamento, nos casos dos recursos previstos nesta Resolução, auxiliará o adequado cumprimento da Resolução nº 542/2011, proporcionando mais tempo aos magistrados para o julgamento dos processos da Meta 2, sem a sobrecarga das pautas,

R E S O L V E:

Art. 1º – Os agravos de instrumento, agravos internos ou regimentais e embargos de declaração poderão ser julgados virtualmente, a critério da turma julgadora, determinando o relator a prévia ciência das partes pela imprensa oficial, para fim de preparo de memoriais ou eventual oposição, em cinco dias, à forma de julgamento, bastando a de qualquer delas, sem necessidade de motivação, para impedi-la.

§ 1º No julgamento virtual, o relator encaminhará seu voto aos demais componentes da turma julgadora por mensagem eletrônica.

§ 2º O segundo e o terceiro Juízes, que poderão requisitar os autos para exame e visto, manifestarão sua adesão aos demais da turma julgadora, igualmente mediante mensagem eletrônica.

§ 3º Caso ocorra divergência, o discordante elaborará seu voto e o transmitirá ao relator e ao outro Juiz componente da turma. Confirmado o voto original pelo relator, dar-se-á sua publicação e o do Juiz discordante, prevalecendo, para acórdão, aquele que for acolhido pela maioria. Não manifestada divergência ou ocorrendo o consenso, o voto do relator ou do Juiz para tal designado servirá como acórdão para publicação na imprensa oficial.

Art. 2º – O julgamento das apelações e dos mandados de segurança e habeas corpus originários também poderá ser virtual, desde que, ao relatar o processo e enviá-lo ao revisor, ou o voto ao segundo e terceiro Juízes, conforme o caso, seja concedido o prazo de dez dias para eventual oposição à forma de julgamento ou manifestação do propósito de realizar sustentação oral, seguindo-se, no mais, os trâmites estabelecidos no art. 1º e seus parágrafos.

Art. 3º – A adoção da forma de julgamento virtual não implica quebra da periodicidade das sessões, na conformidade do disposto no art. 113, parágrafo único, do Regimento Interno.

Art. 4º – Esta resolução entrará em vigor trinta dias depois de sua publicação.

São Paulo, 10 de agosto de 2011.

(a) JOSÉ ROBERTO BEDRAN,
Presidente do Tribunal de Justiça.

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