Opinião

Flexibilização da penhora de salário: uma luz no fim do túnel

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6 de maio de 2024, 19h21

No processo civil, após todo trâmite instrutório, o magistrado define o que é de direito a cada parte em sede de sentença. Após o trânsito em julgado desta decisão, sendo cabível, começa para a parte que venceu o processo a fase de execução para que possa receber o que lhe cabe.

Quando a sentença determina o pagamento de uma quantia, o beneficiário tem o direito de solicitar o cumprimento da obrigação de pagamento. Em caso de descumprimento por parte do devedor, o credor pode recorrer à penhora de bens, conforme estipulado no artigo 789 do Código de Processo Civil.

Art. 789. O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.

Porém, o regramento jurídico, no seu artigo 833, define quais são os bens impenhoráveis, ou seja, que não podem ser alcançados em sede de execução judicial, como móveis de baixo valor, itens de vestuário, bens inalienáveis, instrumentos de trabalho, entre outros.

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Historicamente, a penhorabilidade de salário tem sido um tema delicado. Afinal, o salário é considerado um bem impenhorável por lei, uma proteção necessária para garantir a subsistência do devedor e sua família. No entanto, essa proteção legal muitas vezes se transformava em um escudo para os devedores inadimplentes, que se aproveitavam dessa brecha para evitar o pagamento de suas dívidas.

Ocorre que, em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) flexibilizou o entendimento do inciso IV do artigo 833 do Código de Processo Civil, permitindo a penhora de salários.

No julgamento dos Embargos de Divergência nº 1874222, a Corte Especial do STJ decidiu que, em caráter de exceção, é possível relativizar a impenhorabilidade de salários do executado, independentemente do valor recebido pelo devedor, desde que seja resguardado para este quantia digna para subsistência própria e de sua família.

O relator do caso, ministro João Otávio de Noronha, em sua decisão, afirmou que a flexibilização só deve ocorrer em caso de esgotamento de outros meios de penhora e com a devida avaliação do caso, sendo certo que o colegiado acompanhou o entendimento do relator.

Como era a jurisprudência do STJ

Anteriormente, a jurisprudência do próprio STJ era de que os rendimentos do devedor só poderiam ser penhoráveis em caso de verba alimentar ou, para dívidas em geral, se o executado recebesse mais de 50 salários-mínimos. Contudo, o ministro João Otávio afirmou que o limite anterior destoava da realidade brasileira, basicamente não tendo efeito prático, e que se deve levar em conta não só o direito e a dignidade do devedor, mas também do credor.

A decisão do STJ de flexibilizar a penhorabilidade de salário representa um marco significativo para o processo executório brasileiro. Essa mudança, que pode parecer pequena à primeira vista, tem o potencial de alterar profundamente a dinâmica entre credores e devedores, trazendo mais equilíbrio e justiça ao sistema, posto que, muitas vezes, o exequente vencia o processo, mas não conseguia ter acesso ao que lhe era de direito devido às amarras legais de impedem a penhora de bens do devedor.

Contudo, com a nova jurisprudência do STJ, será mais fácil para os credores terem acesso às quantias determinadas em sentença, e ainda poderá coibir devedores de realizarem manobras para se esquivarem de pagar o que é devido.

Ao flexibilizar a penhorabilidade de salário, o tribunal promove um equilíbrio mais justo entre os direitos dos credores e dos devedores, contribuindo para um sistema jurídico mais eficiente e justo. É uma luz no fim do túnel para aqueles que lutam para ter seus direitos reconhecidos e respeitados.

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