Anuário da Justiça Federal

Produtividade do TRF-3 contrasta com situação de suas varas e juizados

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7 de março de 2023, 8h13

*Reportagem publicada no Anuário da Justiça Federal 2022 | 2023, lançado na quinta-feira, dia 2 de março. A publicação está disponível gratuitamente na versão online (clique aqui para acessar) e à venda na Livraria ConJur, em sua versão impressa (clique aqui para comprar).

A crise sanitária que produziu grandes tragédias no mundo parece ter gerado oportunidades para o Tribunal Regional Federal da 3ª Região. A corte aproveitou o esvaziamento de sua sede e a reorganizou por inteiro em busca de mais racionalidade, fundindo secretarias e otimizando os espaços físicos, antes ocupados por pilhas e pilhas de processos físicos.

Com praticamente a totalidade de processos digitalizados dentro do sistema do Processo Judicial Eletrônico (PJe), desembargadores e servidores consolidaram o sistema híbrido de trabalho. E a mudança não fez mal: a produtividade aumentou nos últimos anos. Em 2019, o tribunal julgou um total de 180 mil processos, 25 mil a mais que a distribuição; em 2020, o ano do choque da epidemia, foram 50 mil acima da distribuição, com 200 mil julgados; em 2021, foram 80 mil julgados a mais, também na casa dos 200 mil julgados, mas com distribuição menor no ano.

A retomada dos trabalhos na forma presencial seguiu resoluções da Presidência, que determinou a presença dos servidores no gabinete dois dias úteis da semana, com percentual de 40% da força de trabalho na unidade, o que foi observado e possibilitou a retomada das atividades de forma semelhante ao que era antes da epidemia.

O uso da videoconferência resultou em alteração no Regimento Interno da corte. As sessões de julgamento agora podem ser híbridas, ou seja, desembargadores e advogados comparecem presencialmente, mas aqueles impossibilitados de se deslocar até o tribunal ou residentes em outras cidades podem participar da sessão remotamente.

A nova direção assumiu em março de 2022. A desembargadora federal presidente do TRF-3, Marisa Santos, teve que encarar um sério problema no início da gestão. Em 30 de março, a corte sofreu um ataque hacker em sua rede interna, a poucos dias da emissão dos precatórios, cujo prazo se encerrava em 2 de abril. O problema só foi superado depois de recorrer ao Conselho Nacional de Justiça e à Polícia Federal. “Percebemos, então, que tínhamos de dar prioridade aos investimentos em segurança de TI”, comenta a presidente da corte.

O tribunal vem passando por grande renovação no quadro de desembargadores. Diva Malerbi, Newton de Lucca, Lúcia Ursaia, Batista Gonçalves e Luiz Stefanini (então corregedor) deixaram o tribunal ao fazerem 75 anos. Cinco novos desembargadores chegaram ao tribunal, sendo quatro juízes de carreira (Victorio Giuzio, Ali Mazloum, Leila Paiva e Herbert de Bruyn), e um advogado pelo quinto constitucional (Marcelo Vieira). Duas das 43 vagas restam em aberto.

O número de desembargadores foi ampliado de 43 para 55. Em um primeiro momento, serão preenchidas quatro vagas – três da carreira e uma do Ministério Público Federal. Os novos desembargadores irão para a 1ª e 4ª Seções, e assim, as 11 turmas do tribunal ficarão com quatro julgadores.

Como a lei que determinou o aumento do número de desembargadores não autoriza o aumento de despesas, o tribunal terá de remanejar os servidores já contratados para atender os novos gabinetes: “Com a redistribuição de processos que faremos, cada gabinete vai perder um pouco do que tem para julgar e vai poder perder servidores para os novos gabinetes”, explica a presidente. Serão dois servidores a menos em cada gabinete, passando de 18 para 16.

Como apontado por correição do Conselho da Justiça Federal no primeiro semestre de 2022, os julgamentos estendidos nas turmas que lidam com Processo Civil, sistemática disposta no artigo 942 do CPC, continuam morosos. Desde sua implantação, em 2016, as turmas não conseguem fazê-lo de forma imediata, como prevê o código, já que nos TRFs elas têm só quatro integrantes, e não cinco, como nos TJs.

Isso faz com que seja preciso convocar desembargadores de outras turmas para sessões seguintes, que com frequência ocorrem meses depois do primeiro julgamento. As pautas são preparadas com meses de antecedência e os conflitos de agenda com os desembargadores convocados são constantes.

“Por incompatibilidade de agenda, pelo número de processos, por uma série de coisas, só se consegue marcar para dali a cinco, seis meses. Tenho tentado fazer rápido, não passar de três meses, mas isso faz com que eu tenha que acionar toda hora o pessoal da 8ª Turma. É nossa obrigação? Lógico que é, mas é complicado. Porque você já tem os seus processos, e vai votar nos processos mais complicados da outra turma, que são aqueles que geraram divergência. É difícil. Por isso turmas com cinco integrantes resolvem o problema do Processo Civil”, comenta Carlos Delgado, da 7ª Turma.

O CJF relatou que há turmas com grande acúmulo de processos parados no 942. Algumas já fazem sessões extraordinárias somente para dar vazão a esses casos.

Como a lei da ampliação prevê oito vagas – e são onze turmas, o que permitiria que todas elas ficassem com cinco membros –, uma alternativa seria os três desembargadores que compõem a Direção da corte não perderem seus assentos na turma, e, em seus lugares, haver sempre três juízes convocados recebendo distribuição normalmente. Hoje, na prática, 40 desembargadores recebem distribuição nas turmas. O Pleno ainda definirá a solução mais adequada.

Demandas

Questões previdenciárias são de longe o tema mais julgado no tribunal, como se vê no quadro ao lado. Foram 74 mil casos em 2021, quase cinco vezes mais que o segundo assunto, tributos relacionados ao PIS e à Cofins. Dos dez temas que mais aparecem no quadro, quatro dizem respeito a benefícios previdenciários e assistenciais, três a tributos, um a discussões sobre sanções administrativas, um a anuidades de conselhos profissionais e um a contratos da Caixa Econômica Federal.

Na 3ª Seção, houve baixa na distribuição em 2021, que refletiu na estatística do tribunal como um todo, mas aumentaram os casos de pedido de benefício por incapacidade durante a epidemia.

A seção julga uma questão sensível sobre a possibilidade de devolução de benefícios pelo segurado quando, ao final, ele não tem a tutela antecipada confirmada. O Superior Tribunal de Justiça tem precedentes qualificados pela devolução, mas existe uma corrente de desembargadores que cita precedentes do Supremo Tribunal Federal favoráveis aos segurados.

A 2ª Seção sentiu um aumento de mandados de segurança sobre negativa ou demora de atendimento nos postos do INSS, já que, durante a epidemia, houve muito atraso na apreciação dos pedidos por conta da paralisação das perícias médicas. Os casos acabam desaguando na seção, que julga a legalidade de atos administrativos.

Na 4ª Seção, desembargadores relatam que sentiram o crescimento de casos envolvendo a divulgação e o armazenamento de pornografia infantil, fruto da intensificação de operações da Polícia Federal no combate a esse tipo de crime. No mais, os crimes de contrabando de cigarros falsificados e o tráfico internacional de drogas continuam uma constante.

Primeira instância
Se o TRF-3 comemora seus resultados e a melhoria de sua estrutura, o primeiro grau não tem esse privilégio. A carência de mão de obra é grande: faltam hoje, na 3ª Região, 109 juízes e 500 servidores. De 2019 a 2022, houve crescimento de 19,5 % do acervo, atualmente com 3,2 milhões de processos, com a ressalva de que 1,9 milhão desse total corresponde a processos sobrestados em primeiro grau.

O primeiro grau, nos últimos quatro anos, não vem conseguindo julgar mais que a distribuição, ao contrário do segundo. Chama a atenção o aumento exponencial da distribuição de casos em 2021: de 535 mil no ano anterior para 805 mil, 90% disso nos Juizados Especiais. Isso tem explicação: os JEFs da 3ª Região vivenciam momento delicado, com aumento expressivo da taxa de congestionamento líquida a partir de 2019.

Com ritos mais abreviados, fomento à conciliação, desnecessidade de representação de advogado antes da fase recursal e de pagamento de custas, taxas e despesas, eles atraíram a maior parcela das ações ingressadas na Justiça Federal. Também, o entendimento jurisprudencial de que a complexidade da causa ou a necessidade de produção de prova pericial não afastam a competência dos JEFs.

No ranking de assuntos mais demandados no microssistema, de modo perene, encontram-se os processos relacionados a litígios de Direito Previdenciário e Assistencial (auxílio por incapacidade temporária, benefícios por incapacidade permanente, aposentadorias programadas, pensão por morte e benefícios assistenciais de prestação continuada).

Além disso, circunstancialmente, calcados tão somente no critério objetivo do valor da causa, outros assuntos ensejaram considerável incremento da distribuição e do acervo processual, a exemplo dos relacionados aos índices de correção monetária do saldo das contas vinculadas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e ao Auxílio Emergencial, instituído para o enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente da covid-19.

A quarentena imposta pela epidemia postergou a prática de atos processuais presenciais (tais como perícias e audiências), o que contribuiu para agravar a taxa de congestionamento dos JEFs da 3ª Região. Segundo a desembargadora Daldice Santana, coordenadora dos juizados na região, “a questão é muito mais complexa e está imbricada com outras causas que enfraquecem a capacidade operacional dos JEFs de dar vazão à crescente demanda em prazo razoável”.

Dentre as causas mencionadas, ela destaca: o forte incremento no número de distribuição e do acervo em tramitação ocasionado pela mitigação da competência delegada introduzida pela Emenda Constitucional 103, de novembro de 2019, sem reforço da estrutura ou da força de trabalho; o circunstancial aumento do número de distribuição e do acervo em tramitação destinado a questionar a utilização da TR como índice de correção monetária dos depósitos das contas vinculadas do FGTS e a negativa administrativa de concessão do Auxílio Emergencial; a migração dos processos do SisJEF para o Sistema PJe, deflagrando naturais dificuldades de adaptação dos usuários à nova ferramenta; e a expressiva diminuição da força de trabalho das unidades judiciárias da 3ª Região, impulsionada pela Emenda Constitucional 95, de 15 de dezembro de 2016, que instituiu a chamada “regra de ouro” ou “teto de gastos”.

O JEF de Araçatuba, por exemplo, sentiu o impacto da mitigação da competência delegada de tal forma que está com 23 mil processos. Daldice Santana e Marisa Santos estão atentas à situação. Inclusive, a presidente do TRF-3 visitou esses juizados em novembro e busca amenizar o “estrago”, embora se diga favorável à concentração dos casos na Justiça Federal. “A Justiça Federal tem que assumir a sua competência, sim.”

Já na área das execuções fiscais, algo pode ser comemorado. A Fazenda Nacional está racionalizando o ajuizamento de ações e os impactos já estão sendo sentidos. Antes, tudo era ajuizado. “A Fazenda agora ajuíza as execuções fiscais depois de uma pesquisa daquilo que é viável cobrar. Com relação ao que está ajuizado, eles estão fazendo o que chamam de uma limpeza junto com o Judiciário e diminuindo esses acervos”, diz Marisa Santos. E, com relação aos diversos casos que estão sobrestados pelo artigo 40 da Lei de Execução Fiscal, a Fazenda está já verificando o que prescreveu e, aos poucos, pedindo a extinção desses processos.

“Primeiro, a Procuradoria da Fazenda Nacional implementou o plano de qualificação da cobrança dos créditos tributários. Padronizou a forma de seleção dos créditos passíveis de recebimento em ações judiciais; sobrestou as demandas sabidamente inúteis ou com valores ínfimos (menores que R$ 20 mil) e focou nos médios (entre R$ 1 milhão e R$ 10 milhões) e grandes devedores (acima de R$ 10 milhões), os quais representam cerca de 90% da dívida ativa”, explica o juiz Denilson Branco, especializado na área.

Segundo, ele diz, “no âmbito administrativo, utilizou-se métodos alternativos de cobrança, como o protesto extrajudicial da certidão da dívida ativa e restrições de crédito perante o Serasa, além de se aprimorar as informações dos devedores por intermédio de sofisticados programas de computadores, que cruzam as informações disponíveis de bens, direitos e sociedades, e definem uma probabilidade de sucesso da demanda judicial”.

Outros fatores que ajudaram foi a instalação e o aprimoramento do uso do PJe, com ganho de escala no processamento dos feitos. E, ainda, as ferramentas eletrônicas de localização do devedor e de seus bens foram aprimoradas pelo Conselho Nacional de Justiça. Tais inovações proporcionaram a redução de processos novos perante o Poder Judiciário, além de acelerar o sobrestamento ou mesmo a extinção dos processos pela prescrição intercorrente (após seis anos no sobrestamento).

“Ainda há muito por fazer para diminuir a morosidade processual, mas a melhora contínua dos sistemas processuais e das alternativas à ação judicial apontam a direção certa na gestão da demanda, sem a necessidade de aumento de despesas com novas varas, pessoal ou estrutura física”, complementa Denilson Branco.

Segundo Marisa Santos, esses bons resultados já estão fazendo com que a 3ª Região aproveite as varas de execução fiscal e mude a sua competência. Ela afirma que é urgente haver mais varas de juizado. “Vamos instalar a terceira vara do Juizado Especial Federal de Campinas. A iniciativa é de dois juízes de uma Vara de Execução Fiscal de Campinas, que a  ofereceram para a transformar na terceira vara do Juizado Especial de Campinas. Oferecimento imediatamente aceito.”

ANUÁRIO DA JUSTIÇA FEDERAL 2022 | 2023
ISSN: 2238107-4
Número de Páginas: 236
Editora: Consultor Jurídico
Versão impressa: R$ 40, na Livraria ConJur
Versão digital: gratuita, acesse pelo site anuario.conjur.com.br e
pelo app Anuário da Justiça

Anunciantes desta edição
Advocacia Fernanda Hernandez
Arruda Alvim & Thereza Alvim Advocacia e Consultoria Jurídica
Ayres Britto Consultoria Jurídica e Advocacia
Basilio Advogados
BFBM – Barroso Fontelles, Barcellos, Mendonça Advogados
Bialski Advogados Associados
Bottini & Tamasauskas Advogados
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil
Dannemann Siemsen Advogados
De Rose Advogados
Décio Freire Advogados
Dias de Souza Advogados
Duarte Garcia, Serra Netto e Terra Advogados
D’Urso & Borges Advogados Associados
Fidalgo Advogados
Heleno Torres Advogados
JBS S.A.
Machado Meyer Advogados
Marcus Vinicius Furtado Coêlho Advocacia
Milaré Advogados
Moraes Pitombo Advogados
Mudrovitsch Advogados
Original 123 Assessoria de Imprensa
Pardo Advogados & Associados
Pinheiro Neto Advogados
Refit
Sergio Bermudes Advogados
Warde Advogados

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