Balanço de atividades

Para o Ministério Público, sobrecarga dos tribunais é culpa da defesa

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17 de abril de 2015, 18h14

Enquanto o Ministério Público Federal comemora o sucesso midiático da operação “lava jato”, tenta colocar no direito de defesa a culpa pelo excesso de demanda ao Judiciário. Em balanço das atividades da investigação divulgado nesta sexta-feira (17/4), o MPF celebra que, dos 205 Habeas Corpus impetrados pelos investigados, só três foram concedidos. Há ainda outros 19 em tramitação.

De acordo com as informações enviadas pela Procuradoria-Geral da República à imprensa, “o insucesso dos HCs é uma evidência da correção com que as investigações e processos foram e vêm sendo conduzidos”. O levantamento compila dados do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Corte Impetrados Negados Concedidos Em trâmite
TRF-4 111 98 4 (em dois a decisão não é definitiva, segundo o MPF) 9
STJ 67 60 0 7
STF 26 22 1 3
Total 205 180 5 (em três a decisão não é definitiva, segundo o MPF 19

Primeiro, há que se fazer uma explicação dos números. Foram, na verdade, cinco Habeas Corpus concedidos. Só que o MPF não os considera derrotas, porque em três deles as decisões ainda não são definitivas, segundo o órgão. Entretanto, ao contabilizar os HCs negados, o MPF mistura na mesma categoria as decisões de não conhecimento, as denegações de ordem e as negativas de liminar.

De todo modo, o coordenador da força-tarefa que trabalha na “lava jato”, o procurador da República Daltan Dallagnol, acredita que os números ilustram a “banalização dos Habeas Corpus”. “Essa banalização gera um efeito multiplicador e nocivo, porque sobrecarrega os tribunais superiores com questões que serão novamente apresentadas em recursos e permite decisões apressadas sobre questões que poderiam e deveriam ser analisadas de forma mais aprofundada em recursos normais”, afirma.

Isso porque, para ele, a prisão é “o único meio para fazer cessar os crimes, protegendo a economia de novos assaltos”. Mas uma das ideias do MP para combater a corrupção é justamente conceder ao órgão o direito de entrar com recurso contra a concessão de ordem em HC, “o que visa a garantir alguma paridade de armas no tocante à possibilidade de recorrer contra uma decisão desfavorável”. Outra das propostas é escrever na Constituição que o HC só pode ser impetrado para discutir liberdade de forma direta, nunca indireta.

Jogo da culpa
Os advogados que militam em defesa dos investigados na “lava jato” ficaram abismados com a informação. “Falar em banalização de HCs é de uma reprovável inclinação ao autoritarismo digna de regimes fascistas”, afirma o criminalista Edward da Rocha Carvalho.

Alberto Zacharias Toron é o responsável por uma das duas derrotas contabilizadas pelo MP. E o que ele tem a dizer sobre o levantamento é que se trata de “uma pesquisa falha”. “A enorme maioria das denegações do Supremo foi feita com base na Súmula 691”, aponta.

Toron se refere à regra do STF que proíbe o tribunal a conceder Habeas Corpus impetrado contra decisão liminar monocrática de relator do Superior Tribunal de Justiça. Ao aplicar a súmula, o Supremo diz que o HC sequer pode ser analisado. Portanto, não se poderia usar essa fatia dos números para argumentar a correção da investigação.

É o que afirma o criminalista Marcelo Feller. Ele explica que, ao decidir não superar a súmula, o STF afirma que não há teratologia na decisão atacada. “Ou seja, no caso da ‘lava jato’, o Supremo considera que as decisões do juiz federal Sergio Moro não são teratológicas, o que não significa que elas estão corretas.”

Questão democrática
Já para o advogado Fabio Toffic Simantob, vice-presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) e diretor do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), os procuradores estão partindo de “conclusões precipitadas”.

Ele afirma que o STJ e o Supremo ainda não deram palavras definitivas sobre a maioria das questões jurídicas tratadas na “lava jato”. "Enquanto os HCs estão sendo negado com base em súmula, a culpa é da defesa, mas quando o Supremo decide por conceder a ordem a coisa se inverte: a culpa é do juiz que não obedece a orientação das cortes supeiores.”

Toffic também analisa que, se houve ordens concedidas, é porque houve arbitrariedade por parte do Estado. "Se esses dois advogados tivessem trabalhado sob a lógica defendida pelo procurador, não teriam pleiteado a soltura de seus clientes."

Estatísticas
Outra reclamação dos advogados é que o procurador da República toma a parte pelo todo. Pesquisa da FGV Direito Rio demonstrou que, entre 2008 e 2012, 27,8% dos Habeas Corpus impetrados no STJ são concedidos.

“A elevada taxa de sucesso das impetrações no STJ deve ser interpretada como uma alta taxa de reversão das decisões dos tribunais de 2ª instância”, diz o estudo, coordenado pelo professor Thiago Bottino.

O levantamento também aponta que a grande maioria dos HCs é concedida porque houve desrespeito à jurisprudência consolidada — e muitas vezes sumulada — do STJ. “Os dados indicam com precisão quais as situações em que as decisões dos tribunais de segunda instância divergem da jurisprudência já consolidada pelo STJ”, diz o estudo, ao se referir aos crimes de roubo, furto e tráfico de drogas.

"Essa pesquisa só mostra que a conclusão do procurador está equivocada. Quem causa o entulhamento são os juízes que estão desobedecendo a orientação dos superiores", conclui Toffic.

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