Opinião

Por que as cotas preferenciais estão subutilizadas nas sociedades limitadas

Autor

  • João Filipe Carneiro Ribeiro

    é pós-graduado em Direito Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG) e advogado do escritório Telino & Barros Advogados Associados na área Cível Empresarial.

21 de dezembro de 2023, 18h20

A partir da vigência da Instrução Normativa nº 81/2020, do Departamento do Registro Empresarial e Integração (Drei), as sociedades empresárias limitadas puderam optar pela admissão e utilização de cotas preferenciais, tal qual as sociedades anônimas.

Editada sob a lógica proposta pela Lei de Liberdade Econômica, a Instrução Normativa nº 81/2020 teve como maior objetivo a eficiência econômica através da desburocratização do exercício da atividade empresarial, da simplificação dos procedimentos e do fortalecimento da autonomia privada a fim de criar um ambiente de negócios mais atrativo para empresários e investidores [1].

Isso quer dizer que as sociedades empresárias foram autorizadas a utilizar um instituto até então exclusivo às sociedades anônimas para constituição de seu quadro de sócios, e, com isso, inovar nos arranjos societários.

Dentre esses novos acordos, surgiu a possibilidade da captação de recursos financeiros mediante emissão de cotas preferenciais nas sociedades limitadas que sejam alienadas em favor de algum investidor, ou então, permitiu-se aos então sócios captarem e reterem talentos para suas empresas que tenham, porventura, interesse em tornassem sócios, uma vez que as cotas preferenciais podem garantir remunerações mais adequadas através da distribuição de lucro e percepção mensal de pro labore, inclusive de forma preferencial aos demais sócios.

Do ponto de vista legislativo, a Instrução Normativa em análise deixa claro que a utilização desse instituto deve guardar compatibilidade com as previsões da Lei nº 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas).

Logo, as cotas preferenciais presumem uma preferência financeira perante a sociedade limitada naquilo que diz a respeito da distribuição de lucros e recebimento de valores, aquisição de novas cotas, e demais privilégios que podem ser instituídos no contrato social.

Ao mesmo tempo que essa modalidade guarda consigo certos privilégios, também restringe ou limita alguns dos direitos de seus titulares, como por exemplo, o direito de voto em assembleia de cotistas. Contudo, é pertinente apontar que essas restrições e limitações devem vir expressamente consignadas no estatuto, nesse caso, o contrato social – conforme disposto no artigo 19, da Lei nº 6.404/76 –, e jamais poderão privar o titular da cota preferencial dos seus direitos fundamentais de cotista [2].

Inclusive, é correto afirmar que é possível criar classes distintas de cotas preferenciais, uma vez que o artigo 11, §1º, da lei citada acima [3], assegura esse direito às sociedades anônimas, o que aumenta o leque de possibilidades para o acordo entre os sócios.

Entretanto, é curioso observar que essa classe de cotas sociais ainda é subutilizada, ou até esquecida no momento de construir ou alterar o quadro societário das sociedades empresariais limitadas.

Como citado, são inúmeras possibilidades de arranjos societários que são capazes de existir dentro das sociedades empresariais limitadas, que reverberam em diversas estratégias empresariais, como a constituição de holding patrimoniais com sócios cotistas preferenciais.

No exemplo acima, é plenamente possível atribuir cotas preferenciais para sócios que, em decorrência de diversos fatores pessoais, não teriam capacidade para gerir o patrimônio integralizado à holding.

Com efeito, haveria sócios gestores com cotas ordinárias, e sócios com cotas preferenciais que receberiam dividendos e pro labore, mas sem direito à interferência na gestão da sociedade empresária limitada.

Desse modo, ao passo que é inegável o avanço obtido pela IN nº 81/2020 para desburocratizar e modernizar a constituição e configuração das sociedades empresárias limitadas, estranha-se a subutilização dessa modalidade de cotas na formação dos quadros societários.

Ainda que existam lacunas a serem resolvidas no cotidiano sobre esse tema, os ganhos proporcionados com a utilização correta desse instituto justificariam sua maior utilização pelas sociedades empresárias.

Essas soluções podem ser facilmente obtidas através da elaboração de um contrato social por um bom profissional, atualizado com as alterações normativas advindas do grande processo de desburocratização e fomento à atividade empresarial do Brasil, tendo sempre como premissa o interesse dos sócios envolvidos na sociedade empresária mencionada.

 


[1] PEREIRA, Julia. Quotas preferenciais nas sociedades limitadas: estímulo para o planejamento. Consultor Jurídico, nov. 2023. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-out-08/julia-barufaldi-quotas-preferenciais-sociedades-limitadas. Acesso em: 13 nov. 2023.

[2] Ramos, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial: volume único / André Luiz Santa Cruz Ramos – 10ª ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2020. Pag. 665.

[3] Lei 6.404/76, Art. 11. O estatuto fixará o número das ações em que se divide o capital social e estabelecerá se as ações terão, ou não, valor nominal. § 1º Na companhia com ações sem valor nominal, o estatuto poderá criar uma ou mais classes de ações preferenciais com valor nominal.

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