Opinião

Governança corporativa, controle interno, auditorias e CVM precisam se aprimorar

Autor

  • Leonardo Barém Leite

    é sócio sênior do escritório Almeida Advogados especialista em Direito Societário e Contratos fusões e aquisições governança corporativa sustentabilidade ESG e compliance e presidente da Comissão de Direito Societário Governança Corporativa e ESG da OAB-SP/Pinheiros.

12 de fevereiro de 2023, 15h13

Praticamente tudo o que existe precisa evoluir, e ser continuamente melhorado, e o universo corporativo (e seus diversos aspectos) não foge a essa máxima, de maneira que é preciso que sejamos todos sempre muito vigilantes, e ajudemos "os mercados" a melhorar. E um dos fatores que muito ajudam nessa questão é a constante vigilância, e o acompanhamento de perto, por estudiosos, operadores, autoridades e todo o mercado  para que aprendamos com os erros.

As economias, tanto doméstica quanto internacional, são dinâmicas, e têm seus ciclos, de calmaria e de euforia, assim como de sucesso e de crise, e na mesma linha, de tempos em tempos, ocorrem "grandes solavancos", setorizados e isolados ou não, que precisam gerar, também, reflexão, identificação de fragilidades, e melhorias.

A legislação que regula as empresas e o mercado de capitais, tanto no Brasil como ao redor do globo, evolui constantemente, e grande parte das melhorias decorre, justamente, do aprendizado com fraudes, erros, abusos, fragilidades e crises.

Tudo indica que o mercado de capitais brasileiro está sendo mais uma vez colocado à prova, o que assusta a muitos, e já gerou (e gerará) grandes prejuízos, mas se torna necessário que consigamos (também) entender com profundidade o que acontece, para que importantes ajustes sejam feitos para que os problemas não se repitam.

Recentes escândalos no mercado de capitais brasileiros têm sido divulgados, e em meio ao "pânico", e à necessária investigação para que toda a verdade seja conhecida, e as responsabilidades alocadas, para que as pessoas diretamente envolvidas sejam julgadas (e se comprovadamente culpadas, condenadas), é preciso que, também, aprendamos com esses episódios, para fortalecermos o sistema.

Nada pior para os mercados do que o chamado risco sistêmico, que leva ao "caos" todo um braço da economia, ou de grandes setores, sendo fundamental para todos que os incêndios sejam isolados e contidos, e os instrumentos de segurança modernizados. O "problema" não pode crescer e não pode contaminar todo o sistema, em benefício de todos.

Ao que já se sabe, enormes "rombos" foram identificados em renomadas empresas, até então consideradas maduras, tradicionais, líderes em alguns mercados, e até exemplo de gestão vencedora em alguns aspectos.

Tudo indica que sejam falhas "localizadas" e específicas, em função de operações e práticas não generalizadas, mas justamente é preciso que se conheça e entenda todo o quadro, para que com ele aprendamos de fato; com vistas ao reforço dos controles. Especialmente, por se tratarem de empresas enormes, tradicionais, respeitadas, admiradas, certificadas e premiadas.

Uma das reflexões urgentes e necessárias é justamente acerca dos critérios que usualmente se utiliza para auditar, certificar, premiar e até "endeusar" empresas, e estilos de gestão, assim como executivos "vencedores", para que se consiga entender onde estão de fato a excelência e a genialidade, e onde podem estar outras questões, inclusive éticas.

Acredita-se que a "ganância" exagerada e a pressão constante e permanente por resultados financeiros, nem sempre sustentáveis e "efetivos", aliada a deficiências de controles, e eventualmente aspectos éticos, sejam alguns dos fatores que levaram ao quadro em questão.

Toda empresa tem riscos e lida com eles, bem como todos os mercados, mas é preciso que sejam melhor conhecidos e dimensionados, para que existam limites ao arrojo, à "criatividade", e à liberdade de ultrapassar barreiras de segurança.

Esses eventos (em suma) claramente indicam que os "controles" que deveriam dar segurança às próprias empresas, bem como a seus investidores, colaboradores, parceiros, financiadores, fornecedores, consumidores falharam  e precisam ser melhorados.

O avanço das investigações deve indicar, em cada caso, o que realmente aconteceu, como ocorreu, e quem precisa ser responsabilizado, mas, ao que tudo indica, já se pode constatar alguns aspectos que demonstram uma certa fragilidade de nosso mercado de capitais no tocante a controles que precisam ser modernizados e fortalecidos.

Se rombos enormes, e que certamente não surgiram de um dia para o outro, foram identificados apenas quando já eram praticamente inadministráveis, é lícito considerar que as causas, os fatores, bem como os culpados foram (e são) vários. E que as falhas também ocorreram em diversas medidas, englobando controles internos, mecanismos de governança corporativa, comitês internos de auditoria, auditoria independente, e possivelmente o conselho fiscal. Ao lado de uma certa deficiência em governança, é bem provável que questões éticas também venham a ser descobertas.

Empresas enormes não "quebram" por apenas um ou outro fator, sendo o colapso causado por uma série de questões que precisam ser cuidadosamente investigadas, para que sejam contidas e "consertadas".

Nesse cenário, e considerando que o mercado costuma acreditar que os mecanismos de controles, internos e externos, efetivamente acompanham as empresas, e o protege de fraudes, bem como que a auditoria independente e a comissão de valores mobiliários, estão sempre atentas, e prontas para identificar erros e abusos, antes "que cresçam demais", contando com mecanismos, ferramentas, informações e pessoal adequados, parece ser momento de revermos essas questões, crenças e sistemas.

Os controles certamente falharam, e de forma tão grande que chamam a atenção, e apontam para a urgência de uma revisão geral.

Fraudes sempre existiram, e sempre existirão, mas a magnitude e a extensão de algumas, e o tempo necessário para que tivessem sido percebidas, chama a atenção, e precisa levar à constatação de que é preciso melhorar a estrutura de operação das empresas e de seus controles. Especialmente no caso de um mercado que tem (ou deveria ter) um acompanhamento tão constante, profundo e próximo, de tantos órgãos e instituições.

Com o tempo saberemos onde estão as maiores, e mais graves, falhas, mas é claro que a governança corporativa precisa ser melhorada e reforçada, assim como o sistema de auditorias independentes, e talvez até mesmos os mecanismos de acompanhamento das bolsas de valores e da CVM.

Reiteramos, ainda, que chama, também, a atenção, o fato de que empresas até há pouco festejadas e premiadas, inclusive por boas práticas de gestão, assim como pela excelência na boa governança, em índices setoriais de mercado, e no compliance, rapidamente sejam jogadas "na lona" —  sem que seus prêmios, selos de qualidade, e certificações, na prática, demonstrem a sua robustez, maturidade e força.

O mercado de capitais brasileiro ainda é relativamente pequeno, especialmente se comparado aos maiores do mundo, mas é preciso que seja fortalecido, para que seja mais seguro e robusto, para que os investidores e mesmo os demais agentes que com ele se relacionam; para que consiga crescer forte, seguro, e vencedor.

Já temos bons instrumentos, instituições equipadas, códigos de boas práticas e certificações, mas exemplos como esses aqui rapidamente mencionados, demonstram que a evolução e o fortalecimento de todo esse arcabouço "não podem parar", sendo preciso atuação constante, sempre com vistas a melhoria de práticas e de controles.

Precisamos todos aprender com esses fatos, e encontrar maneiras de fortalecer os mercados e seus instrumentos de proteção, assim como técnicas e mecanismos de controle, bem como a legislação aplicável, para o bem das empresas, do próprio mercado de capitais, da nossa economia, e de toda a sociedade.

Autores

  • é sócio sênior do escritório Almeida Advogados, especialista em Direito Societário, M&A, Governança Corporativa, ESG, Contratos, Projetos e novos negócios, "Compliance", Direito Corporativo e árbitro corporativo.

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