Manobra reincidente

Para sustentar tese, MPF quebra sigilo telefônico de escritório que defende Lula

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20 de outubro de 2017, 20h29

Em janeiro deste ano, o Ministério Público Federal pediu e conseguiu nova quebra de sigilo de comunicações entre advogado e cliente envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A 13ª Vara Federal de Curitiba autorizou a quebra de sigilo telefônico de Glaucos da Costamarques para levantar as ligações feitas entre ele e o escritório Teixeira, Martins e Advogados, do qual era cliente. Para o MPF, os contatos entre eles em dias considerados importantes para a investigação sustentam a tese de que o ex-presidente fraudou recibos de aluguel para dissimular a propriedade de um apartamento.

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Sigilo telefônico de escritório que defende Lula foi violado mais uma vez pela "lava jato".
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O relatório com os registros de ligações ficaram sigilosos até esta quinta-feira (19/10), quando o MPF os apresentou ao juiz Sergio Moro, titular da 13ª Vara Federal de Curitiba. Eles fazem parte da tese da acusação segundo a qual Lula é proprietário, e não locatário, de um apartamento em São Bernardo do Campo (SP). Segundo a acusação, o imóvel foi dado a Lula pela Odebrecht, como suborno.

De acordo com o MPF, Glaucos e Roberto Teixeira, sócio do Teixeira, Martins, se falaram 12 vezes entre dezembro e novembro de 2015. Nessa época, segundo depoimento de Glaucos, eles estavam combinando a assinatura de recibos de aluguel falsos, com datas retroativas. Seria uma forma de o ex-presidente comprovar que não era o dono do apartamento. Glaucos é acusado de ser laranja de Lula na operação, já que é o verdadeiro dono do imóvel.

Na verdade, nessas 12 ligações, há diversos contatos entre Glaucos e o escritório de Roberto Teixeira. O MP Federal, no relatório, trata Roberto e seu escritório como se fossem sinônimos, mas, no registro de ligações, mostra o PABX da banca — que tem entre 25 e 30 escritórios. Na época, Roberto e Glaucos eram advogado e cliente, respectivamente.

Para o advogado Cristiano Zanin Martins, sócio de Roberto Teixeira e advogado do ex-presidente Lula, o relatório foi apresentado agora para tentar sustentar a tese de que Roberto Teixeira e Glaucos, a mando de Lula, fraudaram os recibos de aluguel. É que a versão de Glaucos da Costamarques para os fatos foi desmentida pelos demais envolvidos na história.

Em depoimento, ele disse que Roberto Teixeira o procurou enquanto ele estava internado no hospital Sírio Libanês, em São Paulo, em novembro de 2015. O motivo da visita foi acertar que, a partir de dezembro, Lula passaria a pagar o aluguel do apartamento. E que os recibos referentes ao período de 2011 a novembro de 2015 seriam assinados ali, no quarto do hospital, com datas retroativas.

Só que o Sírio Libanês informou à 13ª Vara que Roberto Teixeira não esteve lá nas datas em que Glaucos disse que ele esteve. E não entrou no hospital nenhuma vez durante o segundo semestre de 2015. As informações foram prestadas três vezes à 13ª Vara Federal de Curitiba, sempre em resposta a ofícios do juiz Sergio Moro (veja os ofícios abaixo).

A explicação de Zanin é corroborada por uma petição enviada pelo MPF à 13ª Vara nesta quinta-feira. Nela, o procurador da República Deltan Dallagnol afirma que os registros telefônicos de Glaucos corroboram a tese de que os recibos foram fraudados por Roberto Teixeira. Diz o procurador que eles se ligaram no dia seguinte à prisão de José Carlos Bumlai, primo de Glaucos e também acusado de ser laranja de Lula, em dias próximos a visitas de João Muniz Leite, acusado de envolvimento na fraude dos recibos.

Outro fato é que Glaucos era cliente de Teixeira na época — ou seja, ligou para seu próprio advogado no dia seguinte à prisão de um primo. E além de ter ligado para o próprio advogado, ligou também para o escritório dele duas das 12 vezes em que se falaram.

Reincidentes
Não é a primeira vez que o escritório de Roberto Teixeira é vítima de bisbilhotices de investigadores. Em março de 2016, a ConJur revelou que o telefone central da banca fora grampeado no início daquele ano.

Com isso, o MPF ouviu conversas dos 25 advogados do escritório com cerca de 300 clientes. O grampo foi resultado de uma manobra dos investigadores, que disseram a Moro que o telefone do Teixeira, Martins era o da Lils Palestras, a empresa de palestras de Lula. E Moro autorizou as escutas por achar que ela poderia "melhor esclarecer" as relações entre o ex-presidentes e as construtoras OAS e Odebrecht.

Mesmo assim, o grampo não foi resultado de erro. A operadora de telefonia que gravou as ligações, antes de fazê-lo, informou o juiz de que se tratava de um escritório de advocacia, e não da empresa de palestras de Lula.

Em carta ao Supremo Tribunal Federal, Moro pediu desculpas, mas disse desconhecer os grampos que autorizara — só tomaria conhecimento do deslize depois de ler "notícias extravagantes", como ele mesmo disse.

Clique aqui, aqui e aqui para ler os ofícios do Hospital Sírio Libanês.
Clique aqui para ler a petição do MPF.
Clique aqui para ler o relatório da quebra do sigilo telefônico.
Clique aqui para ler a autorização da quebra de sigilo dos telefones pedidos pelo MPF, em janeiro.
Clique aqui para ler a troca de e-mails entre a 13ª Vara Federal de Curitiba e o Sírio Libanês.

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