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"Lava jato" quer usar Palocci para investigar eleições de Chávez, diz advogado

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6 de junho de 2017, 6h30

O financiamento da campanha para reeleição de Hugo Chávez à Presidência da Venezuela, em 2012, será investigado pela “lava jato”, no Brasil. Segundo a publicitária Mônica Moura, seu marido, João Santana, recebeu US$ 35 milhões para trabalhar na campanha. Desse dinheiro, US$ 7 milhões seriam pagos pela Odebrecht e US$ 5 milhões, pela Andrade Gutierrez. O restante seria transferido pelo então chanceler da Venzuela, Nicolás Maduro, hoje presidente do país.

Como as informações foram prestadas em delação premiada acertada pelo casal com a Procuradoria-Geral da República, o pedido de abertura de inquérito foi feito ao Supremo Tribunal Federal. Como nenhuma autoridade com prerrogativa de foro no STF foi delatada, o ministro Luiz Edson Fachin, relator da “lava jato” na corte, determinou o envio do processo à 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, onde o juiz federal Sergio Moro conduz as investigações em primeira instância.

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"Lava jato" não apontou conexão de financiamento da campanha de Chávez
à Petrobras, afirmam advogados.
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Mas as defesas dos delatados sentiram falta de um elemento essencial para que Moro fique com o caso: menção à Petrobras. O Supremo já decidiu que a competência da 13ª Vara de Curitiba se resume à investigações sobre fraudes a licitações e desvios ligados a obras da estatal de petróleo. Por isso os casos ligados à Eletrobras, à Eletronuclear e ao BNDES, por exemplo, foram distribuídos para outras varas da Justiça Federal.

A reclamação é feita em agravo regimental apresentado pela defesa do jornalista Franklin Martins, que foi ministro no governo de Lula, ao Supremo. Em petição enviada à corte no dia 30 de maio e assinada pelo advogado Ademar Rigueira Neto, o jornalista afirma que não há motivos para que a Justiça Federal em Curitiba investigue o financiamento de uma campanha eleitoral na Venezuela em que o dinheiro brasileiro é de uma empresa privada.

Franklin é acusado porque prestou serviços de comunicação digital à campanha de Chávez. Trabalhou na mesma equipe que João Santana e Mônica Moura. De acordo com a delação da publicitária, Maduro exigiu que os publicitários recebessem o dinheiro “por fora” por meio de pagamentos feitos pela Odebrecht e pala Andrade Gutierrez.

Conexão Palocci
A origem desse dinheiro é o que atrairia a competência de Sergio Moro para o caso, segundo a tese do Ministério Público Federal. Para Ademar Rigueira Neto, o real motivo de fazer o caso ir para Curitiba é o fato de o ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil Antonio Palocci, Mônica Moura e João Santana já responderem a ações penais que tramitam na 13ª Vara Federal de Curitiba. E o fato de os três terem assinado acordos de delação premiada.

De acordo com Mônica, a equipe de seu marido recebeu dinheiro de caixa dois oriundo de contratos da Odebrecht para a construção de 21 navios-sonda para a Petrobras.

O agravo da defesa de Franklin Martins contesta os fatos. Para Ademar Rigueira, a única conexão real dos fatos é com Antônio Palocci. Ele é investigado em Curitiba sob a acusação de controlar duas planilhas de pagamento de suborno pela Odebrecht em troca de facilidades com contratos públicos.

De acordo com os investigadores, Palocci usou de sua influência dentro do governo e do PT e de sua posição como ex-presidente do conselho de administração da Petrobras para influenciar nas decisões da empresa e favorecer a Odebrecht. E os pagamentos a João Santana e Mônica Moura constariam das planilhas, demonstrando que a origem do dinheiro é a Petrobras.

Mas, segundo o agravo regimental, “inexiste qualquer vinculação” entre a influência de Palocci na Petrobras, sua suposta ajuda à Odebrecht e os contratos de construção de navios-sonda às planilhas. E “é impossível” vincular o pagamento feito aos publicitários aos valores descritos nos documentos. “A prevenção por conexão apontada pelo parquet, na realidade, é claramente fantasiosa”, diz Ademar Rigueira Neto.

Delação contra delação
A conexão das investigações sobre o financiamento da campanha de Chávez em 2012 com a “lava jato” em Curitiba, na verdade, é mais um caso de conflito entre delações premiadas. Mônica Moura afirma que recebeu dinheiro da Odebrecht e que a origem desse dinheiro eram contratos da Petrobras. Marcelo Odebrecht, em sua delação, nega que tenha havido “favorecimento aos interesses” da empresa com esses contratos — e por isso não haveria a contrapartida da propina.

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Em delação, Marcelo Odebrecht negou ter pagado propina para assinar contratos de construção de navios-sonda para Petrobras.
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De acordo com Marcelo, antes de a presidente Dilma Rousseff tomar posse, em 2011, sua interlocução com o governo era feita com Palocci. Depois de 2011, o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega é que passou a ser o contato, por indicação da própria Dilma.

Na delação, o empreiteiro afirma que foi aberta uma conta corrente da onde saía o dinheiro de propina paga ao governo em troca de benefícios em políticas públicas. As planilhas referidas nas delações da empreiteira eram chamados de “Italiano” e “Pós-Itália”. A primeira era uma referência a Palocci. A segunda, que passou a ser usada em 2011, era de responsabilidade de Mantega.

João Santana, que fez as campanhas de Dilma, aprece como um dos destinatários de dinheiro. Mas, “em momento algum”, continua Rigueira em seu agravo, há indicações de que esse pagamento tem como contrapartida a Petrobras. Também não há registro de pagamentos na Venezuela, afirma o advogado. No exterior, são mencionadas duas transferências, uma para El Salvador e outra, para o Peru.

Marcelo contou à PGR que foi procurado por Márcio Faria, um executivo da Odebrecht, para falar sobre um pedido de dinheiro feito por João Vaccari, ex-tesoureiro do PT. Ele pedia propina ao partido em troca de ajuda com os contratos de construção dos navios-sonda. Mas, segundo Marcelo, não houve suborno a ninguém, do PT ou da Petrobras, para que esses contratos fossem assinados. Portanto, “não faria sentido” o pagamento. A negativa do pedido, conforme Marcelo contou em sua delação, foi depois reiterada a Palocci.

“Não há qualquer indício de que os pagamentos realizados pela Odebrecht em virtude da campanha presidencial da Venezuela de 2012 sequer se relacionem com as referidas planilhas”, diz o agravo da defesa de Franklin Martins.

Clique aqui para ler o agravo regimental
PET 6.991

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