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STJ limita acesso a dados do ICMS por advogado particular

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8 de novembro de 2022, 19h11

A outorga de mandato a advogados particulares contratados pelos municípios para fiscalizar critérios de distribuição de verbas do ICMS não tem o condão de estender a eles a autorização legal para acessar livremente informações fiscais sigilosas do estado.

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Tribunal de Justiça de Goiás vê como correto veto a advogados particulares
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Com esse entendimento, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça concluiu que advogados particulares podem receber, mas não acessar, dados do sistema do Conselho Deliberativo dos Índices de Participação dos Municípios (Coindice) do estado de Goiás.

Esse conselho tem como função elaborar o índice de distribuição da quota do ICMS cabível aos municípios. Conforme a Constituição Federal prevê, o tributo é arrecadado pelos estados, mas 25% dessa receita deve ser encaminhada aos entes municipais.

Segundo a seccional goiana da OAB, autoridades estaduais de Goiás têm impedido advogados particulares de acessar os dados do Coindice. Isso seria necessário para que, contratados pelos municípios, eles tenham subsídios para fiscalizar os critérios de distribuição da verba.

O Tribunal de Justiça de Goiás entendeu que o veto é correto porque o Coindice traz informações acerca dos próprios contribuintes do ICMS. Portanto, seria inconveniente dar a um agente privado o acesso mais detalhado a dados tão sensíveis.

Por maioria de votos, venceu a posição divergente do ministro Gurgel de Faria, para quem o sigilo fiscal não pode ser relativizado sob a justificativa da prerrogativa profissional do advogado particular contratado pelo município.

Acesso não tão livre assim
O ponto central da discussão está no artigo 3º, parágrafo 5º Lei Complementar 63/1990, editada para criar critérios e prazos de crédito das parcelas do ICMS a serem pagas aos municípios pelos estados.

A norma prevê que prefeitos, associações de municípios e seus representantes "terão livre acesso às informações e documentos utilizados pelos estados no cálculo do valor adicionado".

Para o relator, ministro Sergio Kukina, o termo "seus representantes" abarca a figura do advogado particular contratado pelo município, pois não há qualquer distinção na lei entre advocacia pública ou privada. Essa posição é, inclusive, condizente com o Estatuto da Advocacia.

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Ministro Gurgel de Faria defendeu que o sigilo fiscal não pode ser relativizado
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Já o ministro Gurgel de Faria entende que a outorga de mandato ao advogado particular não basta para estender a autorização legal de acesso às informações sigilosas conferidas ao chefe do Executivo municipal. Ao advogado contratado é conferida, apenas, a capacidade postulatória.

Se o zelo aos dados do ICMS é responsabilidade da autoridade tributária estadual, com mais razão o acesso dos entes municipais a essas informações deve ser interpretado de maneira restritiva, para evitar a mitigação do sigilo fiscal garantido constitucionalmente.

Sem prejuízo à advocacia
O voto divergente destaca que não haverá prejuízo ao advogado particular. Embora ele não tenha acesso ao Coindice, as normas estaduais goianas permitem que o prefeito indique até dois servidores públicos efetivos para acessar o sistema.

"Ainda que não acesse diretamente, estará habilitado e assessorado para exercer seu mister [obrigação], obtendo material necessário ao exercício profissional sem que se viole a garantia constitucional do direito à intimidade do contribuinte", disse o ministro Gurgel de Faria.

Já para o ministro Kukina, esse é o ponto que faz com que a argumentação de proteção ao sigilo fiscal possa ser superada: se o advogado vai receber os dados de qualquer maneira, que diferença faz permitir ou não o acesso direto?

"Se a questão maior está no preservar o sigilo dos dados, esse risco haverá, seja o advogado acessando diretamente por sua iniciativa, seja após o momento em que receba esses dados", afirmou, após a leitura do voto-divergente, na sessão desta terça-feira (8/11).

Para o ministro Gurgel, a principal preocupação é que o sigilo está previsto na Constituição e regulamentado por lei complementar. "Somente quem pode ter acesso são aquelas pessoas [listas na lei]", disse, em referência a prefeitos, associações de municípios e seus representantes.

RMS 68.647

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