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Cláusula de barreira alcançada após incorporação tira direito de mudar de partido, decide TSE

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7 de novembro de 2023, 21h12

O parlamentar eleito por partido que não alcança a cláusula de barreira nas eleições deixa de ter o direito de trocar de legenda sem perder o mandato quando essa mesma cláusula é alcançada devido à incorporação de outro partido.

Najara Araujo/Agência Câmara
Constituição dá aos parlamentares o direito de trocar de partido quando suas legendas não alcançarem a cláusula de barreira

Com esse entendimento, e por maioria de votos, o Tribunal Superior Eleitoral decretou a perda do mandato do deputado federal por São Paulo Marcelo Lima, que trocou o Solidariedade pelo PSB após ser eleito no ano passado.

O caso, definido como sui generis (sem semelhança com outros), foi decidido pela forma atropelada como o parlamentar lidou com a própria situação partidária. Sua tentativa de trocar de legenda na última hora deu errado por uma tecnicalidade prevista em resolução do TSE.

Roteiro completo
Marcelo Lima teve cerca de três meses e meio para trocar de partido. Isso era possível porque o Solidariedade não superou a cláusula de barreira, prevista na Emenda Constitucional 97/2017, nas eleições de 2022. Assim, a legenda perdeu acesso ao Fundo Eleitoral e tempo de propaganda eleitoral gratuita.

Isso deu aos seus parlamentares o direito de migração partidária, conforme previsto no artigo 17, parágrafo 5º, da Constituição Federal. A partir daí, o Solidariedade seguiu o roteiro que a EC 97/2017 buscou incentivar: negociou uma incorporação de outro partido pequeno.

O TSE marcou o julgamento da incorporação do PROS a seus quadros para a noite de 14 de fevereiro. Se o pedido fosse deferido — como de fato ocorreu — a legenda teria número suficiente de eleitos para superar a cláusula de barreira. Marcelo Lima perderia, assim, o direito de migrar de partido.

Na tarde de 14 de fevereiro, horas antes do julgamento, ele comunicou o Solidariedade por escrito do seu desejo de se desfiliar, cumprindo uma parte do rito exigido pelo TSE, conforme o artigo 24 da Resolução 23.596/2019.

A outra parte seria informar o juiz eleitoral da zona em que foi inscrito, o que ele só fez no dia seguinte, quando a incorporação partidária já havia sido autorizada pelo TSE. Assim, o deputado não tinha mais o direito de mudar de legenda.

Alejandro Zambrana/Secom/TSE
Ministro André Ramos Tavares, relator no TSE, entendeu que deputado federal perdeu prazo

Perdeu o bonde
Venceu no julgamento a posição do relator, ministro André Ramos Tavares, para quem Marcelo Lima perdeu o prazo para se desfiliar do Solidariedade. Essa interpretação decorre do texto usado pelo TSE para esclarecer o rito de desfiliação, na Resolução 23.596/2019.

O parágrafo 2º do artigo 24 diz que o vínculo partidário se torna extinto dois dias após a data da entrega da comunicação no cartório eleitoral. E o artigo 3º informa que, na falta dessa comunicação, o registro partidário ainda será considerado válido.

Formaram a maioria os ministros Floriano de Azevedo Marques, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves e Alexandre de Moraes. Para todos eles, a incorporação partidária capaz de superar a cláusula de barreira eliminou a possibilidade de troca de legenda sem perda do mandato.

Alexandre negou a hipótese de Marcelo Lima ter sido surpreendido pela incorporação, já que ela foi discutida por meses e noticiada na mídia. Mesmo o julgamento do caso no TSE foi anunciado com antecedência quatro dias, tempo suficiente para que ele providenciasse a desfiliação.

O ministro explicou ainda que a importância da comunicação ao cartório eleitoral reside no fato de que não há controle externo do que é protocolado nos partidos. Assim, não haveria como saber a data em que Marcelo Lima realmente informou o Solidariedade sobre sua intenção de sair do partido.

In dubio pro sufrágio
Abriu a divergência o ministro Kassio Nunes Marques, para quem basta a data de formalização do pedido de desfiliação protocolado no Solidariedade. Ou seja, o documento enviado ao partido horas antes de a incorporação ser autorizada pelo TSE seria suficiente para afastar a perda do mandato.

Ele destacou que a jurisprudência do tribunal considera como marco inicial para ajuizar ação de decretação de perda de mandato por infidelidade partidária a data em que o candidato informa ao partido sobre sua saída da legenda.

“Estaríamos limitando o exercício de direito para qual não foi estabelecido marco temporal pela Constituição Federal, pela lei eleitoral, por regulamento deste TSE ou mesmo por decisão de nossa lavra. Quando ele se desfiliou, não havia uma única decisão em que se basear”, alertou o magistrado.

Seguiu a mesma linha e também ficou vencido o ministro Raul Araújo, que destacou que não há como presumir a má-fé de Marcelo Lima no episódio, já que a incorporação do Pros pelo Solidariedade não poderia ser tida como certeza, uma vez que havia disputa jurídica no partido incorporado.

Além disso, o acórdão do TSE que autorizou a incorporação partidária só foi publicado e informado às partes em momento posterior ao aviso de desfiliação feito ao cartório eleitoral pelo parlamentar. Já a Câmara dos Deputados só soube em 16 de março.

AJDesCargEle 0600118-15.2023.6.00.0000

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