Opinião

Proximidade dos tipos societários demanda apoio ainda mais especializado

Autor

  • Leonardo Barém Leite

    é sócio sênior do escritório Almeida Advogados especialista em Direito Societário e Contratos fusões e aquisições governança corporativa sustentabilidade ESG e compliance e presidente da Comissão de Direito Societário Governança Corporativa e ESG da OAB-SP/Pinheiros.

13 de dezembro de 2023, 18h32

O sistema jurídico brasileiro contempla vários tipos societários, que permitem diversos possíveis formatos para as empresas, mas os mais utilizados, e que englobam a maioria dos casos, são as chamadas sociedades limitadas e as sociedades por ações (SAs).

Nos últimos anos, surgiram novos tipos societários, mais específicos para alguns casos e situações, mas os mais comuns e utilizados seguem os mesmos.

Historicamente, havia diferenças importantes entre os dois principais tipos, que passavam, por exemplo, pela distinção entre sociedade de pessoas (no caso da limitada) ou de capital (no caso das sociedades por ações): pela facilidade de se constituir a sociedade; o documento que a organiza (contrato social ou estatuto social, conforme o caso); facilidade de se administrar; facilidade de se transferir participações societárias; formalidades e burocracias; simplicidade maior ou menor; flexibilidade para a composição do capital social; possibilidade (ou não) de se emitir certos títulos; necessidade de reuniões; requisitos para certos administradores etc.

Por muitos anos, as sociedades por quotas de responsabilidade limitada foram regidas pelo famoso “decreto das limitadas” (o Decreto nº 3.708, de 10 de Janeiro de 1919), que era extremamente simples e curto, estabelecendo apenas algumas poucas normas conceituais, deixando os sócios e o próprio contrato social com enorme liberdade para organizarem a sociedade como melhor lhes conviesse.

E, em paralelo, as sociedades por ações tinham sua regulamentação baseada na Lei nº 6.404, de 1976 (ainda em vigor, embora já bastante alterada ao longo do tempo).

Nesse contexto, por muitas décadas, era de conhecimento geral no mundo jurídico brasileiro, mas igualmente no universo empresarial, que para empresas “mais simples”, especialmente com poucos sócios, e para as quais se buscasse maior simplicidade e flexibilidade, bem como menores custos, formalidades e burocracias, o caminho costumava ser a sociedade limitada, ao passo em que nos casos em que se preferisse os benefícios da sociedade por ações, ainda que numa roupagem bem mais robusta, formal, rígida e até mais cara, por conta dos planos da empresa, sua composição de sócios etc., a “SA” fosse a mais indicada.

O tema era, ainda, tratado, em grande medida, e como alicerce mais geral para as sociedades, pelo Código Comercial Brasileiro.

Para os advogados que lidavam com clientes internacionais, algumas das principais perguntas iniciais a serem respondidas eram: o melhor tipo societário, que de certa forma era fácil, pois os dois tipos eram bastante distintos e claros; o capital mínimo (que, em geral, não é definido pela legislação) sendo escolhido pelos sócios, e os efeitos tributários da adoção de um ou de outro tipo societário (em grande medida por conta da diferença tributária existente em outros países nesse aspecto, como nos Estados Unidos), que eventualmente impactasse na escolha do tipo, mas que no nosso caso não havia, por não haver distinção nesse ponto.

Essa realidade mudou bastante, e vem sendo alterada de forma cada vez mais profunda e frequente, deixando vários conceitos antigos para trás, assim como práticas relativas ao tema, demandando muito mais cuidado por parte dos empresários na escolha do tipo societário a escolher.

E a mesma questão passou a ser central no aspecto do apoio jurídico, pois o que antes era muito simples, e talvez até quase automático, em muitos casos, passou a exigir conhecimento, experiência e especialização bem maiores — para que o profissional esteja realmente preparado a apoiar o cliente na escolha do tipo societário em cada caso.

Muita coisa vem mudando e, atualmente, já se pode ter inclusive, uma sociedade com apenas um sócio, dentre outras novidades.

Uma das grandes e profundas alterações ocorreu com a adoção do chamado Novo Código Civil Brasileiro (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002), que passou a dispor sobre a maioria dos temas e assuntos antes constantes do Código Comercial e que, mais especificamente, no tocante ao direito societário, passou a dispor sobre as limitadas.

As novas normas para as limitadas, dispostas então no Código Civil, foram (e continuam sendo) muito discutidas e polêmicas, no contexto da advocacia societária especializada, pois em grande medida formalizaram e burocratizaram demais as sociedades, reduzindo em muito a antes tão festejada simplicidade e flexibilidade (do antigo decreto).

Em grande medida, o enorme aumento de normas, de detalhes, de formalidades, de obrigações e de burocracias aproximou bastante a antiga limitada da sociedade por ações, que, por sua vez (e em grande parte por conta da jurisprudência aplicada), também se aproximou das sociedades por ações, através da admissão de formatos de capital mais flexíveis e de possibilidade de emissão de títulos, até então não possíveis nas limitadas, além de estruturas possivelmente mais complexas como conselhos e acordos.

No sentido oposto, a Lei das SAs., que ainda está em vigor, vem passando, nesse mesmo período, por tantas e tão impactantes alterações (que têm visado, em grande medida, a simplificação e a maior flexibilidade da legislação para o tipo societário que regula), que já não é mais considerada tão rígida, burocrática e engessada.

O resultado dessa maior complexidade das limitadas e maior simplificação das sociedades por ações passou a aproximá-las em grande medida, de modo que já não é tão simples escolher entre um e outro tipo societário — o que demanda análise específica e especializada em cada caso.

Torna-se necessário conhecer muito mais os sócios, o projeto, os planos para a empresa e o contexto do negócio para, então, aconselhar que um ou outro caminho (tipo societário) seja seguido/adotado.

E a questão continua em movimento, ampliando-se a complexidade do tema, pois novidades legislativas estão chegando.

Mais recentemente, ao longo de 2023, surgiram importantes iniciativas legislativas que buscam, novamente, alterar bastante a legislação aplicada ao direito societário, uma vez que se pretende alterar pontos da Lei das SA (de um lado), e também se pretende alterar novamente o Código Civil no tocante ao direito societário (do outro lado). E, a depender do que realmente seja mudado, mais alterações afetarão as limitadas e as sociedades por ações (inclusive no que diz respeito à transparência e responsabilidade dos administradores).

Torna-se, portanto, cada vez mais importante que executivos, empresários e investidores sejam apoiados por advogados especializados no direito societário, efetivamente experientes, e sempre atualizados, para que juntos consigam definir e escolher o melhor tipo societário para cada empresa, e para cada momento da (vida da) organização. Lembrando que a conversão (que tecnicamente chamamos de transformação) de um tipo em outro é possível, sob certos requisitos e formalidades.

Autores

  • é sócio sênior do escritório Almeida Advogados, especialista em Direito Societário e Contratos, M&A, governança corporativa, sustentabilidade e ESG, compliance, projetos e Direito Corporativo, professor e autor de diversas obras.

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