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Agência de notícias não consegue imunidade tributária de veículo de imprensa

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23 de junho de 2017, 7h15

O fato de agências de notícias venderem suas reportagens para outros veículos de imprensa e não para o público geral serviu como base para a 2ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo julgar que tais empresas não têm direito à imunidade tributária prevista no artigo 150 da Constituição Federal.

Assim, a juíza Laís Helena Bresser Lang obrigou a Agência Estado, do mesmo grupo do jornal O Estado de S. Paulo, a recolher R$ 88,8 milhões de ISS para a prefeitura paulistana.

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Tese usada é que agência vende notícias para empresas e não diretamente para leitores.
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A agência alegou na ação que sua atividade principal — comercialização de textos, fotos e de noticiosos eletrônicos — não pode ser entendida como prestação de serviços, mas "obrigação de dar", o que descaracterizaria a incidência de ISS. Disse ainda que os trabalhos analisados, mesmo que fossem considerados serviços, estariam protegidos da tributação pelo artigo 150, inciso VI, letra d, da Constituição Federal.

Já a Procuradoria de São Paulo argumentou que a agência de notícias, em seu cadastro de contribuintes, detalha que presta diversas atividades, por exemplo, agenciamento e assessoria. Complementou dizendo que mesmo a atividade fosse considerada "cessão de direitos", o ISS ainda incidiria.

Para a juíza Laís, as atividades da agência de notícias não podem ser consideradas como uma obrigação de dar. Destacou também que o contrato apresentado pela própria empresa nos autos detalha a companhia como “especializada na prestação de serviços de fornecimento e divulgação de conteúdo e de informações".

“Anoto que o fato de não existir exclusividade no fornecimento de conteúdo não afasta o caráter de prestação de serviços da autora. E, apesar de constar no contrato que há entre as partes a cessão de direitos autorais, este não é o objeto do contrato”, afirmou a magistrada.

Segundo Laís, a isenção tributária concedida à imprensa existe para facilitar a difusão cultural, barateando-a. “Em outras palavras, a Constituição Federal, ao prever referida imunidade, visa garantir à sociedade o livre acesso às informações, aos princípios da livre manifestação de pensamento e às atividades intelectual, artística e científica.”

Imunidade polêmica
Para o tributarista Igor Mauler Santiago, a interpretação da juíza vai contra o entendimento do próprio Supremo, que tem concedido imunidade para matérias primas para a produção de jornal, como tinta e maquinário. “O que é mais essencial para a imprensa do que a própria notícia, vendida pelas agências?”, questiona.

A jurisprudência tem caminhado no sentido de que a imunidade serve para baratear o consumo de notícias, explica o advogado. E uma interpretação como a da juíza Laís Lang privilegiaria os grandes veículos, em detrimento dos pequenos e locais, já que os maiores possuem equipe e material para suprir a falta das agências de notícias, afirma.

O escritório do qual Santiago é sócio, o Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados, patrocina inclusive uma ação no Supremo que busca a imunidade tributária para gráficas contratadas por veículo de imprensa. A ação traz dados para confirmar essa necessidade: dos 3,5 mil jornais atualmente em circulação no Brasil, só 520 têm gráfica própria. [Clique aqui para ler o memorial sobre o caso enviado ao STF

O próprio secretário de Justiça de São Paulo — responsável por coordenar as ações da Procuradoria do município —, Anderson Pomini, disse, em entrevista à ConJur, que a imunidade concedida a jornais deveria ser estendida a sites de notícia. "O objeto analisado para concessão da imunidade pela Constituição Federal é o conteúdo do veículo, ou seja, notícias", afirma Pomini.

A tese é defendida pelo tributarista e professor de Direito Financeiro da USP Fernando Facury Scaff, em artigo publicado na ConJur. "Passados tantos anos [desde a promulgação da Constituição], e com as novas tecnologias disponíveis, a questão da imunidade tributária alcança outros meios de disseminação da informação que não apenas o e-book ou o CD-ROM, mas também os sites informativos e de notícias", afirma.

Clique aqui para ler a decisão.

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