Justiça Tributária

Reforma tributária e administrativa: onde está a análise de impacto orçamentário?

Autores

  • é professor titular de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo (USP) advogado e sócio do escritório Silveira Athias Soriano de Mello Bentes Lobato & Scaff Advogados.

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  • é sócio do escritório Carrilho Donas Advocacia tem MBA em Gestão Tributária pela FIPECAFI é cofundador e coordenador do Grupo de Estudos da Tributação do Agronegócio e cofundador e coordenador do Grupo de Estudos sobre Política Tributária.

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7 de setembro de 2020, 8h02

Spacca
O artigo 113 do ADCT é determinante para a sustentabilidade financeira, conforme estabelece texto expresso: “A proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro”. O texto foi introduzido pela EC 95 e se refere apenas ao âmbito da União, conforme analisado em outro texto.

Tanto a PEC 45 como a PEC 110, o PL 3.887/20 que institui a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e a PEC da reforma administrativa foram apresentadas sem tal demonstrativo, o que, à toda prova, macula seu trâmite legislativo.

Semana passada o governo federal solicitou ao Congresso Nacional o cancelamento da urgência na análise do PL 3.887/20, pois tal “urgência” acabaria por "trancar" a pauta do Congresso Nacional a partir de então. Ou seja, o governo teria preferência sobre quase qualquer outra matéria no Congresso Nacional, exceto em relação às PECs, MPs e projetos de lei de iniciativa privativa de outros Poderes.

Estrategicamente o governo federal tira os holofotes de uma ampla discussão sobre as bases e modelos de reforma tributária e tenta dar outro “tiro certeiro” em uma questão política delicada que é a reforma administrativa.

O jogo político que se instaura está intimamente ligado a (i) medidas populistas que visam a redução de despesas primárias para o custeio e financiamento do programa Renda Brasil, num movimento que pode caracterizar a intenção do Presidente da República em buscar a sua reeleição; (ii) enfraquecimento da proposta que instituiu a CBS, em razão da aversão dos principais setores da economia que apresentaram diversas manifestações alegando, entre tantos motivos, o aumento da carga tributária, em sentido contrário ao que foi propagandeado; (iii) necessidade de discutir e aprimorar o modelo tributário formulado nas PECs110 e 45 pois a maioria dos agentes políticos preferem discutir um modelo mais amplo de reforma tributária; e (iv) o receio do governo federal “travar” a agenda do Congresso Nacional e enfraquecer ainda mais as bases políticas aliadas.

Tudo indica que o cenário político caminha para uma negociação concomitante entre a discussão da reforma administrativa e o aprimoramento do texto da reforma tributária, em meio a uma corrida eleitoral já iniciada por conta das medidas políticas que o atual governo cisma em adotar, em um discurso que vai na contramão dos propalados ideais liberais e que vem assustando boa parte de seus aliados.

O que ainda continua atrás de uma cortina de fumaça, sem explicação, sem estudos empíricos, sem demonstrações orçamentárias e sem luz no fim do túnel, são as exigências das estimativas de impacto financeiro e orçamentário exigidas pelo artigo 113, ADCT, acima transcrito, que tratado núcleo da responsabilidade fiscal.

O ministro Luís Roberto Barroso, no julgamento do Mandado de Segurança 34.474, afirma que“a responsabilidade fiscal é fundamento das economias saudáveis, e não tem ideologia. Desrespeitá-la significa predeterminar o futuro com déficits, inflação, juros altos, desemprego e todas as consequências negativas que advém. A democracia, a separação de Poderes e a proteção dos direitos fundamentais decorrem de escolhas orçamentadas transparentes e adequadamente justificadas (…)”.

Essa frase foi proferida durante a tramitação legislativa da EC 95/16, conhecida como Emenda do Teto de Gastos, mas que parecia antever o cenário caótico que a pandemia geraria à economia nacional, num aumento de gastos desenfreado e necessário para mitigar os efeitos sanitários, econômicos e sociais causados pelo vírus – tudo que recomenda não discutir uma reforma tributária estruturante neste momento, mas apenas ajustes no sistema atual.

Ainda é muito cedo para prever os reais impactos que a pandemia gerará aos cofres públicos, mas o “pelotão de cima” do executivo, o Congresso Nacional, os principais setores da economia, os acadêmicos e toda a população precisarão estar muito atentos aos impactos orçamentários e financeiros que as PECs 45 e 110, o PL 3.887/20, bem como a reforma administrativa causarão, pois alteram despesas obrigatórias (gastos com pagamento de folha) e criam renúncias de receitas (implementação de regimes especiais; imunidade tributária e isenções de entidade beneficentes de assistência social, partidos políticos, sindicatos, federações e confederações, livros, etc.), de modo que é extremamente importante que as autoridades competentes “mostrem os cálculos” para que os agentes responsáveis pela administração orçamentária possam saber o real impacto que essas reformas causarão aos cofres públicos.

Diferentemente disso, pode ser que algumas dessas proposições legislativas comecem a navegar nos oceanos do Supremo Tribunal Federal, por meio de medidas de controle de constitucionalidade que demonstrem a violação constitucional do art. 113 da ADCT, o que poderia levar a um vício formal de constitucionalidade.

Esse tema merece atenção e destaque. Caso contrário, serão infindáveis e eternas as proposições de reformas estruturais, mesmo que o momento não seja adequado. E haja judicialização.

Autores

  • é Professor Titular de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo (USP) e sócio do Silveira, Athias, Soriano de Melo, Guimarães, Pinheiro & Scaff – Advogados.

  • é sócio do escritório Carrilho Donas Advocacia, tem MBA em Gestão Tributária pela FIPECAFI, é cofundador e coordenador do Grupo de Estudos da Tributação do Agronegócio e cofundador e coordenador do Grupo de Estudos sobre Política Tributária.

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