Trump apela para tática de judge shopping para facilitar deportações
15 de maio de 2025, 10h30
Depois que a Suprema Corte dos EUA decidiu que venezuelanos supostamente pertencentes à gangue Tren de Aragua têm direito a um reexame judicial de seus casos (o chamado devido processo legal), o governo Trump ficou com um problema: juízes federais de quatro estados já haviam bloqueado as deportações. Por isso, não seriam fóruns convenientes para julgar os casos.

Trump apela à tática de judge shopping para conseguir deportar venezuelanos
Mas o republicano encontrou uma solução: apelar para a velha tática de judge shopping (prática de ‘escolher’ o juízo, levando em conta a ideologia do magistrado, para que a análise seja favorável). Concluíram que os casos deveriam ser julgados pelo juiz federal Wesley Hendrix, de uma corte no Distrito Norte do Texas. O magistrado foi nomeado por Trump em seu primeiro governo.
O juiz se recusou a bloquear as deportações, que se sustentariam pela Lei dos Inimigos Estrangeiros (Alien Enemies Act). A norma, em tese, permite que o governo deporte todos os venezuelanos presos designados como “inimigos estrangeiros”, sem necessidade de um processo legal.
Essa discussão ainda não foi analisada por nenhum tribunal. Mas não há impedimento para que advogados dos presos impetrem Habeas Corpus para que seus clientes respondam um devido processo. A propósito, o governo Trump está buscando justificativas jurídicas para acabar com o uso do HC nos casos que envolvem supostos “inimigos estrangeiros”.
Mas surgiu outro problema. A Suprema Corte decidiu, em abril, que os imigrantes devem contestar as acusações contra eles e suas deportações no distrito judicial onde estão detidos, ou em cortes com jurisdição que cobre a área da prisão.
O governo, todavia, encontrou uma solução. O departamento de Imigração e Fiscalização Aduaneira dos EUA (U.S. Immigration and Customs Enforcement, conhecido como ICE), que se encarrega da captura e deportação de suspeitos, transferiu dezenas de venezuelanos para a prisão de Bluebonnet.
Por acaso, essa prisão fica em Anson, no Distrito Norte do Texas, a área sob jurisdição do tribunal federal em que atua o juiz Hendrix. Ele é o único juiz da corte e preside julgamentos de ações civis e criminais. Assim, os venezuelanos detidos terão de contestar as acusações contra eles e suas deportações em uma corte liderada por um juiz que se alinha ideologicamente a Trump.
Serviço prestado
Hendrix já negou o pedido de dois prisioneiros de Bluebonnet para pausar suas deportações, com o argumento de que isso não era necessário. Segundo o juiz, os advogados do Departamento de Justiça (DOJ) lhe garantiram que o governo não iria deportá-los até que ele julgasse o mérito das questões que lhe foram apresentadas.
O juiz também decidiu contra a União Americana pelas Liberdades Civis (American Civil Liberties Union), que representava os venezuelanos. A pretensão da ACLU era obter um certificado de ação coletiva, que lhe permitiria defender todos os prisioneiros de Bluebonnet.
Em algumas instâncias, o ICE transferiu venezuelanos para o Distrito Norte do Texas, apesar de ordens judiciais que proibiam o órgão de fazê-lo. Em um dos casos, uma juíza determinou que o acusado deveria ser julgado na Pensilvânia, onde um processo já estava em tramitação. Mais tarde, o ICE alegou que ignorou as instruções da juíza inadvertidamente.
Em outro caso, advogados do DOJ afirmaram que um preso foi transferido pelo ICE para o Texas 10 minutos antes que uma ação movida pela ACLU, em defesa do imigrante, entrasse na pauta do tribunal.
Em meio às tentativas de Trump, a Conferência Judicial dos Estados Unidos, órgão formulador de políticas para os tribunais federais do país, anunciou a adoção de novas regras para coibir a tática de judge shopping — que é preferencialmente usada por republicanos. O Departamento de Justiça também tentou, no governo do democrata Joe Biden, acabar com a prática, mas não conseguiu.
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