Caso Battisti

Marco Aurélio acredita que refúgio deve ser mantido

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30 de janeiro de 2009, 13h48

Gervásio Baptista/SCO-STF
Ministro Marco Aurélio - por Gervásio Baptista/SCO-STFO ministro Marco Aurélio acredita que o Supremo Tribunal Federal irá julgar o processo do italiano Cesare Battisti sob o precedente do caso do colombiano Padre Medina. Em 2007, os ministros declararam constitucional o artigo 33 da Lei do Refúgio. Com isso, ficou decidido que a concessão do refúgio político pelo Executivo obsta qualquer pedido de extradição em tramitação no Judiciário. “A ordem jurídica sobrepõe-se ao componente político”, disse o ministro à revista  Consultor Jurídico nesta sexta-feira (30/1).

Marco Aurélio lembra, porém, que não se pode prever o resultado do pedido de extradição do ex-militante comunista, já que a decisão será tomada por um colegiado de juízes. Mesmo assim, na sua avaliação, as diferenças entre o caso do italiano e do colombiano não devem fazer o Supremo reinterpretar a Lei do Refúgio. “Não se decide segundo a capa do processo.”

Para ele, é metajurídico o argumento de que o Supremo deve derrubar a decisão tomada pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, porque as relações diplomáticas entre Brasil e Itália foram afetadas com a concessão do refúgio. “O Brasil é soberano quanto à disciplina interna”, diz.

O ministro explica que, antes da atual legislação, a Lei 6.815/80 até permitia ao Supremo apreciar a natureza do crime nos casos de extradição envolvendo refugiados. No entanto, com a Lei do Refúgio (9.474/97), o Judiciário ficou impedido de revogar os atos do ministro da Justiça.

O caso de Battisti deve ser um dos primeiros processos a ser julgado pelo Plenário do Supremo no seu retorno do recesso, no dia 2 de fevereiro. No dia 13 de janeiro, Tarso Genro concedeu refúgio político ao comunista condenado à prisão perpétua em seu país pelo assassinato de quatro pessoas. A decisão estremeceu as relações diplomáticas entre os dois países. O mundo político da Itália — incluindo o primeiro-ministro Silvio Berlusconi — reagiu com indignação. Até um jogo amistoso entre as seleções de futebol do Brasil e Itália correu risco de não acontecer. A forte reação dos italianos teria desagradado os ministros do Supremo.

A defesa de Battisti — feita pelo advogado e colega de partido de Tarso Genro, Luiz Eduardo Greenhalgh — apressou-se na tentativa de soltar o militante preso no presídio da Papuda em Brasília. Três petições já foram entregues ao Supremo. Mas, o ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo, preferiu esperar uma decisão colegiada antes de libertar o comunista. O ministro também pediu manifestação da Procuradoria-Geral da República e do governo da Itália para que o tribunal tenha mais embasamento na sua decisão.

Caso do Padre Medina

Em março de 2007, Gilmar Mendes foi o relator do pedido de extradição de Francisco Antonio Cadena Colazzos, também conhecido como Camilo e padre Medina, um ex-integrante do grupo guerrilheiro Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). Por nove votos a um, o STF manteve o refúgio. O relator do processo e hoje presidente do STF, Gilmar Mendes, ficou vencido. Gilmar Mendes chegou a resgatar o voto do ministro Victor Nunes Leal, que atuou no tribunal de 1960 a 1969, sobre extradição de um cubano. Em decisão unânime do Plenário tomada no dia 17 de dezembro de 1962, o Supremo entendeu que a concessão de asilo territorial ou diplomático pelo Executivo, por si só, não obstaria a extradição.

No julgamento do colombiano, Marco Aurélio afirmou que “o refúgio é um fato jurídico que não pode ser colocado em segundo plano por esta corte no julgamento da extradição, tendo em conta a previsão do artigo 33 da Lei 9.474/97. Não cabe ao Supremo perquirir o acerto ou o desacerto do ato do Executivo que haja implicado o reconhecimento de status de refugiado”.

Nesta sexta-feira (30/1), o ministro disse que o Supremo não deve julgar de outra forma porque o réu era colombiano em um caso e italiano no outro. “Não nos fixamos ao critério de plantão. Atuamos com o Direito posto. Que se prevaleça o Direito. Somente assim teremos dias melhores no Brasil”, afirmou Marco Aurélio, ao analisar que será difícil o Supremo julgar o mérito do caso Battisti.

Militante escritor

Battisti está preso preventivamente desde março de 2007. Com 52 anos, ele é ex-dirigente dos Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), grupo extremista que atuou na Itália nos anos 60 e 70. O comunista foi condenado a prisão perpétua na Itália por matar o agente penitenciário Antonio Mares Santoro, em Udine, no dia 6 de junho de 1977; Pierluigi Trregiane, em Milão, no dia 16 de fevereiro de 1979; o açougueiro Lino Sabbadin, em Mestre, no dia 16 de fevereiro de 1979; e o agente de Polícia Andréa Campagna, em Milão, no dia 19 de abril de 1979. Battisti, que fugira para a França, foi julgado à revelia.

O ex-militante, agora, é escritor. Quando se refugiou na França, trabalhou como porteiro e escreveu romances policiais. Na década de 90, chegou a escrever 10 livros. No Brasil, lançou apenas uma obra pela editora Martins Fontes: Minha fuga sem fim. A obra, que custa R$ 47,30, tem um tom confessional.

Na sua obra, o escritor se apresenta como alguém que luta a favor dos pobres e oprimidos. Battisti frequentemente faz menção à luta armada. Quando for libertado, ele afirma que voltará a se dedicar ao seu próximo romance, intitulado O Pé do Muro.

Foto: Gervásio Baptista/STF

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