Retrato da escravidão

Entidade rediscutirá pedido para tirar quadro de fórum

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16 de março de 2014, 8h14

Responsável pelo quadro de um escravo negro que a seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil pediu para ser retirado do Fórum Criminal da Barra Funda, a Associação dos Advogados Criminalistas de São Paulo vai rever seu posicionamento sobre o assunto. O presidente da Acrimesp, Ademar Gomes, diz já ter recebido mais de 700 e-mails pedindo que a obra de arte continue exposta, dos quais 200 foram direto para sua caixa e os demais para a caixa da entidade.

Uma reunião da diretoria da Acrimesp foi convocada para a noite desta segunda-feira (17/3), na qual a entidade vai deliberar se aceita os apelos que chegaram a ela e mantém o quadro ou se segue a determinação da OAB-SP e tira a peça do Fórum Criminal Ministro Mario Guimarães. O ofício pedindo a retirada da obra de arte é assinado pela presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB-SP, Carmen Dora de Freitas Ferreira. 

Segundo o documento, o quadro “não reflete a condição atual da população negra” e reforça estereótipos e o preconceito “enrustido em muitas pessoas, que, ainda nos dias atuais, têm a ousadia de se referir ao negro ou negra afirmando ‘vou te colocar no tronco’”. Na ocasião, a Acrimesp respondeu que tiraria o quadro, mas que via nisso uma tentativa da OAB de “esconder nossa própria história”.

Em dois dias, a notícia sobre o assunto publicada pela ConJur já tinha 60 comentários. Todos contrários à retirada do quadro. “Infelizmente a escravidão faz parte da nossa história, esta escrita e representada através de esculturas e telas. Entendo que a Acrimesp não deva retirar este quadro”, disse o advogado Luiz Eduardo Buono. Também seguindo nessa linha de pensamento, o advogado José Valdi questionou se a OAB “vai fechar museus”.  

Outro profissional, Marcelo Rodrigues Barreto Junior, ironizou que “daqui a pouco vocês também irão proibir a divulgação de fatos ocorridos na época da ditadura”. “Não acredito nessa história da OAB, tenho certeza que não passa de uma piada. A nossa OAB não pediria para retirar um quadro que representa nossa história”, disse a advogada Patrícia Lopes.

Já o advogado Frederico Bernardes convocou seus colegas de profissão a se mobilizar pela manutenção do quadro. “É preciso que nos manifestemos contra essa atitude pequena da OAB e fiquemos unidos pra mudarmos coisas grandes”, afirmou. 

Odivan Noronha também foi contra a Ordem e questionou se não seria melhor que a entidade divulgasse obras de arte, “assim como a Acrimesp está fazendo”. 

O criminalista Paulo Sérgio Leite Fernandes escreveu, inclusive, um artigo publicado na ConJur, no qual critica o cerceamento à arte. Ele compara a tentativa da OAB-SP de tirar a obra do fórum à censura ocorrida à arte de grandes mestres. O advogado lembra “numa perspectiva cômica, se dramática não fosse, que pinturas exponenciais de Da Vinci, Michelangelo e Rafael tiveram as partes pudendas recobertas por adereços representativos de folhas de parreira, na Capela Sistina e em locais outros”.

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