Ministro do STF não impede quebra de sigilos de Denise Abreu
24 de setembro de 2007, 16h51
Está mantida a quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico de Denise Abreu, ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, negou liminar em Habeas Corpus ajuizado por Denise. Ela tentava impedir a quebra dos seus sigilos, determinada pela CPI do Apagão Aéreo.
Para o ministro Celso de Mello, a quebra determinada pela CPI está bem fundamentada. Ele explicou que o Supremo só pode interferir na atuação de CPIs quando estas estiverem violando a Constituição Federal. Nestes casos, não há que se falar em violação da separação dos três Poderes.
Celso de Mello explicou que a quebra de sigilos só pode ser aceita pelo STF quando se basear em fatos concretos, e não em formulações genéricas. Para ele, no caso de Denise Abreu, não há motivos para impedir a quebra dos sigilos.
Denise Abreu renunciou ao cargo de diretora da Anac, no dia 24 de agosto, uma semana depois de o Ministério Público Federal ter aberto dois procedimentos — um na esfera criminal e outro na cível — para apurar o fato de a agência ter entregado à Justiça Federal, em São Paulo, um documento sem valor legal.
O documento embasou a decisão da desembargadora Cecília Marcondes, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, de liberar as operações no Aeroporto de Congonhas em dias de chuva. Dias depois, ocorreu o acidente com o Airbus da TAM em Congonhas, matando 199 pessoas. O MPF alega que Denise enganou a Justiça.
A ex-diretora disse que não sabia que o documento havia sido entregue à Justiça e a desembargadora Cecília contra-argumentou que foi a própria Denise que entregou o documento a ela. No dia 21 de agosto, a CPI do Apagão Aéreo determinou a quebra dos sigilos de Denise.
Leia a decisão
MED. CAUT. EM MANDADO DE SEGURANÇA 26.895-6 DISTRITO FEDERAL
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
IMPETRANTE(S): DENISE MARIA AYRES DE ABREU
ADVOGADO(A/S): ROBERTO PODVAL E OUTRO(A/S)
IMPETRADO(A/S): PRESIDENTE DA COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DO SENADO FEDERAL (CPI DO APAGÃO AÉREO)
DECISÃO: Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida liminar, impetrado contra deliberação da CPI do “Apagão Aéreo” (Senado Federal), que ordenou a quebra do sigilo dos registros bancários, fiscais e telefônicos da ora impetrante.
O órgão ora apontado como coator prestou as informações que lhe foram requisitadas, encaminhando cópia do Requerimento nº 231/07, acompanhada das razões invocadas para justificar, quanto à impetrante, a decretação da quebra dos seus registros sigilosos (fls. 207/213).
Aprecio, desse modo, o pedido de medida liminar ora formulado.
O Supremo Tribunal Federal, como tenho sempre observado em minhas decisões, ao reconhecer possível a quebra de registros bancários, fiscais e telefônicos por Comissões Parlamentares de Inquérito, estabeleceu critérios que a jurisprudência constitucional desta Corte considera essenciais à legitimação da prática excepcional da “disclosure” dos dados sigilosos pertinentes a qualquer pessoa, física ou jurídica.
Torna-se relevante acentuar, por isso mesmo, que o exercício, por qualquer CPI, do poder extraordinário que lhe conferiu a própria Constituição da República supõe, para ser reputado válido, a satisfação de determinados requisitos, notadamente daqueles que impõem, a esse órgão de investigação parlamentar, sob pena de nulidade, a motivação do ato de quebra, que deverá indicar, para esse efeito, fatos concretos justificadores da necessidade dessa medida excepcional (RTJ 173/805 – RTJ 174/844 – RTJ 177/229 – RTJ 178/263 – MS 23.619/DF, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI – MS 23.964/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.):
“A QUEBRA DE SIGILO – QUE SE APÓIA EM FUNDAMENTOS GENÉRICOS E QUE NÃO INDICA FATOS CONCRETOS E PRECISOS REFERENTES À PESSOA SOB INVESTIGAÇÃO – CONSTITUI ATO EIVADO DE NULIDADE.
– A quebra do sigilo inerente aos registros bancários, fiscais e telefônicos, por traduzir medida de caráter excepcional, revela-se incompatível com o ordenamento constitucional, quando fundada em deliberações emanadas de CPI cujo suporte decisório apóia-se em formulações genéricas, destituídas da necessária e específica indicação de causa provável, que se qualifica como pressuposto legitimador da ruptura, por parte do Estado, da esfera de intimidade a todos garantida pela Constituição da República. Precedentes. Doutrina.
O CONTROLE JURISDICIONAL DE ABUSOS PRATICADOS POR COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO NÃO OFENDE O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES.
– O Supremo Tribunal Federal, quando intervém para assegurar as franquias constitucionais e para garantir a integridade e a supremacia da Constituição, neutralizando, desse modo, abusos cometidos por Comissão Parlamentar de Inquérito, desempenha, de maneira plenamente legítima, as atribuições que lhe conferiu a própria Carta da República.
O regular exercício da função jurisdicional, nesse contexto, porque vocacionado a fazer prevalecer a autoridade da Constituição, não transgride o princípio da separação de poderes. Doutrina. Precedentes.”
(MS 25.668/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
O exame dos presentes autos parece revelar que o ato em causa, analisado sob a perspectiva de sua fundamentação (fls. 207/213), estaria em conformidade com essa diretriz jurisprudencial que venho de rememorar.
Sendo assim, em sede de estrita delibação, indefiro o pedido de medida liminar, eis que não concorrem, na espécie, como o exige a jurisprudência desta Suprema Corte (RTJ 112/140), os requisitos necessários à pretendida outorga do provimento cautelar em causa.
2. Transmita-se, ao Senhor Presidente da CPI do “Apagão Aéreo” (Senado Federal), cópia da presente decisão.
3. Uma vez efetivada a comunicação determinada no item n. 2, ouça-se o eminente Procurador-Geral da República, eis que o órgão ora apontado como coator já prestou as informações que lhe foram requisitadas (fls. 203/213).
Publique-se.
Brasília, 21 de setembro de 2007.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
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