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Criação de estagiários bacharéis divide a advocacia

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3 de setembro de 2011, 9h35

Quando percebeu o tamanho da polêmica envolvendo a criação da categoria de estagiários bacharéis, a OAB do Rio Grande do Sul decidiu atrasar o envio da proposta ao Conselho Federal da Ordem. Em vez disso, publicou uma enquete em seu site para saber qual a opinião dos advogados do estado sobre a ideia.

A essência da proposta é permitir que os graduados em Direito que não passaram no Exame de Ordem permaneçam no mercado de trabalho. Estima-se que existam dois milhões de bacharéis sem poder advogar. Pelo projeto da OAB-RS, os bacharéis continuariam exercendo funções de estagiário, como assessoria e consultoria, por mais dois anos depois da formatura. Eles continuariam sem poder advogar ou assinar pareceres e petições.

De acordo com o presidente da OAB gaúcha, Claudio Lamachia, nem mesmo os advogados do Rio Grande do Sul têm opinião formada sobre o assunto. Pelo que ele já pôde observar das prévias da enquete, a criação dos estagiários bacharéis ainda divide muitas opiniões e é impossível prever qual será o resultado. A consulta ainda deve continuar pelos próximos 30 dias.

Se a maioria dos gaúchos for contra a criação da nova categoria, o projeto morre antes de ser votado pelo Conselho Federal da OAB. Mas se eles forem a favor, os conselheiros da OAB é que vão decidir sobre os estagiários bacharéis.

O presidente do Conselho Federal da OAB, Ophir Cavalcante, também não sabe qual será o destino da proposta gaúcha, mas já adianta que é contra a aprovação. "Isso pode trazer uma precarização da advocacia", diz, ao citar que a ideia dificultaria a fiscalização da atividade pela OAB. "O limite entre os que estão habilitados [a advogar] e os que não estão é muito pequeno, e pessoas podem acabar sendo enganadas", prevê.

O desembargador Paulo Dimas Mascharetti, presidente da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis), também é contra permitir que bacharéis continuem estagiando. Ele diz que, para auxiliar os advogados já existem os estagiários, e não há necessidade de acirrar a competição entre eles. "Não parece uma medida muito ajustada", afirma. "A melhor solução é procurar se aprimorar e buscar passar no Exame."

O aprimoramento profissional é justamente o centro da proposta da OAB gaúcha. Lamachia explica que a faculdade de Direito é muito criticada Brasil afora, e a extensão do período de estágio seria também a extensão da possibilidade de aprimoramento profissional. "É um complemento do ensino que teve deficiência", argumenta.

Questão de mérito
O professor Luiz Flávio Gomes, da Rede de Ensino LFG, até concorda com a instituição dos estagiários bacharéis, mas não da forma como ela foi proposta pela OAB gaúcha. Para ele, a ideia pode ser uma resposta à aflição de 90% dos bacharéis, mas deve haver contrapartida. "Tem que haver uma questão de mérito, como pegar os mais bem colocados entre os que não passaram [no Exame de Ordem], ou algo nesse sentido", sugere.

Na opinião do professor, o que acontece agora é uma pressão "dos pouco esforçados" para tentar levar algum benefício em meio à discussão. Mas o que ele defende é que sejam premiados somente os mais esforçados. Ao escolher os que quase passaram no Exame, por exemplo, segundo Gomes, escolhem-se os que já estão "quase prontos" para advogar, mas precisam de algumas melhorias pessoais.

Ovelha negra
A criação do cargo de estagiário bacharel é motivo até de projeto de lei no Congresso. Tramita na Câmara o PL 7.653/2010, de autoria do deputado Hugo Leal (PSC-RJ), para instituir a nova função no Estatuto da Advocacia. A diferença é que os bacharéis, pelo projeto, só ganham um ano para continuar estagiando.

Na justificativa ao texto, Leal argumenta que no fim do curso de graduação, o bacharel é obrigado a esperar meses por todas as fases do Exame de Ordem sem poder exercer a profissão. "Hoje, o Estatuto da Advocacia dá melhor tratamento aos estagiários, que podem exercer todos os atos de advocacia. Contudo, os bacharéis em Direito não podem exercer o ofício, tendo que interromper todas as suas atividades", diz o texto.

Ainda na argumentação de defesa do PL, o deputado afirma que os formados em Direito são os únicos que não podem ingressar na profissão logo depois da graduação: "Os demais cursos superiores não necessitam de quaisquer exames para comprovação de aptidão." A existência do Exame, segundo Hugo Leal, deixa "milhões de profissionais com curso superior e com experiência" desempregados.

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