Opinião

Beneficiário do Auxílio Brasil pode trabalhar em campanha eleitoral?

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12 de setembro de 2022, 7h08

Uma dúvida que quase todo dia tem surgido nas campanhas eleitorais é se quem é beneficiário do Auxílio Brasil pode ser contratado para trabalhar nas campanhas eleitorais.

De um lado, existe o receio dos candidatos porque em quase toda campanha há algum tipo de investigação/questionamento envolvendo beneficiários dos programas sociais [1][2] (antigo Bolsa Família, agora Auxílio Brasil).

Por outro lado, também os beneficiários se preocupam, porque uma vez contratados pelas campanhas temem por ter o seu benefício cancelado.

Então, tentarei lograr êxito em dirimir essa dúvida, de forma objetiva, tanto para acalmar as mentes e os corações preocupados com essa temática, quanto para servir, quem sabe, de base para defesa jurídica em eventual questionamento por parte dos Tribunais Regionais Eleitorais.

Primeiramente, não há qualquer disposição na Resolução TSE nº 23.607, de 17 de dezembro de 2019, que versa sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos e candidatas ou candidatos e sobre a prestação de contas nas eleições, que proíba a contratação de beneficiários do Auxílio Brasil para as campanhas.

Logo, para as campanhas eleitorais, não há qualquer problema na contratação.

Mas e quanto aos beneficiários?

Com efeito, a Lei nº 14.284, de 29 de dezembro de 2021, instituiu o Programa Auxílio Brasil, em substituição ao Programa Bolsa Família. Em seu artigo 4º, a referida lei fala sobre as modalidades de benefícios financeiros do programa Auxílio Brasil, bem como sobre quem são elegíveis para o seu recebimento, ou seja, quais os requisitos legais.

Nessa toada, a Lei nº 14.284/2021 estabelece que as famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, consideradas aquelas que possuem renda familiar per capita mensal entre R$ 105,01 (cento e cinco reais e um centavo) e R$ 210,00 (duzentos e dez reais) e inferior a R$ 105,00 (cento e cinco reais), respectivamente, são elegíveis para o recebimento do Auxílio Brasil.

E apenas para que não se diga que este causídico não falou das flores, importa dizer que a renda familiar per capita é calculada dividindo-se o total da renda familiar pelo número de moradores de uma residência.

Pois bem. Na esmagadora maioria das campanhas eleitorais que temos visto, os beneficiários do Auxílio Brasil estão sendo contratados para ganhar, no máximo, o valor de um salário mínimo.

Agora pensemos na seguinte hipótese: uma família constituída por quatro pessoas (cônjuges e dois filhos menores), beneficiários do Auxílio Brasil. Um dos cônjuges aceita trabalhar em determinada campanha eleitoral, para ganhar um salário mínimo.

Qual a probabilidade da renda per capita familiar aumentar a ponto de não mais preencherem os requisitos para o recebimento do benefício?

Facilmente se chega à conclusão de que não há a menor possibilidade de a renda per capita ultrapassar o máximo legal exigido.

Aliás, é importante frisar que o próprio artigo 20 da Lei nº 14.284/2021 tem previsão de que as famílias beneficiárias do programa Auxílio Brasil que tiverem aumento da renda familiar per capita mensal que ultrapasse o limite de renda para concessão dos benefícios serão beneficiadas pela regra de emancipação, e serão mantidas no programa pelo período de até 24 meses se a referida renda familiar per capita for igual a duas vezes e meia o limite superior disposto para a situação de pobreza previsto no inciso I do § 1º do artigo 4º.

A título de arremate, é preciso lembrar que, infelizmente, em 13 estados brasileiros têm mais beneficiários do Auxílio Brasil do que trabalhadores com carteira assinada, de modo que contratar essas pessoas para trabalhar nas campanhas eleitorais, nesse contexto de crise financeira, é, de certa forma, dar efetivo cumprimento ao postulado da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III, CF).

Portanto, a contratação de beneficiários do programa Auxílio Brasil para as campanhas eleitorais é legal para os candidatos, posto que não há proibição na Resolução TSE nº 23.607/2019, e não traz qualquer problema jurídico para os beneficiários, de acordo com a análise da Lei nº 14.284/2021.

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