Culpa Consciente

Causar morte por direção imprudente não configura dolo eventual, diz juiz

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26 de janeiro de 2020, 8h40

Desrespeitar o limite de velocidade, atropelando e matando uma pessoa, não configura dolo eventual, uma vez que, ao incorrer em conduta imprudente, o autor não assume necessariamente a possibilidade de causar um acidente.

Arquivo pessoal
Caso envolveu ex-goleiro do Corinthians Raphael Aflalo Lopez Martins
Reprodução

Foi com base nesse entendimento que o juiz Leonardo de Mello Gonçalves, da Vara do Júri de Santos, decidiu que o ex-goleiro do Corinthians, Raphael Aflalo Lopez Martins, não cometeu crime doloso contra a vida ao atropelar dois ambulantes. Um deles acabou morrendo. 

O Ministério Público afirmou ter ficado evidente que o acusado cometeu crime de homicídio conforme descrito no artigo 121 do Código Penal, visto que o jogador assumiu a possibilidade de matar ao ultrapassar o limite de velocidade. 

Segundo a denúncia, a conduta configura dolo eventual, que ocorre quando o agente não quis provocar um resultado em específico — no caso o atropelamento —, mas assumiu que o fato pudesse acontecer e concordou com a sua possível ocorrência.

O juiz acolheu o argumento da defesa, feita pelo advogado Eugenio Carlo Balliano Malavasi, de que o caso não configura dolo eventual, mas culpa consciente, já que não foi comprovado que o réu demonstrou indiferença pelo resultado do acidente. 

“Apesar de a perícia técnica ter auferido que o réu estava em velocidade acima àquela permitida para a via, os demais elementos de convicção não convencem sobre a existência do dolo eventual”, afirma a decisão. De acordo com a denúncia do MP, o goleiro dirigia a 100 km/h em uma via com limite de 50 km/h. 

Ainda de acordo com o juiz, “a previsibilidade do resultado, embora possível, não foi cogitada pelo acusado quando dos fatos”. “Isso porque, embora tenha empregado velocidade em seu veículo, isso se deu por curto espaço, de modo que só notou a presença das vítimas, no meio da via pública, milésimos de segundos antes da fatídica colisão”. 

Com a desqualificação da denúncia do MP, o goleiro não será mais julgado pelo Tribunal do Júri. Com relação à vítima que acabou morrendo, o magistrado considerou que a conduta do motorista se enquadra nos delitos descritos nos artigos 302 do Código de Trânsito Brasileiro. No caso do ambulante que só se feriu, o motorista incorreu em delito presente no artigo 303.  

Os crimes são puníveis, respectivamente, com pena de dois a quatro anos e de seis meses a dois anos de detenção. Com a decisão, o caso será redistribuído para uma das varas criminais comuns da Comarca de Santos. 

O caso
O atropelamento ocorreu em 9 de abril de 2017. O goleiro dirigia um automóvel BMW 318 IA e atingiu o carrinho de lanches e bebidas que era empurrado por Matheus da Silva Souza do Nascimento, de 17 anos. 

O adolescente foi arremessado a 13 metros de distância e morreu no mesmo dia. Junto com Matheus estava seu padrasto, Charles Nascimento da Silva, que se feriu, mas não ficou com sequelas.

De acordo com as testemunhas de acusação, o carro estava em alta velocidade ziguezagueando pela rua. A perícia excluiu a possibilidade de que o goleiro estivesse bêbado. 

Como respondeu ao processo em liberdade, o autor conseguiu seguir sua carreira. Com passagens pelo Corinthians entre 2013 e 2017, Raphael disputa a liga de futebol português pelo Clube Desportivo das Aves. 

Clique aqui para ler a decisão
1502940-31.2017.8.26.0562

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