Opinião

Linguagem simples e objetiva pode ajudar a desafogar o Judiciário

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  • Renato de Mello Almada

    é advogado diretor jurídico da Confederação Brasileira de Cinofilia é pós-graduado em Direito dos Animais pela Faculdade de Direito de Lisboa (Portugal).

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10 de maio de 2024, 6h08

Todos sabemos que a sobrecarga de trabalho no Judiciário é enorme. Somente no Tribunal de Justiça de São Paulo, considerado o maior do mundo, atualmente estão em andamento cerca de 21 milhões de processos que devem ser absorvidos por 2.539 magistrados, que contam com o apoio de 40 mil servidores espalhados nas 320 comarcas do estado, para dar andamento aos atos processuais até sua decisão final.

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Igualmente é de conhecimento de todos a existência de infindáveis recursos previstos na legislação que, a par de garantir a ampla defesa, indevidamente usados protelam demasiadamente a prestação jurisdicional.

Há ainda as decisões contraditórias, mal redigidas ou que contrariam súmulas ou decisões proferidas pelos tribunais superiores, que também contribuem de forma negativa para a pronta e célere prestação jurisdição, por todos esperada.

Assim, em tese, todos os operadores do direito contribuem para a existência desse acervo absurdo de processos e de igual forma para a morosidade da resolução das demandas.

A Justiça tem que ser rápida e eficiente para ser Justiça. Ela não pode ficar parada. Deve seguir na estrada da vida, de forma segura, mas com agilidade, ultrapassando os obstáculos, com cautela, mas pedindo passagem para poder ser rápida.

E uma das formas encontradas para se tornar mais ágil é utilizar nos processos uma linguagem simples, direta e objetiva.

Em 30 anos de atividade na advocacia, venho defendendo essa simplicidade que, aliás, me foi incutida por meu saudoso pai, que exerceu a judicatura e a advocacia. Com essa visão ampla, sempre dizia que, se for necessária a utilização de mais de cinco páginas para o convencimento do direito, certamente esse direito não existia, ao menos de forma clara.

É humanamente impossível que magistrados e servidores consigam, por maior que sejam seus esforços, fazer frente ao elevado número de processos existentes, principalmente se estiverem recheados de linguagem ultrapassada ou com inúmeras citações doutrinárias e jurisprudenciais que consomem 20, 30, 40 páginas. Esse é um trabalho contraproducente para todos!

Não por outra razão, há no momento uma enorme campanha voltada para se deixar o juridiquês de lado, até como forma de ampliar o acesso ao Judiciário.

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O Conselho Nacional da Justiça (CNJ) publicou no ano passado a Recomendação nº 144, endereçada aos tribunais e conselhos para que utilizem linguagem simples, clara e acessível em todos os atos administrativos e judiciais, evitando a utilização de siglas, jargões e estrangeirismo.

Ainda em 2023, em dezembro, o CNJ lançou o “Pacto Nacional do Judiciário Pela Linguagem Simples”, que na ocasião foi apresentado pelo ministro Luiz Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF).

O Pacto tem por objetivo a adoção de linguagem simples, direta e compreensível a todas as pessoas na produção das decisões judiciais e na comunicação geral com a sociedade.

O desafio de aliar boa técnica, clareza e brevidade na comunicação precisa ser assumido como compromisso da magistratura nacional, ante o reconhecimento de que são condições indispensáveis para garantia do acesso à Justiça. Essa é a justificativa apresentada para a realização do pacto.

Os demais participantes do mundo do direito devem adotar igual prática. As petições devem ser claras e objetivas. Para que um pedido seja considerado fundamentado, ele não necessita de escritos extensos. Não é isso que garante uma decisão favorável.

Cinco minutos de sustentação oral

Os memoriais apresentados anteriormente aos julgamentos, como o mesmo nome indica, devem trazer uma curta memória do processo, destacando de forma assertiva o ponto que lhe é favorável.

A sustentação oral, que deve em todos os casos ser admitida, uma vez que se configura como ato do amplo exercício do direito de defesa, não deve ultrapassar mais do que cinco minutos, apesar de o tempo permitido ser de 15 minutos. O recado a ser dado tem que ser certeiro, objetivo, de maneira que se fixe na mente dos julgadores.

Dessa maneira haverá contribuição de todos para que o acesso à Justiça seja facilitado; para que as garantias fundamentais sejam respeitadas e que o Poder Judiciário possa cumprir com a obrigação de que todo o processo tenha uma duração razoável.

Não havendo um compromisso de todos, dificilmente o Judiciário terá condições de avançar na difícil e desgastante tarefa de julgar os milhares de processos existentes, permanecendo a situação de engarrafamento do trânsito das decisões. Todos somos partes nessa estrada.

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