Palavra questionada

STJ diverge sobre impor limite ao valor de testemunho policial para condenação

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25 de outubro de 2022, 21h43

Apenas a palavra dos policiais responsáveis pela prisão em flagrante de alguém acusado de um crime é suficiente para fundamentar uma condenação? O tema, de altíssimo impacto no sistema penal brasileiro, gerou divergência na 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça.

Marcelo Camargo/Arquivo Agência Brasil
Há casos em que único elemento de prova é o testemunho do PM que fez a abordagem
Marcelo Camargo/Arquivo Agência Brasil

Nesta terça-feira (25/10), o colegiado discutiu a necessidade de superar a jurisprudência que dá pleno valor à palavra dos policiais, inclusive nas situações em que essa prova testemunhal é a única capaz de comprovar a ocorrência do crime e sua autoria.

O caso tratou de um homem condenado por tráfico de drogas exclusivamente com base na palavra dos PMs que o prenderam em flagrante. A pena final foi de sete anos, dois meses e 12 dias de reclusão, em regime inicial fechado.

Relator, o ministro Ribeiro Dantas propôs limitar a presunção de validade dessa prova. A palavra do agente público tem fé pública, mas sua validação como prova dependerá da gravação em áudio e vídeo do momento da abordagem para demonstrar qualquer dos elementos do crime.

Essa posição se baseou em pesquisas nacionais e internacionais que apontam razões para contestar a credibilidade do testemunho policial, sempre a partir da ideia de que a intenção dele é obter a condenação e justificar o próprio trabalho.

Em voto-vista, o ministro Joel Ilan Paciornik divergiu. Para ele, não se pode supervalorizar, tampouco desvalorizar, o testemunho do policial. Em vez disso, essa prova deve ter o mesmo valor de qualquer outro testemunho levado aos autos.

Ao juiz, caberá valorar o conteúdo junto com os demais elementos dos autos para aí, sim, determinar a importância da prova. Isso seria feito com base em elementos como coerência interna e externa, credibilidade, verossimilhança, corroboração com conjunto probatório e circunstâncias.

Indefinição jurisprudencial
O julgamento na 5ª Turma terminou sem uma definição clara sobre qual das posições deveria prevalecer. Isso porque ambos os votos tiveram a mesma conclusão no caso concreto: entenderam que o réu por tráfico de drogas deveria ser absolvido.

Eles levaram em consideração a sentença de absolvição do primeiro grau, em que o magistrado entendeu que havia inconsistências nos depoimentos dos PMs responsáveis pela prisão em flagrante, enquanto a narrativa do réu era segura e coerente.

Os ministros Jorge Mussi e Reynaldo Soares da Fonseca não se posicionaram sobre a tese referente ao peso que deve ser conferido aos depoimentos de policiais. Em vez disso, prometeram reflexão sobre o tema.

O desembargador convocado Jesuíno Rissato, por sua vez, acompanhou a posição que evita a viragem jurisprudencial proposta pelo relator. "O depoimento deve ser valorado caso a caso e cotejado com demais elementos de prova do caso concreto. Sabemos que há casos de abuso de policiais. Mas esses abusos devem ser vistos e punidos inclusive quando ocorrem."

AREsp 1.936.393

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