"Míngua de demonstração"

Sem ver irregularidades na Bancoop, juíza absolve Vaccari e mais quatro réus

Autor

9 de novembro de 2016, 17h52

O ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto foi absolvido nesta quarta-feira (9/11) em ação penal que apontava desvios na Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop) quando ele presidiu a entidade. A sentença foi publicada seis anos depois da denúncia, feita em outubro de 2010, e também considerou improcedentes as acusações contra outras quatro pessoas. Vaccari continua réu em outra ação penal sobre o mesmo caso (leia mais abaixo).

Segundo o Ministério Público de São Paulo, antigos representantes da Bancoop “atraíram” e “ludibriaram” 1.126 interessados em comprar unidades habitacionais da cooperativa. Depois de quitado os imóveis, eles passariam a cobrar mais dinheiro como condição para fornecer as escrituras.

Reprodução
Ex-presidente da Bancoop, João Vaccari  ainda responde a outra ação penal em São Paulo e é investigado na "lava jato".
Reprodução

A denúncia dizia que a Bancoop teve R$ 68 milhões desviados, ocultados por meio de diversas movimentações financeiras que impediriam a identificação da origem, entre 1999 e 2009 —período no qual Vaccari foi diretor e presidente da entidade.

De acordo com a juíza Cristina Ribeiro Balbone Costa, da 5ª Vara Criminal de São Paulo, não há nenhuma comprovação da acusação do MP-SP, mas apenas “números aleatórios” que são diferentes na denúncia original, nos aditamentos e nas alegações finais. 

“É certo que juntos conduziram a cooperativa, fizeram empréstimos, contrataram auditoria, descontinuaram obras, celebraram importante acordo com a Promotoria do Consumidor e até mesmo, ao que consta, diversos acordos com cooperados, para devolução das quantias pagas.”

Para ela, porém, “não foi possível concluir houvessem juntos concorrido para a prática de crimes de estelionato e ante a míngua de demonstração da coautoria imputada quanto à prática dos crimes de estelionato, tampouco é possível admitir-se que estivessem eles associados entre si e com terceiras pessoas para praticar crimes, de forma a autorizar o reconhecimento da quadrilha”.

A juíza só viu indícios concretos de desvios em cheques sacados por ex-dirigentes da Bancoop que já morreram. Embora reconheça que Vaccari deveria ter divulgado a desorganização financeira da cooperativa quando assumiu a presidência, não viu comprovação de que ele sabia dos desvios ou tenha prestado contas fraudulentas.

Segundo ela, os problemas da cooperativa tiveram mais relação com problemas gerenciais do que crimes. Um engenheiro, por exemplo, relatou em juízo que as estimativas de custos das obras eram feitas como “contas em papel de padaria”. E o sentimento das vítimas que ficaram sem os imóveis é insuficiente para demonstrar a prática de crimes, afirmou Cristina Ribeiro.

O criminalista Luiz Flávio Borges D'Urso, advogado de Vaccari elogiou a sentença, salientando que "trata-se de uma decisão justa, que reconheceu a absoluta improcedência da acusação diante das provas juntadas aos autos". Vaccari, segundo D'Urso, "assumiu a presidência da Bancoop e não mediu esforços para sanear a cooperativa, agindo corretamente, esforçando-se para entregar as unidades aos cooperados, inclusive por meio de acordos com o Ministério Público. Nunca houve desvio de dinheiro na gestão de Vaccari", afirmou o advogado.

Testemunho x Prova Cabal
A juíza entendeu também que os acusados não poderiam ser condenados por lavagem de dinheiro, pois esse crime depende de infração penal antecedente e, até a Lei 12.683/2012, só valiam aquelas listadas pela Lei 9.613/1998.

Ainda segundo ela, o crime de organização criminosa não fazia parte do ordenamento jurídico na época dos fatos — tanto a 5ª como a 6ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça já reconheceram que essa tipificação só vale após a sanção da Lei 12.850/2013.

Embora a denúncia ainda faça acusações de falsidade ideológica, a sentença diz que “toda a imputação se baseia exclusivamente no relato da testemunha protegida X, colhido pela Promotoria, que deveria ter servido como ponto de partida para apuração da materialidade e autoria dos alegados fatos, mas que foi erigido em prova cabal de materialidade e autoria”.

O processo estava na fase da sentença desde o início do ano. O promotor José Carlos Blat, autor da denúncia, responsabilizou a defesa pela demora.

Tentáculos
Blat é o mesmo promotor que apresentou em março, junto com outros dois colegas, uma nova denúncia relacionando a Bancoop a um triplex no Guarujá (litoral paulista) que seria do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo eles, a posse do imóvel seria um “tentáculo” das irregularidades na cooperativa dos bancários.

O caso acabou fatiado, a contragosto dos promotores: os trechos contra Lula, seu filho Fábio Luís e a ex-primeira-dama Marisa Letícia ficaram nas mãos do juiz federal Sergio Fernando Moro, enquanto as acusações contra Vaccari Neto, o ex-presidente da construtora OAS José Adelmário Pinheiro e outras dez pessoas continuaram em São Paulo, com a juíza Maria Priscilla Veiga Oliveira, da 4ª Vara Criminal.

A OAS é envolvida no caso porque assumiu obras da Bancoop e, segundo o MP-SP, fez cobranças indevidas e repartiu empreendimentos, diminuindo o tamanho da área firmado em contrato. A ação penal foi aberta em outubro deste ano.

Vaccari Neto também foi preso na operação “lava jato” e foi condenado em três processos, recebendo penas que ultrapassam 30 anos de prisão.

Clique aqui para ler a sentença.

* Texto atualizado pela última vez às 9h22 do dia 10/11/2016 para acréscimos.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!