Opinião

Possíveis ilegalidades do governo paulista na regulamentação da transação estadual

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8 de março de 2024, 11h19

No início de fevereiro, foi divulgada a Resolução PGE nº 6/2024, que regulamenta a Lei Estadual nº 17.843/2023. A norma diz respeito à transação tributária relativa aos créditos de natureza tributária ou não tributária inscritos em dívida ativa.

Em síntese, a Resolução PGE determinou as condições necessárias para que ocorra a concessão da transação para a cobrança dos créditos inscritos em dívida ativa do estado de São Paulo, das autarquias e outros entes estaduais, com representação incumbida à Procuradoria Geral do Estado.

De acordo com a lei estadual, são modalidades de transação: por adesão, a qual o devedor deverá aceitar os termos e condições estabelecidos pelo edital; e por proposta individual ou conjunta de iniciativa do devedor ou do credor.

Na mesma linha, é vedada a transação que envolva: débitos não inscritos em dívida ativa; incida sobre débitos do ICMS de empresa optante pelo Simples Nacional; envolva o adicional do ICMS destinado ao Fecoep; acumulação das reduções decorrentes das modalidades de transação com quaisquer outras asseguradas na legislação em relação aos créditos abrangidos pela proposta de transação.

Porém, ainda que a resolução tenha vindo como forma de regulamentar a lei estadual referente a um programa de liquidação e parcelamento de débito oferecido pelo Estado, ela contém possíveis ilegalidades no seu texto.

Uma das obrigações, por exemplo, diz respeito ao reconhecimento da procedência dos pedidos de redirecionamento nas execuções fiscais que tenham por objeto os créditos incluídos na transação, através de petição nos autos judiciais. Essa obrigação implica em uma ação de terceiro que não necessariamente irá concordar com ela, o que já demonstra uma fragilidade do texto.

Outro ponto é que o texto determina a entrega da relação dos dez maiores clientes do devedor quando for solicitado, o que demonstra uma clara violação ao sigilo desse devedor, que terá por obrigação apresentar nomes que não são necessários para a Procuradoria.

Spacca

Além disso, diz Maia, o artigo 6º, IX, da resolução determina como obrigação “o reconhecimento da procedência dos pedidos deduzidos em ação cautelar fiscal ou em incidente de desconsideração da personalidade jurídica que tenham por objeto os créditos incluídos na transação, por meio de requerimento de extinção do processo com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, III, ‘a’ do Código de Processo Civil”.  Não há como o devedor reconhecer o pedido em nome de terceiros: “Há uma clara violação ao direito de defesa. Ademais, com o parcelamento há a perda de objeto das referidas medidas”.

É importante lembrar que o texto também apresenta irregularidades em relação às exigências e garantias. Por exemplo, no artigo 10, para os créditos considerados recuperáveis, o legislador determina como exigência a apresentação de garantias pelo devedor.

Na hipótese de pagamento do crédito entre 61 a 84 parcelas, poderão ser aceitas garantias como depósito judicial, fiança bancária, seguro garantia, penhora ou garantia real sobre bem imóvel, garantia real sobre bem móvel, cessão fiduciária de direito creditórios, entre outros. Já para os casos de pagamento entre 85 vezes até o número máximo de parcelas autorizado, as únicas garantias que poderão ser aceitas são depósito judicial, fiança bancária e seguro garantia.

Ilegal

A exigência das garantias é considerada ilegal, uma vez que não está na lei. Ademais, a realização do parcelamento já implica na suspensão da exigibilidade do débito por força do artigo 151, VI, do CTN, de modo que a exigência de garantia não faria sentido. No caso de adesão à transação com número de parcelas superior a 85 prestações, apenas três modalidades de garantias são aceitas, o que praticamente inviabiliza a modalidade, tendo em vista os custos envolvidos, além de violar a própria Lei de Execuções Fiscais.

De maneira geral, a resolução delineia os parâmetros e diretrizes a serem seguidos pelas partes envolvidas na transação, além de especificar as modalidades e determinar as responsabilidades tanto do contribuinte quando da PGE, bem como as exigências e concessões associadas a ela. Entretanto, é necessário analisar os impactos e se atentar à legalidade dos dispositivos apresentados pelo legislador.

Em outras palavras, a resolução estipula a abordagem da Procuradoria em relação à avaliação da recuperabilidade das dívidas, à definição de inadimplência sistemática e aos critérios para a aceitação da transação individual ou por adesão, mas ao determinar essas ações, o referido texto normativo viola sigilos e direitos do contribuinte, apresentando ilegalidades.

Faz-se necessário por parte da Procuradoria do Estado de São Paulo uma revisão urgente e criteriosa de, ao menos, parte dos atos de regulamentação supracitados, sob pena das ilegalidades apontadas serem levadas ao crivo do Poder Judiciário pelos contribuintes, o que impacta de forma significativa um dos pilares do programa de transação tributária, qual seja, a resolução e composição administrativa de débitos fiscais inscritos em dívida ativa.

Vale lembrar que o prazo para requerimento começou em 7 de fevereiro de 2024 e será encerrado em 29 de abril de 2024, ao passo em que o prazo para adesão se encerra no dia 30 de abril de 2024.

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