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Supremo vai julgar descriminalização do aborto em sessão presencial

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22 de setembro de 2023, 9h40

Um pedido de destaque do ministro Luís Roberto Barroso interrompeu, nesta sexta-feira (22/9), o julgamento do Plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de descriminalização do aborto em qualquer circunstância até a 12ª semana de gestação.

Fellipe Sampaio/SCO/STF
Luís Roberto Barroso pediu destaqueFellipe Sampaio/SCO/STF

A análise virtual havia começado nesta madrugada. Agora, o julgamento será reiniciado em sessão presencial, ainda sem data marcada. Antes do destaque, a relatora, ministra Rosa Weber, havia votado a favor da descriminalização do aborto até as 12 primeiras semanas.

Contexto
Na ação, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e o Instituto de Bioética Anis defendem a inconstitucionalidade dos dispositivos do Código Penal que tratam a opção pelo aborto como crime.

O artigo 124 prevê pena de prisão, de um a três anos, para quem "provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque". Já o artigo 126 pune quem "provocar aborto com o consentimento da gestante" com um a quatro anos de prisão.

Pela legislação, o aborto só não é crime em caso de estupro ou quando não há outro meio de salvar a vida da gestante. Além disso, a jurisprudência do STF permite o aborto nos casos de fetos anencéfalos.

Vida do feto e da mulher
Presidente do STF e relatora da ação, Rosa afirmou que não há direito fundamental à vida do embrião ou feto. Segundo ela, o constitucionalismo brasileiro e o Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos não adotam a tese do direito à vida desde o momento da concepção.

A Comissão Europeia de Direitos Humanos também já definiu que tal conceito não leva em consideração o nascituro, mas apenas as pessoas nascidas. "Interpretação em sentido contrário seria atribuir à vida não nascida proteção jurídica absoluta, em face da mulher gestante", apontou Rosa.

De acordo com ela, a fórmula atualmente usada no Brasil "se mostra excessiva ao não considerar a igual proteção dos direitos fundamentais das mulheres, dando prevalência absoluta à tutela da vida em potencial".

A magistrada ainda argumentou que a maternidade é uma escolha, e não uma "obrigação coercitiva". Para ela, impor a continuidade da gravidez em qualquer circunstância é uma forma de "violência institucional contra a integridade física, psíquica e moral da mulher, colocando-a como instrumento a serviço das decisões do Estado e da sociedade, mas não suas".

Saúde pública
Em seu voto, a presidente do Supremo explicou que os direitos sexuais e reprodutivos da mulher se baseiam em um conceito amplo de saúde, no qual estão incluídos o controle e a redução da mortalidade materna e de suas causas.

O Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) autoriza os países a adotar medidas para regular a interrupção voluntária da gravidez, mas não permite que tais medidas violem os direitos das mulheres. As restrições não podem, por exemplo, colocar em risco suas vidas, sujeitá-las a dor e sofrimento ou interferir na sua vida privada.

Ou seja, os Estados precisam "proporcionar um acesso seguro, legal e eficaz ao aborto sempre que esteja em risco a vida e saúde da mulher", para que as gestantes não tenham de fazer abortos inseguros. O Comitê expressamente diz que os países não devem aplicar sanções penais às mulheres que recorrem ao aborto ou aos médicos que lhes prestam assistência.

A ministra ainda apontou manifestações de diversas entidades — como o Ministério da Saúde, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Academia Nacional de Medicina (ANM) — que classificam o aborto como um problema de saúde pública das mulheres. O aborto inseguro é uma das quatro causas diretas da mortalidade materna.

Em audiência pública, a Fiocruz defendeu que desconsiderar o desejo de interrupção da gravidez de forma segura é equivalente a "condenar muitas mulheres a piores condições de saúde, que são desproporcionalmente mais elevadas entre aquelas em baixas condições socioeconômicas".

Rosa fez um levantamento de casos sobre aborto voluntário levados às Cortes Constitucionais de diversos países. Ela notou uma tendência contemporânea de "colocar, no panorama internacional, o problema da saúde sexual e reprodutiva das mulheres como uma questão de saúde pública e de direitos humanos".

Proibição ineficaz
Com base em dados sobre a grande quantidade de ações penais envolvendo abortos, a relatora constatou que a prática está "enraizada na sociedade". Assim, sua criminalização "não atende à função preventiva da pena".

Segundo ela, a sanção penal pelo aborto "não tem eficácia na prática social". Na verdade, "a criminalização vulnera os princípios fundamentais do Direito Penal e os direitos das mulheres, enquanto não protege o feto".

Clique aqui para ler o voto da relatora
ADPF 442

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