perseguição política

Vereadora cassada em SC por criticar gesto nazista pede restituição do mandato

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2 de março de 2023, 9h47

A vereadora cassada Maria Tereza Zanella Capra (PT), de São Miguel do Oeste (SC), acionou a Justiça para pedir a restituição do seu mandato. Ela apontou cerceamento de seu direito de defesa, falta de justificativas plausíveis e uma perseguição política por parte de seus opositores.

Câmara dos Vereadores de São Miguel do Oeste
 Maria Tereza Capra, vereadora do PT, foi cassada após repudiar saudação nazistaCâmara dos Vereadores de São Miguel do Oeste

A petição inicial é assinada pelos advogados Fábio Tofic Simantob, Sérgio Francisco Graziano, Ranieri Resende, Mauro de Azevedo Menezes Thúlio Guilherme Nogueira, além do jurista Lenio Streck, colunista da revista eletrônica Consultor Jurídico.

A Câmara Municipal cassou o mandato de Maria Tereza no último dia 4/2, por quebra de decoro parlamentar, após a vereadora repudiar um gesto feito por bolsonaristas da cidade durante um ato em novembro do último ano.

Em seu perfil no Instagram, a petista gravou um vídeo em que mostrava que os bolsonaristas que cantavam o hino nacional com os braços estendidos estavam ecoando o "Sieg Heil", a saudação nazista. O Ministério Público estadual, mais tarde, não identificou a intenção dos cidadãos em fazer apologia à ideologia totalitária e racista.

No último ano, Streck, Resende, Menezes e Marcelo Cattoni acionaram o Ministério Público Federal para criticar o trabalho do MP-SC ao arquivar o caso tão rapidamente.

Uma das denúncias que levou à cassação do mandato também mencionava uma condenação de Maria Tereza pela suposta prática de crime licitatório durante sua gestão como secretária municipal de Cultura. O caso ainda não transitou em julgado.

Irregularidades processuais
Inicialmente, a vereadora pediu à Comissão de Inquérito Parlamentar que fosse descrita, de forma objetiva, a conduta imputada, para compreender adequadamente a acusação. Segundo sua defesa, as representações eram genéricas e citavam apenas condutas incompatíveis com o exercício de sua função.

O pleito foi negado e a defesa foi imediatamente intimada para apresentar, em cinco dias, suas razões finais e se manifestar sobre os documentos juntados aos autos pela comissão. A decisão também informou o fim da fase probatória, com indicação de que a petista teria permanecido inerte. Mais tarde, uma nova decisão contrariou a anterior e a intimou para oitiva.

Maria Tereza então pediu a declaração de impedimento do presidente da Câmara Municipal, Vanirto José Conrad (PDT) — que recebeu as denúncias —, e de dois membros da comissão de inquérito: Ravier Centenaro (PSD) e  Carlos Roberto Agostini (MDB), este último designado presidente.

A parlamentar indicou que os três colegas participaram do ato bolsonarista criticado por ela, e portanto eram vítimas autodeclaradas das manifestações supostamente ofensivas.

Além disso, em seus discursos na apresentação de moção de repúdio contra a vereadora, todos eles anteciparam seu interesse em cassá-la. No caso de Conrad, Maria Tereza também contou que foi testemunha de acusação em uma ação penal eleitoral na qual ele era réu.

Reprodução
Bolsonaristas fizeram gesto semelhante à saudação nazista 'Sieg Heil'Reprodução

Mesmo assim, o impedimento sequer foi apreciado pela comissão. Ela foi cassada sem que os vereadores considerassem aplicar qualquer outra sanção.

À Justiça, a defesa da petista lembra que, conforme precedentes da Corte Interamericana de Direitos Humanos, as regras do devido processo valem para quaisquer procedimentos que resultem em cassação de mandato popular.

Acusações infundadas
Os advogados da vereadora cassada destacam que ela não gravou nem replicou o vídeo dos bolsonaristas, mas apenas fez comentários a seu respeito.

Eles recordam da imunidade parlamentar por opiniões, palavras e votos no exercício do mandato. Maria Tereza se pronunciou na sua função de política, pois gravou o vídeo por demanda de seus eleitores, indignados com o gesto feito na ocasião.

De qualquer forma, a petista não direcionou as críticas a nenhuma pessoa específica e não pediu a instauração de procedimento criminal para apurar a prática de crime de ódio contra ninguém.

Quanto à condenação por crime licitatório, os juristas explicam que a denúncia se baseou em uma "falsa correlação" entre o exercício do mandato vigente e a inelegibilidade. A Lei da Ficha Limpa não diz que os condenados são considerados indecorosos, mas sim inelegíveis. Ou seja, a condenação teria efeitos somente com relação a uma candidatura futura.

Além disso, a ação penal está em fase recursal nas cortes superiores, com "alta probabilidade" de reversão. "Pode-se dizer que a absolvição da vereadora é a única solução juridicamente possível", argumentam os advogados.

No processo, Maria Tereza foi denunciada por violar o artigo 89 da Lei das Licitações, devido à contratação direta de artistas fora das hipóteses previstas pela norma, entre 2010 e 2012. Porém, em 2021, a lei foi alterada e a conduta pela qual a petista foi condenada deixou de ser prevista como crime.

Perseguição política
De acordo com a defesa, o procedimento ético-disciplinar "foi utilizado como instrumento de perseguição política movido pela ala opositora" à vereadora cassada, que era a única representante do PT na Câmara Municipal.

Conforme a petição inicial, tal ala "não aceita a divergência de opinião político-partidária e o exercício da liberdade de expressão e de livre manifestação da requerente". Os juristas lembram que os vereadores responsáveis pelo processo participaram dos atos antidemocráticos ocorridos na cidade, que questionavam o resultado das eleições presidenciais e pediam a intervenção das Forças Armadas.

"Por mais rigorosa que seja o exame do comportamento da vereadora, nada subsiste a justificar qualquer espécie de punição, muito menos a mais drástica e traumática delas", diz Simantob.

Clique aqui para ler a petição inicial

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