Delator da delação

"Fatos gravíssimos" da JBS implicam mais Janot do que "agentes do STF"

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5 de setembro de 2017, 19h00

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, decidiu abrir inquérito para investigar indícios de que o ex-procurador da República Marcelo Miller vendeu sua influência no gabinete do PGR para emplacar a delação premiada dos executivos da JBS com o próprio Janot.

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Janot convoca entrevista coletiva para denunciar "fatos gravíssimos" envolvendo até "agentes do Supremo Tribunal Federal", mas gravações falam mais dele que dos ministros do STF.

O acordo de delação da JBS prevê que, caso surjam fatos novos, os delatores teriam até quatro meses para complementar seus depoimentos e apresentar mais documentos. No dia 30 de agosto, a PGR pediu ao Supremo Tribunal Federal mais dois meses para apresentar “novos anexos” à delação. Haviam surgido novos fatos. O pedido foi atendido um dia depois pelo ministro Luiz Edson Fachin.

Na segunda-feira (4/9), no entanto, Janot anunciou que, diante desses fatos, enviaria um pedido ao STF para rever benefícios concedidos aos delatores, pois tudo indicava quebra de confiança.

Poucas horas depois do anúncio, feito em entrevista coletiva, a petição foi divulgada à imprensa. Na verdade, Janot instaurou inquérito para investigar se o ex-procurador da República Marcelo Miller orientou Joesley e Wesley Batista, donos da JBS, enquanto ainda era membro do Ministério Público Federal. Segundo o procurador-geral, foram encontradas gravações de conversas envolvendo Miller de antes de as provas da delação terem sido apresentadas à PGR.

Mas durante a coletiva, Janot disse que denunciaria “fatos gravíssimos” aos jornalistas, envolvendo inclusive “agentes do Supremo Tribunal Federal”. Nesta terça-feira (5/9), as provas foram divulgadas às principais redações do país: Joesley e o lobista da JBS, Ricardo Saud, conversavam sobre como usar Miller para convencer Janot a aceitar a proposta de delação que eles pretendiam fazer.

“Nós dois temos que operar o Marcelo direitinho pra chegar no Janot”, diz Joesley, em um momento. Em outro trecho, depois de falar de conversas que teve com Miller, ainda como procurador, afirma: “Nós somos joia da coroa deles. O Marcelo já descobriu e já falou com o Janot: ‘Ô Janot, nós temos o pessoal que vai dar todas as provas que nós precisamos’. E ele já entendeu isso”. A gravação deixa claro que já estava tudo pronto para a delação, mas que Joesley decidiu, após consultar Miller, esperar mais para entregar o material.

Escritório privado
Durante a conversa, Ricardo Saud conta que tem um amigo em comum com Janot e soubera que o procurador-geral não pretendia brigar por um segundo mandato e estava pronto para seguir a vida na iniciativa privada. Segundo esse amigo em comum, Marcelo Miller estava preparando para deixar o MPF e abrir um escritório de advocacia com outro procurador, de nome Christian.

“Janot vai sair e vai advogar com esse mesmo escritório. Mesmo escritório que ele [amigo em comum] está hoje”, diz Saud. “Tão fazendo um puta escritório, um puta escritório. Nada meia boca, não. É que eu entendi que ele [Marcelo Miller] já foi para esse escritório, já largou, porque o Janot já… Com esse Christian aí, que diz que é um cara top, novinho”, continua o lobista.

O que chama atenção de quem vem acompanhando as movimentações dos investigadores é que Janot abriu inquérito para apurar acusações que o envolvem pessoalmente. Embora nada do que tenha sido dito na conversa seja suficiente para concluir nada – muito menos que “agentes do Supremo Tribunal Federal” estariam envolvidos em algum tipo de negociação só pelo fato de seus nomes terem aparecido durante a conversa.

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