Ficção e realidade

Defesa tenta desqualificar denúncia contra acusados do mensalão

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22 de agosto de 2007, 17h30

Os advogados de José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares, Silvio Pereira e Marcos Valério, principais denunciados do mensalão, fundamentaram sua defesa na desqualificação da denúncia preparada pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza. “A acusação fala da compra de um apartamento. Mas qual a conduta criminosa do ex-deputado na compra deste apartamento? O procurador não fala”, afirmou o advogado José Luis de Oliveira Lima, que representa o ex-ministro e ex-deputado federal José Dirceu.

Em tom homogêneo, os advogados chamaram a denúncia de inepta. O problema jurídico do trabalho apresentado pelo procurador-geral seria a falta de individualização de conduta nos crimes impostos aos envolvidos. Ou seja, o procurador-geral da República fala em crimes cometidos por núcleos criminosos, mas não prova individualmente a imputação dos crimes. Os advogados também apontaram erro pela a imputação do crime de peculato. Fora José Dirceu, os outros envolvidos não exerciam cargos públicos.

“O procurador fala do meu cliente como chefe de uma organização criminosa, que a imprensa preferiu chamar de chefe da quadrilha. Mas quais os atos praticados pelo ex-ministro da Casa Civil que o caracterizam como ‘chefe da quadrilha’?”, questiona Oliveira Lima. O advogado abriu a série de sustentações orais que seguem durante a tarde desta quarta-feira (22/8) no Supremo. Para Oliveira Lima, a denúncia nada mais é do que uma “peça de ficção”. “Meu cliente tem 40 anos de vida pública sem qualquer mácula, sem qualquer mancha”, conclui o advogado.

José Genoino

Fernando Pacheco, advogado do deputado federal José Genoino (PT-SP), acompanha o raciocínio do colega José Luis de Oliveira Lima. “A denúncia é inepta formalmente, pois não individualiza a conduta. É inepta materialmente, pois não se apóia em um indício sequer”, afirma o advogado. Pacheco afirmou que o procurador-geral da República fez uma denúncia de cambulhada, que chamou de “peça de ficção”.

“Ser réu em ação penal já é um castigo — para um cidadão que sempre se pautou pela honestidade — por um simples capricho da procuradoria-geral da República. Não é possível que o supremo receba uma denúncia que não se apóia em nada”, defende.

De acordo com a denúncia, José Dirceu e José Genoíno figuravam no núcleo central do esquema. Segundo o procurador-geral da República, núcleo chefiava o esquema que pretendia garantir a permanência do PT no poder com a compra de suporte político de outros partidos e com o financiamento irregular de campanhas.

Ainda segundo a denúncia, Genoíno negociava acordos com os partidos, oferecendo vantagens em troca de apoio ao governo. José Dirceu, por sua vez, aprovava todos os acordos negociados com os partidos da base aliada para garantir apoio político no Congresso.

Delúbio Soares

Para o advogado Arnaldo Malheiros, que representa o ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, afirmar que uma denúncia é inepta não ofende o seu subscritor. A afirmação é técnica sobre a possibilidade ou não de uma denúncia ser aceita. “E nesse caso, não foi possível, por falta de provas e fatos, apresentar uma denúncia que se sustente”, afirmou em sua sustentação oral.

Segundo Malheiros, a formação de quadrilha — crime do qual seu cliente á acusado — é uma imputação atípica na medida em que a peça do PGR descreve uma associação em grupos e não a participação individual de cada integrante da denúncia. Delúbio Soares foi denunciado pelos crimes de formação de quadrilha, peculato e corrupção ativa.

Silvio Pereira

O advogado Sérgio Salgado Badaró, que defende o ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira, minimizou a importância do seu cliente na estrutura partidária e na administração federal. “É um grande equívoco o considerar uma estrela de primeira grandeza no PT”, afirmou. Ele não poderia ser assim citado como integrante do “núcleo principal” do esquema

Badaró lembrou ainda que Silvio Pereira nunca exerceu um cargo público e nem disputou um cargo eletivo. Também não participou do comitê eleitoral nas quatro candidaturas de Lula à presidência.

Sobre o cargo de secretário-geral, Silvio Pereira teria sido apenas um tampão, segundo o advogado, já que não foi eleito ocupando interinamente por causa da saída do titular Jorge Bittar. “A quadrilha, como nas palavras do procurador, começou a funcionar em 2002. Silvio Pereira tornou-se secretário-geral apenas em 2004”, ressaltou.

Para Badaró, ele também não poderia ser acusado de peculato, pois não era funcionário público, mas quadro partidário. “O que ele fez além de ser secretário do partido dos trabalhadores? Não poderia indicar ninguém no governo”.

Marcos Valério e Simone Vasconcelos

Com mais tempo de sustentação, já que defendia dois denunciados, o advogado Marcelo Leonardo rebateu crime por crime imputado ao publicitário e à sua mulher. Enquanto os primeiros advogados fizeram sustentações mais genéricas, o ex-presidente da OAB de Minas Gerais usou uma argumentação técnica.

Também entrou na questão da não individualização da denúncia. “Se a denúncia não tem suporte enfático mínimo, ela pode e deve ser rejeitada por este tribunal”, afirmou Leonardo, citando ainda o fato de que a denúncia foi obtida por meio ilícito.

Para o advogado, a denúncia foi uma criação mental do procurador-geral. Ele lembrou que foi usada na denúncia uma figura jurídica inexistente: o núcleo Marcos Valério, que foi lembrado 55 vezes no documento de Antonio Fernando Souza.

Leia integra do relatório do ministro Joaquim Barbosa

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