INTOLERÂNCIA SEM GRAÇA

Juiz mantém exclusão de advogado do TikTok por vídeos de teor nazista

3 de junho de 2025, 8h24

“É evidente que todos têm o direito de expressar suas posições, até fazendo troça daquilo que acham jocoso, mas sacar momento tão dramático da história universal só para se fazer de engraçado não tem nenhuma graça.”

A frase é do juiz Guilherme de Macedo Soares, da 2ª Vara do Juizado Especial Cível de Santos (SP), e resume a sentença na qual negou provimento ao pedido de um advogado para ter a sua conta no TikTok reativada. A plataforma disse que baniu o usuário devido a postagens com teor nazista.

Juiz negou pedido de advogado para ter conta reativada; plataforma alega postagens nazistas

“Não se desconhece que a liberdade de expressão é premissa indissociável do Estado democrático de Direito em que vivemos. Porém, até mesmo ela encontra limites, notadamente nos termos da lei”, frisou o julgador.

Segundo ele, os conteúdos publicados pelo autor, travestidos de viés humorístico, emitem ideais “absolutamente repugnantes” em nossa sociedade. “A profusão dessas mensagens, ainda que subliminarmente, não merece absolutamente nenhum grau de tolerância.”

O advogado narrou na inicial que utiliza o TikTok com frequência para postar vídeos de “humor e entretenimento”, conquistando 350 mil seguidores e auferindo lucro com a monetização da conta.

Ele alegou que a plataforma baniu o seu perfil sob a falsa acusação de que ele utilizava a plataforma para a prática de discurso de ódio, atividade sexual explícita e abuso de menores. Por essa razão, sentindo-se atingido em sua honra, pediu o restabelecimento da conta e R$ 10 mil de indenização por dano moral.

A rede social justificou que o usuário violou as regras da plataforma, em especial a que proíbe “reivindicar a supremacia sobre um grupo protegido, como a supremacia racial, a misoginia, a LGBTQ+fobia, o antissemitismo ou a islamofobia”.

O TikTok detalhou na contestação que vídeos do autor continham propagação de ideologia/discurso nazista, com ele caracterizado de Adolf Hitler, e ainda eram sonorizados com o hino do Terceiro Reich. Desse modo, o demandado sustentou que agiu em exercício regular de direito.

Juiz refuta réplica

Em relação aos quatro vídeos da conta banida juntados aos autos pela plataforma, o advogado argumentou em réplica que um deles se trata de “sátira”, outro é uma “edição feita por algum fã” e os demais são “memes”. O juiz inicialmente assinalou na sentença que o requerente, até então, não havia feito qualquer menção sobre os conteúdos das filmagens, “sendo que certamente tinha conhecimento de que seriam estes que teriam induzido ao banimento da sua conta”.

Segundo o juiz, se de fato o autor pretendia produzir conteúdo humorístico, “lamentavelmente passou longe disso”. Porém, Soares ressalvou que não lhe cabe nessa demanda analisar se de fato houve ou não apologia ao nazismo, porque essa questão deve ser resolvida em outra esfera judicial.

“Para a solução do presente litígio, basta concluirmos que as evidências eram suficientes para amparar a decisão acertadamente adotada pela ré, e por esta razão, a ação improcede.”

Na fundamentação, Soares citou caso emblemático apreciado pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar o Habeas Corpus 82.424. A corte sedimentou o entendimento de que a propagação de ideais nazistas não está protegida pela liberdade de expressão. O julgador acrescentou que, “se tolerarmos que o intolerante propague suas ideias, em dado momento seu ideal intolerante não poderá mais ser confrontado, conduzindo à supressão da liberdade de expressão”.

No entanto, ainda que os vídeos do autor não tivessem a intenção de promover apologia ao nazismo, conforme o julgador, eles auxiliam na mitigação do que efetivamente representou o regime nazista, na medida em que o coloca em um patamar mais brando, destoando da realidade histórica dos fatos.

O advogado recorreu ao Colégio Recursal de Santos, mas deixou de recolher as custas processuais e o seu recurso inominado não foi recebido, nos termos da Lei 9.099/1995. A sentença transitou em julgado.

Processo 1025764-94.2024.8.26.0562

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