Juíza condena Nikolas Ferreira a pagar R$ 200 mil por dano moral coletivo
30 de abril de 2025, 10h51
A juíza Priscila Faria da Silva, da 12ª Vara Cível de Brasília, condenou o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) a pagar indenização de R$ 200 mil por dano moral coletivo por causa de fala feita em 8 março de 2023 no plenário da Câmara dos Deputados.

Nikolas usou peruca durante fala na tribuna da Câmara no Dia Internacional da Mulher, em 2023
Na ocasião, em discurso alusivo ao Dia Internacional das Mulheres, o congressista vestiu uma peruca loira, disse que “se sentia mulher” e falou, entre outras coisas, que “as mulheres estão perdendo seu espaço para homens que se sentem mulheres”.
A partir da fala, as organizações Aliança Nacional LGBTI+ e Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (Abrafh) ajuizaram ação civil pública contra o deputado.
As autoras pediram indenização de R$ 5 milhões e tutela provisória antecipada determinando a exclusão de publicações relacionadas à fala. Apontaram que a manifestação do deputado configura transfobia, discurso de ódio e incitação à violência contra a população LGBT.
Nikolas se defendeu argumentando que a fala questionada estaria amparada pela imunidade parlamentar e pela liberdade de expressão. Alegou que se expressou daquela forma para “chamar a atenção para algo que, sob a sua ótica, é extremamente sério”. E negou ter proferido discurso de ódio.
Já o Ministério Público se manifestou pela procedência dos pedidos iniciais, traçando paralelo entre o uso de peruca para ridicularizar pessoas transgênero com a prática de black face (quando pessoas brancas pintam a pele de cor escura para representar pessoas pretas de forma exagerada e ofensiva). No entanto, o parquet considerou “exorbitante” o valor exigido pelas autoras e sugeriu a redução para R$ 200 mil.
Liberdade não é absoluta
Em sua decisão, a juíza ponderou que os direitos de livre manifestação do pensamento e de expressão são fundamentais, mas não absolutos. Lembrou que tal raciocínio encontra base no julgamento do Habeas Corpus 82.424 pelo Supremo Tribunal Federal e no artigo 187 do Código Civil (Lei 10.406/2002).
“Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”, diz o dispositivo.
“É possível restringir a liberdade de expressão quando o discurso é utilizado para praticar ou incitar conduta criminosa, com o único objetivo de ofender, ou mesmo para difundir o ódio contra grupos vulneráveis. Nessas circunstâncias, é dever do Poder Judiciário, uma vez provocado, realizar a ponderação de valores no caso concreto, para avaliar se o discurso foi abusivo na forma e/ou no conteúdo, e se deve prevalecer a liberdade de expressão ou a proteção aos direitos dos que alegam terem sido vítimas da ofensa”, escreveu a juíza.
Ela ressaltou, também, que um discurso de ódio pode ou não conter adjetivos pejorativos ou ordens explícitas de violência, existindo a possibilidade de ser “velado, subliminar ou sutil”.
“A ausência de termos explicitamente ofensivos não desnatura o cunho discriminatório do discurso, evidenciado desde a utilização de uma peruca para escarnecer a transição de gênero por que passam os indivíduos transsexuais até a propagação da ideia de que a existência de mulheres trans põe em risco direitos como a segurança e a liberdade de mulheres cisgênero”, explicou.
“A conclusão a que se chega é a de que os dizeres proferidos pelo réu no púlpito da tribuna da Câmara dos Deputados na data de 8 de março de 2023 desbordam dos limites do direito à livre manifestação do pensamento e constituem verdadeiro discurso de ódio, na medida em que descredibilizam a identidade de gênero assumida pela população transsexual e insuflam a sociedade a fazer o mesmo.”
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ACP 0720279-88.2023.8.07.0001
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