Opinião

Arbitragem em xeque: desafios a serem superados

Autor

  • Leonardo Barém Leite

    é sócio sênior do escritório Almeida Advogados especialista em Direito Societário e Contratos fusões e aquisições governança corporativa sustentabilidade ESG e compliance e presidente da Comissão de Direito Societário Governança Corporativa e ESG da OAB-SP/Pinheiros.

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19 de agosto de 2022, 16h03

O instituto da arbitragem, no contexto das formas alternativas de solução de controvérsias (como a conciliação e a mediação), é um dos mais modernos e importantes que existem, sendo o mais adequado em diversos casos e contextos empresariais (especialmente no tocante à sustentabilidade dos relacionamentos), mas a despeito de já ser um mecanismo bastante conhecido, e utilizado, vem sofrendo ataques que lhe podem enfraquecer, e que demonstram a necessidade de o defendermos, e de apoiarmos seu amadurecimento e evolução.

No mundo todo o universo corporativo reconhece a importância e as vantagens (logicamente com a devida avaliação em cada caso) da arbitragem e é fundamental para a nossa crescente inserção no cenário comercial internacional, que respeitemos o mecanismo.

Embora já existente no Brasil (e no mundo) há bastante tempo, foi com a Lei nº 9.307/1996 que a arbitragem ganhou maior robustez e amplitude entre nós, sendo, inclusive, um dos motores para a criação de diversas das Câmaras de Mediação e Arbitragem existentes no país.

Algumas alterações importantes se seguiram, como a Lei nº 13.129/2015, além da promulgação de outros diplomas legais que a recepcionam/disciplinam para a Administração Pública, Licitações, PPPs e outros, o que confirma que a arbitragem é positiva e sua utilização (seguidos os devidos cuidados e critérios) deve ser ampliada e incentivada.

Após algumas décadas de vigência da referida lei, e de suas alterações mais recentes, já se esperava que o instituto tivesse sido pacificado, uma vez que mesmo entidades como a Bolsa de Valores e a Comissão de Valores Mobiliários o reconhecem, sendo no caso de empresas listadas, existe inclusive a previsão de que seja usado em casos de disputas societárias.

O princípio constitucional que garante a todos o recurso ao Poder Judiciário para a defesa de seus direitos, logicamente permanece, mas é facultado às partes, por exemplo de um contrato, prever que em determinados casos e temas a solução de eventuais controvérsias seja obtida através da Arbitragem, de forma voluntária, mas firme (uma vez que assim seja pactuado). Tanto a Constituição Federal (em seu artigo 5º), quanto o próprio Código de Processo Civil garantem o direito e regulam (respectivamente) a maneira como a arbitragem se relaciona com o Poder Judiciário.

Uma vez acordado entre as partes que o caminho será a arbitragem (após cuidadosa análise, em cada negociação de contrato, para que se verifique que seja de fato a melhor alternativa) é preciso que respeitem esse pacto, pois a força da decisão (sentença) é fundamental para que não se desvirtue e enfraqueça todo o arcabouço jurídico relativo ao tema.

Um dos ataques que vem ocorrendo e que entendemos que seja um grande erro "do sistema todo" é o excesso de judicialização, que o enfraquece e atrapalha, pois justamente a própria lei prevê que o eventual recurso posterior ao Judiciário somente deve ocorrer no tocante à validade da sentença, e que, inclusive, após o prazo legal tal decisão adquire a força da coisa julgada.

O crescente "abuso" da judicialização, gera incerteza, enfraquece o mecanismo, e pode levar ao seu desestimulo, além de aumentar custos e prazos, e gerar "retrabalho", bem como, em muitos casos, esse contexto todo pode até implicar na destruição do relacionamento entre as partes —  demonstrando, de forma geral, que o "problema" não seria propriamente da arbitragem em si, mas da provável falta de analise cuidadosa na negociação dos contratos (que por sua vez preveem a arbitragem).

Outro ponto de atenção é a recente determinação da CVM (Resolução 80, de março de 2022) no tocante à transparência e divulgação ao mercado dos casos de controvérsias societárias (que incluiriam a arbitragem), uma vez que, segundo entendemos, embora, de fato, as melhores práticas de governança corporativa, contemplem a transparência e o fornecimento aos investidores de todas as informações que eventualmente afetem suas decisões, em muitos casos as partes recorrem à arbitragem por considerarem importante a sua confidencialidade.

Ainda que tanto a questão da transparência não seja nova e que diversas outras normas editadas anteriormente pela CVM já determinassem essa providência, é fundamental que se avalie esse tema com muito cuidado, especialmente em contextos de fato relevante. Adicionalmente, um ponto bastante polêmico é o argumento utilizado pela referida comissão em sua defesa da determinação, no tocante à menção de que os regimentos e regulamentos das câmaras de arbitragem (no caso, com relação a sigilo e confidencialidade) não se poderiam contrapor a dispositivos legais e regulamentares.

Nesse caso, frisamos, portanto, recomenda-se muito cuidado com as informações a serem "publicadas", e com a maneira de sua divulgação, para que se encontre o necessário equilíbrio, em cada caso, reduzindo-se o risco de que mesmo demandas não aplicáveis ou que sejam apenas parte de estratégias de alguns, sejam utilizadas justamente para "afetar" os mercados e/ou a imagem das companhias.

A arbitragem é importante e merece nossa defesa, e o nosso apoio para que siga evoluindo, amadurecendo e sendo aperfeiçoada (e não atacada).

Autores

  • é sócio sênior do escritório Almeida Advogados, especialista em Direito Societário, M&A, Governança Corporativa, ESG, Contratos, Projetos e novos negócios, "Compliance", Direito Corporativo e árbitro corporativo.

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