Crime financeiro

Leia a sentença que condenou irmão de Ronaldinho Gaúcho

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18 de abril de 2012, 16h50

O empresário e ex-jogador Roberto de Assis Moreira, irmão do jogador Ronaldinho gaúcho, "manteve depósito no exterior, não declarado à repartição federal competente, no ano de 2002, no valor de US$ 125.000,00". Com esta constatação, o juiz José Paulo Baltazar Júnior, da 1ª Vara Federal Criminal de Porto Alegre, condenou o ex-atleta a cinco anos e cinco meses de prisão, em regime semi-aberto, além de determinar o pagamento de multa. O juiz concluiu que houve crimes de sonegação e lavagem de dinheiro. Cabe recurso ao Tribunal Regional da 4ª Região.

De acordo com denúncia do Ministério Público Federal, o empresário teria contribuído, junto com uma sociedade de câmbio, para sonegar informações sobre operações de transferência de valores do exterior para o Brasil. Os valores envolvidos nestas operações, feitas entre fevereiro de 2003 e fevereiro de 2004, teriam chegado a US$ 884.496,00.

O MPF sustentou que Roberto Moreira manteve dois depósitos num banco suíço e não fez a devida declaração ao Banco Central. Em 31 de dezembro de 2001, constava o depósito de US$ 125.000,00; e em 31 de dezembro de 2003 era de US$ 329.964,00. Por fim, sustentou que o empresário ocultou e dissimulou a origem e propriedade de R$ 776.480,28, transformando-os em ativos lícitos. Estas movimentações, segundo o parquet federal, teriam ocorrido entre fevereiro e dezembro de 2003.

O réu apresentou sua defesa. Sobre a acusação prevista no artigo 21, parágrafo único, da Lei 7.492/86 (atribuir-se, ou atribuir a terceiro, falsa identidade, para realização de operação de câmbio), disse que apenas trouxe os valores para o Brasil no encerramento de sua carreira como jogador de futebol. Também garantiu não existir prova da manutenção de depósitos não-declarados no exterior. Negou a prática de lavagem de dinheiro, frisando que seu patrimônio é fruto de atividade lícita.

Meio de campo
Nos lances processuais que seguiram à citação do empresário, a denúncia do MPF correu sério risco de virar pó. Decisão proferida em agosto de 2009 extinguiu a ação penal, sem julgamento de mérito, quanto ao delito previsto no artigo 22, parágrafo único, parte final da Lei 7.492/86 —  efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de divisas do país.

A primeira instância também absolveu sumariamente o réu da acusação da prática dos crimes previstos no artigo 21, parágrafo único, da referida Lei; e do artigo 1º, inciso VI, combinado com parágrafo 1º, inciso I, da Lei 9.613/98 (lavagem de dinheiro e ocultação de bens). A Justiça Federal, entretanto, acatou a Apelação do Ministério Público. Assim, a ação penal voltou a tramitar.

O juízo de origem, então, designou audiência de instrução e julgamento. O empresário não compareceu à audiência, forçando a marcação de outra data. Novamente, ele deixou de cumprir sua obrigação. Desta vez, ele alegou perda de voo — o que não ficou comprovado, segundo registra a sentença. Foi intimado pela terceira vez.

Reconsiderada em parte a decisão anterior, foi determinado o prosseguimento do processo à revelia do réu — conforme disposto no artigo 367 do Código de Processo Penal (CPP) —, ficando facultado à defesa a sua apresentação à audiência.

O Ministério Público apresentou memorial. Pediu a condenação do réu pela prática dos delitos previstos nos artigo 21, parágrafo único, e 22, parágrafo único, ambos da Lei 7.492/86; e no artigo 1º, inciso VI, combinado com parágrafo 1º, inciso I, da Lei 9.613/98. Já a defesa do empresário pediu sua absolvição nos termos da sentença anteriormente proferida.

O juiz federal José Paulo Baltazar Júnior, inicialmente, derrubou acusação de que Roberto de Assis Moreira tenha contribuído para sonegar informações junto ao Banco Central. De acordo com ele, não se pode falar que a informação ao Banco Central foi sonegada ‘‘para realizar a operação de câmbio’’, na medida em que a operação já estava concluída quando deveria ter sido informada.

‘‘O denunciado não estava obrigado a prestar qualquer informação ao Banco Central sobre as operações em questão. Como mencionado, deveria ele prestar corretamente à instituição financeira as informações que lhe fossem exigidas. A prestação de informações ao Banco Central é encargo das instituições financeiras.’’ Assim, por conduta atípica, o réu foi absolvido.

Com relação à manutenção de depósitos no exterior, sem informar o Fisco nacional, o juiz disse não restar dúvidas sobre a ‘‘autoria e a materialidade delitiva’’. Embora o governo suíço tenha negado o acesso a documentos e extratos bancários, o próprio empresário admite que ordenou as transferências para o Brasil, por ‘‘estar encerrando a sua carreira’’.

O juiz afirmou que há prova de que os valores de US$ 125.000,00, US$ 179.982,00 e US$ 149.982,00 foram transferidos do exterior para o Brasil logo após a virada dos anos de 2002 e 2003; ou seja, em 10/2/03, 6/1/04 e em 10/2/04, respectivamente. Isto permite ‘‘inferir-se que tais valores estavam depositados na instituição financeira UBS AG na Suíça, em nome do denunciado, em 31 de dezembro de 2002 (US$ 125.000,00, equivalente a R$ 441.562,50, conforme cotação extraída do site do Bacen em 31/12/02) e em 31 de dezembro de 2003 (US$ 329.964,00, equivalente a R$ 953.086,01, conforme cotação extraída do site do Bacen em 31/12/03)’’.

Neste caso, como o réu não apresentou declarações destes capitais no exterior, foi condenado pela prática do delito previsto no artigo 22, parágrafo único, parte final, da Lei 7.492/86.

Finalmente, quanto ao crime de lavagem de dinheiro, o julgador disse que a prática estava configurada. Para ele, em que pese o entendimento de que, neste tipo penal, os valores depositados no exterior já são propriedade ou estão na posse do autor do fato, não havendo, na omissão da declaração, nenhum acréscimo patrimonial, direto ou indireto, ou mesmo economia de recursos, ‘‘verifico que o crime de lavagem de dinheiro exige apenas que os valores sejam ‘provenientes’, ainda que indiretamente, do crime antecedente’’.

Explicou que, no caso dos autos, a ocultação e dissimulação teriam ocorrido durante e após a internalização dos valores que eram mantidos no exterior sem declaração às autoridades competentes. ‘‘Portanto, os valores objeto de atos de ‘lavagem’ seriam ‘provenientes’ do delito contra o sistema financeiro nacional. Assim, o delito do artigo 22, parágrafo único, parte final, da Lei 9.613/98, pode ser considerado antecedente da lavagem de dinheiro’’, concluiu.

Não vingou o argumento de que o acréscimo patrimonial de R$ 933.472,09, registrado pelo empresário, em relação ao ano anterior, deveu-se às doações feitas por seu irmão. O Bacen, contudo, informou que não há registro sobre a remessa deste volume de dinheiro para o Brasil, tendo como origem o nome de Ronaldinho Gaúcho.

Nestas imputações, o réu foi condenado por violação do artigo 22 parágrafo único, parte final, da Lei 7.492/86; e do artigo 1º., inciso VI, da Lei nº 9.613/98.

As penas restritivas de liberdade foram estabelecidas em cinco anos e cinco meses de reclusão, a serem cumprida em regime semi-aberto. O réu foi condenado, também, a pagar 10 dias-multa (cada dia-multa arbitrada em 40 salários mínimos); e 30 dias-multa (15 mínimos), vigentes à época da cessação das atividades ilícitas.

Clique aqui para ler a íntegra da sentença.

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