Processo penal

MPF pede prisão preventiva do juiz do caso Eike Batista

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12 de março de 2015, 14h10

Depois de ser afastado do cargo, o juiz federal que era responsável pelos processos contra o empresário Eike Batista virou alvo de um pedido de prisão preventiva apresentado pelo Ministério Público Federal do Rio de Janeiro. Os promotores querem apurar se ele cometeu os crimes de peculato, subtração de autos, fraude processual e lavagem de dinheiro nas ações contra o ex-bilionário e em outros processos cautelares.

Segundo nota oficial do MPF (leia abaixo) e pessoas ligadas ao processo, o pedido de prisão foi feito na última quarta-feira (11/3) porque o juiz Flávio Roberto de Souza se recusou a informar seu novo endereço residencial à Polícia Federal. Para o órgão, isso justificava sua detenção "para a garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal e aplicação da lei penal". Ele teve recentemente o passaporte apreendido.

De acordo o MPF, o pedido foi negado pelo TRF-2. A corte não confirmou a informação.

O TRF-2 divulgou, na noite de quarta, que os processos contra Eike Batista voltarão para a 3ª Vara Criminal Federal. A medida se deve à resposta da corregedora nacional de Justiça, ministra Nancy Andrighi, à consulta feita pela 2ª Turma Especializada da corte sobre a forma como as processos contra o ex-bilionário deveriam ser redistribuídos.

Na manifestação enviada ao TRF-2, a ministra disse que o procedimento deveria “ser nos moldes do Código de Processo Penal e legislação correlata”. Em outras palavras, ficou valendo a decisão do colegiado de manter os autos no juízo de origem.

Porsche
Souza foi flagrado dirigindo o Porsche Cayennne de Eike, quando chegava à sede da Justiça Federal, no Centro do Rio, no último dia 24 de fevereiro. O próprio juiz havia determinado a apreensão do veículo.

Na sequência do episódio, surgiram outras denúncias: a de que o juiz decidira guardar, na garagem do prédio onde mora, outros dois veículos de luxo do empresário e de que concedera a um vizinho a guarda do piano do ex-bilionário. Em entrevistas, o juiz disse que a utilização de bens apreendidos pela Justiça “seria uma prática normal, adotada por vários juízes”.

Em razão dos acontecimentos, o TRF-2 abriu duas sindicâncias contra Souza: uma para apurar a decisão de manter sob sua guarda os bens de Eike Batista e outra para investigar as declarações que dera de que o uso de bens apreendidos seria uma prática normal.

Outros dois processos disciplinares foram abertos no Conselho Nacional de Justiça — um a pedido da defesa do empresário e o outro da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio.

O TRF-2 promoveu uma correição na 3ª Vara Criminal Federal para apurar a conduta do juiz em outros processos. Concluído na semana passada, o procedimento constatou ainda o sumiço de R$ 30 mil de Eike que foram apreendidos pela PF no processo e cerca de R$ 600 mil em outro processo penal julgado por Souza e que tinha como réu um traficante espanhol.

Souza foi afastado dos processos contra Eike, inicialmente, por decisão administrativa, tomada pela corregedora nacional de Justiça no dia 26 de fevereiro. No dia 5 de março, a transferência dos processos contra Eike Batista para outro juiz foi confirmada na esfera judicial pela 2ª Turma Especializada. No dia 9 de março, o TRF-2 o afastou de suas funções de magistrado. Ele segue licenciado do cargo por motivos médicos.

Leia abaixo a íntegra da nota do MPF:

"Nota de esclarecimento: apuração sobre juiz Flávio Roberto de Souza

Em razão da veiculação recente de algumas notícias de uma investigação em andamento sobre o juiz federal Flávio Roberto de Souza, a Procuradoria Regional da República da 2ª Região (PRR2) vem prestar alguns esclarecimentos. Na semana passada, a Corregedoria Regional do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) remeteu à PRR2 documentos produzidos em correição extraordinária feita na 3ª Vara Federal Criminal no Rio de Janeiro para apurar supostas irregularidades do juiz federal na condução dos processos cautelares de apreensão de bens e valores relativos à ação penal em que o empresário Eike Batista figura como réu.
 
O expediente encaminhado pela Corregedoria revelou também irregularidades em outros processos cautelares conduzidos pelo magistrado, o que determinou a abertura de inquérito naquela corte, a pedido do Ministério Público Federal, para apurar a prática, em tese, de crimes de peculato, subtração de autos, fraude processual e lavagem de dinheiro. Portanto, esta apuração do MPF não tem como objeto a regularidade da ação penal principal em que o empresário Eike Batista responde por vários crimes.

Foram pedidas pelo MPF e deferidos os afastamentos de sigilos fiscal e bancário, além de buscas e apreensões – principalmente para reaver os produtos dos crimes, em especial as quantias de 108 mil euros e 150 mil dólares que confessadamente foram desviadas há alguns dias pelo magistrado dos cofres da 3ª Vara. A guarda judicial desses valores se encontrava em circunstâncias prévia e ilicitamente articuladas para possibilitar o desvio. Tais valores estavam à disposição da Justiça em razão de processo criminal por tráfico internacional de drogas, cujos autos da medida cautelar foram extraviados, o que não impediu, inclusive, que o magistrado proferisse decisões virtuais e até verbais que possibilitaram o desvio de R$ 290.521 que estavam depositados na Caixa Econômica Federal.
 
Com as buscas cumpridas pela Polícia Federal, foram recolhidos alguns documentos que instruirão o inquérito judicial, além de computadores que serão oportunamente periciados, mas o dinheiro desviado não foi localizado.
 
Essa circunstância e a constatação, durante as buscas, de que o magistrado não mais pernoitaria no endereço residencial conhecido das autoridades – na ocasião, ele não declarou seu endereço atual – fundamentaram o já noticiado pedido de prisão pelo MPF, para a garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal e aplicação da lei penal. No entendimento da PRR2, o risco de fuga e os delitos cometidos por um magistrado titular de Vara Criminal atingem o próprio Estado de Direito e desestabilizam as instituições, causando descrédito da população no poder público. Esses argumentos e o atual estado de flagrância (a ocultação da moeda estrangeira poderia justificar uma prisão em flagrante) não foram considerados suficientes pelo relator em exercício no TRF2 para deferir de imediato o pedido de prisão preventiva.
 
O MPF reafirma seu compromisso com a apuração célere dos fatos a fim de levar à Justiça o(s) responsável(is) pelos delitos sob investigação."

Texto alterado às 18h58 do dia 12 de março de 2015 para acréscimos.

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