Ato administrativo

Ameaça a advogado durante trabalho não garante porte de arma, decide TRF-4

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23 de março de 2018, 9h41

O Judiciário não pode interferir na autorização para porte de arma de fogo, pois cabe à Polícia Federal avaliar se o interessado cumpre os requisitos fixados pelo Estatuto do Desarmamento. Assim entendeu a desembargadora Vânia Hack de Almeida, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao negar pedido de liminar apresentado por um advogado que recebeu ameaças por telefone.

Em decisão monocrática, ela considerou legal o ato administrativo da autoridade policial, que negou a autorização. A desembargadora citou a jurisprudência do próprio tribunal, que desacolheu muitos pedidos de concessão de porte de armas sob o argumento de que o Poder Judiciário não pode entrar no mérito do ato administrativo proferido pela PF.

‘‘Em que pesem as razões do agravante, tenho que não se trata de ignorar as ameaças sofridas por este e, tampouco, de transferir para o Poder Judiciário a responsabilidade por eventual risco a que esteja submetido, uma vez que a solução para os problemas relacionados à segurança pública não se encontra na sua esfera de autuação’’, afirmou a desembargadora.

Ameaças
O advogado Fabiano Padoim Vieira, que atua no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, encaminhou à PF um pedido de autorização para portar arma de fogo, em função de sua atuação profissional e por temer pela sua integridade física e de sua família, que sempre o acompanha em suas viagens.

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Advogado queria ter direito a portar arma depois de companheiro da parte contrária declarar que o agrediria.
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De acordo com o artigo 10, parágrafo 1º, inciso I da Lei 10.826/2003, a licença é possível quando o interessado demonstra efetiva necessidade para o exercício de atividade profissional de risco ou por ameaça à sua integridade física. 

Na esfera administrativa, no entanto, o pedido foi negado, sob o argumento de que ele não comprovou a ‘‘efetiva necessidade’’. Vieira recorreu e ainda aguarda análise da PF.

Acontece que, enquanto espera nova decisão, ele foi ameaçado pelo companheiro de uma parte contrária à que o advogado representa num processo de inventário. Ele juntou nos autos gravação de contato telefônico em novembro de 2017, quando ouviu ameaças depois de dizer ao companheiro que havia orientado sua cliente a não assinar o inventário.

Ouvida no processo, a autoridade policial diz que ‘‘não há como a Polícia Federal se arvorar no direito de conceder porte de arma a advogado em razão de sua atividade profissional, sob pena de invadir competência legislativa, criando verdadeira prerrogativa não prevista em lei’’.

O juiz federal Daniel Antoniazzi Freitag, da 2ª Vara Federal de Santa Maria, reconheceu que as ameaças ocorreram durante a atuação profissional do autor. No entanto, avaliou, a advocacia não é, em tese, uma atividade de risco. Assim, entendeu que os fundamentos do pedido administrativo não indicam a existência de risco no cotidiano profissional, o que torna a decisão da PF ‘‘absolutamente coerente’’.

Sem risco real
O julgador destacou que, no curso do diálogo, o ‘‘embate verbal’’ foi arrefecendo, evoluindo para uma forma mais civilizada. ‘‘O inteiro teor do diálogo revela que o autor da ameaça logo voltou atrás, inclusive justificando, na própria ligação, o seu agir; ou seja, o interlocutor afirmou expressamente e por mais de uma vez ter proferido tais advertências intimidatórias como uma resposta ao que havia compreendido (no ápice da exaltação dos ânimos).’’

O juiz, por isso, não conseguiu se convencer da existência de risco real à integridade física do advogado, nem do direito alegado. Concluiu que autorizar o porte de arma de fogo implicaria prover o advogado de um meio de defesa absolutamente desproporcional, considerando-se a gravidade da ameaça de agressão, bem como um salvo-conduto ao porte de arma ao arrepio da lei.

‘‘Há de se ressaltar que a restrição ao porte de armas de fogo é um fato concreto, materializado através da opção do legislador, de forma que a interpretação da expressão ‘ameaça à integridade física’ deve ser interpretada restritivamente, sob pena de violação direta à norma legal’’, diz a decisão de primeiro grau, mantida pelo TRF-4. O mérito ainda deverá ser analisado na vara de origem.

Clique aqui para ler decisão da 2ª Vara Federal de Santa Maria.
Clique aqui para ler decisão da desembargadora do TRF-4.

Processo 5012999-86.2017.4.04.7102/RS

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