Limites da liberdade de expressão

Para AGU, agentes públicos podem entrar em universidades e impedir atos políticos

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28 de maio de 2019, 19h23

A liberdade de expressão tem elemento negativo do que diz respeito à propaganda eleitoral, no sentido de que a lei veda a prática de condutas inadequadas ao pleito eleitoral, de modo a assegurar a isonomia entre os concorrentes. Assim defendeu a Advocacia-Geral da União em manifestação enviada ao Supremo Tribunal Federal em ação que questiona as ações policiais e judiciais que censuraram atos, aulas e manifestações políticas em universidades em outubro passado.

"A impossibilidade de reconhecimento, a priori, de uma primazia incondicional e necessária aos princípios da liberdade de expressão e da autonomia universitária decorre da constatação de que tais preceitos não se revestem de caráter absoluto, devendo submeter-se ao processo de ponderação quando em conflito com outros princípios de igual relevância constitucional, como é o caso dos postulados da regularidade, da igualdade e da legitimidade democrática do processo eleitoral", disse a AGU.

A arguição de descumprimento de preceito fundamental foi apresentada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, e a liminar concedida pela relatora, ministra Cármen Lúcia, nas vésperas do segundo turno, no dia 28 de outubro. Em 31 de outubro, o Plenário confirmou a cautelar. A ADPF tem o objetivo de suspender todos os atos que determinem o ingresso de agentes públicos em universidades públicas e privadas, bem como o recolhimento de documentos, a interrupção de aulas e debates e atividade disciplinar.

"A exteriorização das preferências eleitorais de cada cidadão possui condicionantes relacionadas não apenas à forma da propaganda, como também aos locais em que tais manifestações político-partidárias podem ocorrer legalmente. Os limites geográficos fixados pela Lei n° 9.504/1997 alcançam bens públicos e particulares", argumentou a AGU.

De acordo com o órgão, a interpretação aos dispositivos legais é no sentido de que tais preceitos vedam qualquer espécie de propaganda eleitoral no interior de prédios e órgãos públicos, bem como nos bens de uso comum ou de acesso geral à população.

"Como se nota, a Lei n° 9.504/1997 proíbe, de forma ampla, qualquer espécie de propaganda eleitoral dentro das universidades públicas e privadas. Semelhante conclusão é extraída, com clareza, da vedação legal à publicidade em qualquer bem de acesso público ou uso comum, tais como as instituições públicas e privadas de ensino superior", continuou na manifestação assinada pelo ministro André Mendonça e pela secretária-geral de Contencioso, Izabel Vinchon.

Para o AGU, o Tribunal Superior Eleitoral também respalda o entendimento de que os campus universitários estão englobados nas limitações impostas pela lei, sendo, portanto, irregular qualquer espécie de propaganda eleitoral dentro dessas instituições.

"Nesse sentido, ressalte-se que a universidade deve sim ser reconhecida como um espaço de livre debate de ideias, mas sem a prevalência de corrente de pensamento específica, e que, eventualmente, essa parcialidade possa interferir no processo eleitoral de forma ilegal", pontuou Mendonça.

A AGU também questionou a escolha da ADPF como meio para alcançar o objetivo da PGR, pedindo a recusa, inclusive, do conhecimento da ação.

Liberdade de expressão
Ao referendar a liminar dada por Cármen, os ministros fizeram comparações e referências à ditadura civil-militar brasileira e a outros regimes autoritários, como o próprio nazismo alemão. A decisão unânime do colegiado recorreu aos princípios da liberdade de expressão e de cátedra. Em sessão que durou mais de cinco horas e que tratou exclusivamente do tema, os ministros exaltaram o voto dado pela relatora, classificado por eles de "antológico".

"Sem liberdade de manifestação, a escolha é inexistente. O que é para ser opção, transforma-se em simulacro de alternativa. O processo eleitoral transforma-se em enquadramento eleitoral, próprio das ditaduras. Por isso, toda interpretação de norma jurídica que colida com qualquer daqueles princípios, ou, o que é pior e mais grave, que restrinja ou impeça a manifestação da liberdade é inconstitucional, inválida, írrita", enfatizou Cármen Lúcia.

Na decisão, ela pontuou também que exercício de autoridade não pode se converter em ato de autoritarismo. Cármen Lúcia defendeu que o processo eleitoral, no Estado democrático, está fundado nos princípios da liberdade de manifestação do pensamento, de informação e de ensino e aprendizagem, de escolhas políticas, realçando que consenso não é imposição.

Leia aqui a íntegra da manifestação da AGU.
ADPF 548

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