Opinião

Serventias extrajudiciais e a não incidência do salário-educação

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15 de dezembro de 2023, 6h02

O artigo 212, § 5º, da Constituição, dispõe que é devido o pagamento da contribuição ao salário-educação pelas empresas. Trata-se de uma contribuição social destinada ao financiamento de programas, projetos e ações voltados para a educação básica, oferecida pelo Estado. Há medida interventiva de transferência de recursos que se rege pelo regime tributário, submetendo-se aos princípios e regras que informam o modelo. A tipicidade cerrada bem como a legalidade são basilares no assunto.

A legislação de regência (artigo 15 da Lei 9.424/1996) dispõe que a contribuição salário-educação é devida por aqueles que desempenham a atividade empresarial. A Lei 9.766/1999 fixou o sujeito passivo da obrigação, especialmente no que se refere ao conceito de empresa. Não se trata de hipótese na qual a legislação fiscal alterou conceito de direito privado. Pelo contrário, há uma absoluta convergência entre o conceito tributário e o sentido de direito privado.

A lei trata de firma individual ou de sociedade que assume risco de atividade econômica, independentemente de sua finalidade lucrativa. Por fim, há cláusula ampla, que suscita vínculo com a seguridade social, passo que deve ser interpretado com cautela, a exemplo do que se observa com os precedentes do STJ e do TRF-4.

Nesse sentido, as serventias extrajudiciais não se enquadram no conceito de sujeito passivo apontado e, por esta razão, o recolhimento da contribuição social ao salário-educação não é devida. Nada obstante a clareza da norma, não há como tentar equiparar os titulares de cartório, que exercem atividades públicas notariais e de registro, por intermédio de pessoa física, mediante empregados vinculados, ao conceito de empresa para fins de incidência da contribuição ao salário-educação.

Os serviços desempenhados nos cartórios extrajudiciais são serviços públicos típicos, próprios do Estado, que visam a garantir a segurança, a autenticidade e a eficácia dos atos jurídicos. São desempenhados pelos oficiais das serventias, que são investidos por intermédio de concurso público, tornando-se tabelião ou notário, oficial de registro ou registrador público, dependendo da matéria que caiba à sua serventia.

Nos termos do artigo 3º da Lei 8.935/1994, o notário e o registrador são considerados profissionais do direito (profissionais liberais) dotados de fé pública. A expressão “profissional do direito” utilizada pela referida lei denota que o cartório não possui personalidade jurídica, sendo todos os auxiliares e escreventes contratados em nome da pessoa física titular do estabelecimento.

Portanto, “serviço notarial” é a atividade delegada ao tabelião e/ou o registrador por intermédio de aprovação em concurso público de provas e títulos. Pode-se assim inferir que os serviços notariais e de registro não podem ser prestados por pessoas jurídicas, uma vez que a delegação da atividade pública se dá na pessoa do titular da serventia.

Por isso, notários e registradores não estão sujeitos às normas tributárias aplicáveis à pessoa jurídica, notadamente às empresas, com especial referência à contribuição social genérica aqui mencionada. Neste enfoque, parece ter havido uma ausência de regulamentação no Decreto nº 3.048/1993, vez que o artigo 9º do referido decreto assegura que é assegurado obrigatório, como contribuinte individual, a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não.

O Código Civil de 2002 não considera empresário aquele que exerce atividade intelectual, ainda que com o auxílio de colaboradores, o que, por analogia, deve ser aplicado ao caso das serventias extrajudiciais.

O Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma, no AgInt no REsp nº 2011917 — PR, a partir da análise do conceito de empresa, entendeu que o recolhimento da contribuição social ao salário-educação não é devido pelas serventias extrajudiciais.

Tem-se, assim, mais um tema de fortíssimo impacto na vida de profissionais dos cartórios, que segue na expectativa de alcançar a necessária segurança jurídica.

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