Efeito YouTube

Advogado do casal Cicarelli recebe ameaça de morte

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19 de janeiro de 2007, 15h32

A polícia de São Paulo tem pela frente uma tarefa das mais difíceis: identificar o autor de um e-mail que ameaçou de morte o advogado Rubens Decoussau Tilkian, responsável por defender o namorado de Daniella Cicarelli no processo contra o YouTube. O pedido de investigação para apurar responsabilidades no caso encaminhado à delegacia de combate aos crimes eletrônicos é assinado pelo advogado Manuel Alceu, padrasto de Tilkian.

A mensagem, que chegou no endereço eletrônico do advogado do casal em meio a uma avalanche de outras mensagens de protesto, traz como assunto a palavra cagada. No texto, o potencial assassino ameaça: “ae meu irmão tu fez cagada agora vai sentir as conseqüências. Já fez um seguro de vida pra vc. e sua familia?” (sic).

O e-mail foi enviado depois que a Justiça de São Paulo bloqueou o site YouTube para impedir o acesso dos brasileiros ao vídeo em que a modelo Daniela Cicarelli e o empresário Renato Malzoni Filho protagonizam cenas de tórrida paixão, na praia de Tarifa, em Cádiz, na Espanha.

Controle e liberdade

As ameaças ao advogado de Cicarelli, levantam duas questões importantes: uma, o controle, ou a falta dele, nas manifestações da internet; outra, a segurança, ou a falta dela, dos agentes do Direito e da Justiça.

Quanto à primeira questão, o episódio Cicarelli revelou apenas a ponta do iceberg que significa o controle de informações na internet. Com efeito, faz parte da natureza da rede mundial de computadores o sentido democrático de livre acesso e de livre manifestação em suas páginas. Por isso mesmo, em sua concepção, a internet não previa controles ou censura ao seu conteúdo.

O problema, ainda sem solução, surge quando este espaço livre e libertário é usado para a prática de crimes, que vão da pedofilia ao racismo, do furto à ameaça de assassinato, como o registrado contra o advogado da modelo.

Quanto a outra questão, não é a primeira vez que alguém como parte do Judiciário recebe ameaça de morte ao atuar por dever de seu ofício. No período das eleições presidenciais, o ministro Marco Aurélio, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, recebeu e-mails ameaçadores por abrir investigação eleitoral sobre o dossiê PT-sanguessugas — documento que teria sido encomendado por petistas para incriminar tucanos, entre eles o candidato a presidência do país, Geraldo Alckmin.

Mais recentemente, o ministro Sepúlveda Pertence também recebeu ameaças, dessa vez em comentários feito no site Terra Magazine, depois que a revista eletrônica publicou que gravações da Polícia Federal flagraram um advogado dando a entender que obteve uma liminar no Supremo Tribunal Federal graças a uma propina de R$ 600 mil que teria sido paga ao ministro.

O caso Cicarelli

Em setembro o TJ-SP proibiu os sites Globo.com, IG e YouTube de veicular as imagens do casal, sob pena de multa diária de R$ 250 mil.

Como o YouTube teve dificuldades em cumprir a decisão, a defesa de Malzoni, representada por Rubens Decoussau Tilkian, entrou com um novo pedido de proibição da veiculação das imagens. O desembargador Ênio Santarelli Zuliani, da 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, concedeu a liminar por entender que a empresa estrangeira dona do site, a americana Google Inc., não poderia desrespeitar as decisões tomadas pelo Judiciário brasileiro.

A ordem do juiz de retirar as imagens do ar provocou o bloqueio de todo o site para internautas brasileiros. Duas das cinco empresas que fazem a conexão internacional de computadores do Brasil — Brasil Telecom e Telefônica — cumpriram decisão judicial que mandou bloquear o Youtube, gerando inconformidade de seus usuários. Por seu legítimo direito de se defender, Cicarelli passou a ser alvo de protestos e ameaças de represália. A mais grave delas, porém, atingiu seu advogado, no legítimo exercício de suas atribuições.

Leia o pedido

ILUSTRÍSSIMO SENHOR DOUTOR DELEGADO TITULAR DA DELEGACIA DE COMBATE AOS CRIMES COMETIDOS POR MEIOS ELETRÔNICOS.

MANUEL ALCEU AFFONSO FERREIRA, brasileiro, casado, advogado, OAB-SP n. 20.688, CPF n. 005667218-72, domiciliado e residente nesta Capital, com escritório na Rua Hungria n. 888, Jardim Europa, para os fins legais, vem à presença de V. Exa. representar sobre o que a seguir expõe.

1.- O Suplicante é casado (Doc. 1) com d. CACILDA MARIA DECOUSSAU AFFONSO FERREIRA, sendo esta última, por anterior casamento, mãe (Doc. 2) do dr. RUBENS DECOUSSAU TILKIAN, brasileiro, solteiro, advogado, OAB-SP n. 234. 119, com escritório, nesta Capital, na Avenida Dr. Cardoso de Melo n. 1.955, 7º andar.

2.- No exercício de sua militância profissional, e como procurador judicial do sr. RENATO AUFIERO MALZONI FILHO (Doc. 3), referido dr. RUBENS DECOUSSAU TILKIAN interpôs agravo de instrumento (Doc. 4) ao Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo (A.I. n. 488.184-4), sendo certo que a r. decisão liminar nele proferida, envolvendo famoso vídeo obtido em certa praia espanhola, teve e permanece tendo, como notório, farta repercussão na mídia, escrita e eletrônica.

3.- A tal propósito, e em decorrência de sua atuação advocatícia, o enteado e parente do Suplicante pelo vínculo da afinidade (Cód. Civil, art. 1.595, caput e § 1º), dr. RUBENS DECOUSSAU TILKIAN, passou a receber, em seu endereço eletrônico ([email protected]), algumas mensagens de protesto, oriundas de internautas provavelmente inconformados com quaisquer restrições jurisdicionais à mantença do questionado filme na “Internet”.

4.– Ocorre, todavia, que um desses “e mails” (Doc. 5) está a merecer atenção e cuidados especiais, face à grave ameaça nele vertida, destarte justificando a presente notícia e o requerimento de providências apuratórias.

5.- Com efeito, nessa específica mensagem (Doc. 5), onde se acha indicado, como remetente, o endereço [email protected] em nome de Celso Moff [[email protected]]” (n.g.), e onde anotado o assunto “que cagada”, registrou-se literalmente o seguinte:

“ae meu irmão tu fez cagada agora vai sentir as conseqüências JÁ FEZ UM SEGURO DE VIDA PRA VC. E SUA FAMILIA?” (cf. Doc. 5, maiúsculas originais e nossos grifos).

6.- Pelo exposto, e instruída a presente com os documentos aqui anexados, requer-se se digne V. Sa. diligenciar as medidas investigatórias destinadas à apuração da responsabilidade criminal pelo apontado “e mail” (Doc. 5), para que se possa representar ao Ministério Público do Estado de São Paulo, com o objetivo de ser proposta a competente ação penal.

Termos em que, pede deferimento.

São Paulo, 16 de janeiro de 2007.

MANUEL ALCEU AFFONSO FERREIRA

OAB-SP nº 20.688

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