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Ativismo judicial é necessário para efetivar direitos de minorias, diz Antonio Saldanha

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18 de maio de 2018, 15h21

O ativismo judicial está exagerado no Brasil. Porém, uma versão mais contida desse movimento é necessária para efetivar direitos de minorias, que não seriam aprovados pelo conservador Congresso Nacional. Essa é a opinião do ministro do Superior Tribunal de Justiça Antonio Saldanha.

Sérgio Rodas
Para Antonio Saldanha, Judiciário não tem legitimidade para definir políticas públicas.
Sérgio Rodas

Em evento ocorrido nesta sexta-feira (18/5) no Rio de Janeiro, o magistrado afirmou que, sem uma postura ativista do Supremo Tribunal Federal, dificilmente os homossexuais poderiam ter uma união estável, por exemplo. Afinal, ao permitir isso, a corte entendeu que um princípio de difícil definição — a dignidade humana — prevalecia sobre uma regra concreta — o artigo 226, parágrafo 3º, da Constituição. O dispositivo estabelece que a união estável se dá entre homem e mulher.

Para Saldanha, é justamente porque a Constituição Federal de 1988 tem muitas cláusulas abertas que o ativismo judicial cresceu tanto no Brasil. A seu ver, esse modelo constitucional foi uma opção filosófica legítima e compreensível, uma vez que o país vinha de 21 anos de ditadura militar.

Só que princípios como dignidade da pessoa humana, função social da propriedade e moralidade são demasiadamente indefinidos, apontou o ministro. Por isso que magistrados podem usar essa garantia para, por exemplo, suspender a posse da deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) como ministra do Trabalho.

O problema, segundo Saldanha, é que juízes não são eleitos pela população. Portanto, não têm legitimidade para definir ou interferir em políticas públicas. Muitas vezes, ressaltou, eles também não têm conhecimento técnico para resolver uma questão controversa. Como no julgamento do STF que autorizou estados a proibir a venda e o uso de amianto em qualquer situação. Na ocasião, lembrou Saldanha, o ministro do Supremo Luiz Fux destacou que os integrantes da corte não tinham condições de garantir que o minério fazia mal à saúde.

Outro ponto sensível, de acordo com ele, é que, frequentemente, decisões ativistas produzem uma “microjustiça”, relativa apenas ao caso concreto, mas geram injustiças no sistema. Ele citou como exemplo as ordens para que o SUS cubra medicamentos e tratamentos. Isso pode ajudar o autor da ação, mas compromete as verbas estatais para área, que já são limitadas.

Como resultado do ativismo judicial, o Executivo e o Legislativo passam a ter mais dificuldades para elaborar o orçamento, ressaltou. Além disso, o princípio da separação dos Poderes se enfraquece, bem como o sistema de freios e contrapesos. Dessa maneira, aumenta a desconfiança da população em relação ao Judiciário.

Nova lei
Embora não exista um “direito à segurança jurídica” na Constituição, essa garantia pode ser extraída de outros princípios, como a legalidade, o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, disse Antonio Saldanha.

Porém, nem mesmo esses direitos fundamentais estão sendo plenamente respeitados, criticou o ministro, mencionando que o STF decidiu que a Lei da Ficha Limpa pode ser aplicada a casos anteriores à sua entrada em vigor. “A lei retroagiu para punir. Eu não sei mais Direito”, ironizou.

No entanto, novas leis vêm buscando fortalecer a segurança jurídica, afirmou. Uma delas é o Código de Processo Civil de 2015, com sua especial atenção aos precedentes. Outra é a Lei 13.655/2018. Ela alterou a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro para reforçar a previsibilidade do ordenamento jurídico e dos sistemas judicial e administrativo.

A nova lei, contudo, tem seus problemas. Um deles, conforme Saldanha, é a necessidade de o julgador justificar porque escolheu uma saída e não as outras. Essa exigência, na visão do ministro, deve alongar ainda mais os processos.

Uma dificuldade adicional está na necessidade de o magistrado considerar os “obstáculos e as dificuldades reais do gestor” em sua decisão. Trata-se de um requisito irreal, de acordo com o ministro do STJ, pois os juízes não têm como conhecer a fundo a realidade dos órgãos do Executivo.

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