Coluna do LFG

Lavagem independe de prescrição de crime antecedente

Autor

  • Luiz Flávio Gomes

    é doutor em Direito pela Universidade Complutense de Madri. Mestre em Direito Penal pela USP. Jurista e cientista criminal. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi promotor de Justiça juiz de Direito e advogado.

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19 de abril de 2012, 7h49

Spacca
Luiz Flávio Gomes - Coluna - Spacca [Spacca]*A extinção da punibilidade pela prescrição dos crimes antecedentes não implica atipicidade da lavagem de dinheiro. O posicionamento é da 5ª Turma do STJ no Habeas Corpus 207.936/MG, julgado em 27 de março de 2012, relatado pelo ministro Jorge Mussi.

A expressão “lavagem de dinheiro” ou “lavagem de capitais” tem origem nos EUA (money laudering), e data de meados de 1920, quando criminosos de Chicago começaram a utilizar lavanderias para movimentar o dinheiro oriundo da venda de bebidas alcoólicas, que era proibida naquela época. O vínculo entre a lei seca (norteamericana) e o fortalecimento do crime organizado é mais do que evidente (cf. BURGIERMAN, Denis Russo, O fim da guerra, São Paulo: Leya, 2011).

A lavagem, no nosso país, é o método pelo qual bens, direitos e valores obtidos com a prática de crimes anteriores “determinados” são integrados ao sistema econômico-financeiro, com a aparência de terem sido obtidos de maneira lícita.

Neste sentido é que o crime de lavagem pressupõe a existência de um crime antecedente.

De acordo com a Lei 9.613/1998, artigo 1º, são crimes antecedentes: I – tráfico de drogas; II – terrorismo e seu financiamento; III- contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção; IV – extorsão mediante sequestro; V – crime contra a Administração Pública; VI – crime contra o sistema financeiro nacional; VII – crime praticado por organização criminosa e VIII – praticado por particular contra a administração pública estrangeira.

A própria lei de lavagem, no entanto, explicita que, embora a lavagem pressuponha um crime antecedente, o processo e julgamento dos crimes de lavagem independem do processo e julgamento dos crimes antecedentes (artigo 2º, inciso II, da Lei 9.613/1998).

Assim, a jurisprudência orienta que, se o crime antecedente prescreve, não necessariamente o crime de lavagem é atípico. Isso porque o crime de lavagem de dinheiro é delito autônomo, independente de condenação ou da existência de processo por crime antecedente.

Confira-se a ementa do informativo 494 do STJ, no qual se relatou o julgado em comento:

PRESCRIÇÃO. CRIME ANTECEDENTE. LAVAGEM DE DINHEIRO.

A extinção da punibilidade pela prescrição quanto aos crimes antecedentes não implica o reconhecimento da atipicidade do delito de lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei n. 9.613/1998) imputado ao paciente. Nos termos do art. 2º, II, § 1º da lei mencionada, para a configuração do delito de lavagem de dinheiro não há necessidade de prova cabal do crime anterior, mas apenas a demonstração de indícios suficientes de sua existência. Assim sendo, o crime de lavagem de dinheiro é delito autônomo, independente de condenação ou da existência de processo por crime antecedente. Precedentes citados do STF: HC 93.368-PR, DJe 25/8/2011; HC 94.958-SP, DJe 6/2/2009; do STJ: HC 137.628-RJ, DJe 17/12/2010; REsp 1.133.944-PR, DJe 17/5/2010; HC 87.843-MS, DJe 19/12/2008; APn 458-SP, DJe 18/12/2009, e HC 88.791-SP, DJe 10/11/2008. HC 207.936-MG, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 27/3/2012.

Com a devida vênia, só discordamos do ponto em que se afirma que não é preciso prova cabal do crime anterior. Pensamos que essa prova deve ser inequívoca, o que não afeta a independência do crime de lavagem.

*Colaborou Áurea Maria Ferraz de Sousa, pesquisadora e advogada pós-graduada em Direito Constitucional e em Direito Penal e Processual Penal.

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