Ao determinar prisões, Sergio Moro faz defesa da delação premiada
15 de novembro de 2014, 16h51
A decisão do dia 10 de novembro, que determinou as prisões feitas nesta sexta-feira (14/11), tem 51 páginas e dedica pelo menos duas delas a dar explicações sobre o uso do que prefere chamar de “colaboração premiada”. A justificativa já começa botando em xeque os próprios delatores: “É certo que os depoimentos de Alberto Youssef, de Paulo Roberto Costa e destes outros colaboradores devem ser vistos com muitas reservas, já que se tratam de pessoas acusadas por crimes graves e que buscam benefícios de redução de pena decorrente da colaboração”.
No entanto, diz o juiz, é um “instrumento de prova válido e eficaz”, principalmente para crimes complexos, do colarinho branco ou praticados por grupos criminosos. Sergio Moro faz também uma longa citação do juiz americano Stephen S. Trott, do Partido Republicano. Segundo o jurista dos EUA, “a sociedade não pode dar-se ao luxo de jogar fora a prova produzida pelos decaídos, ciumentos e dissidentes daqueles que vivem da violação da lei”. Segundo Trott, “para pegar os chefes e arruinar suas organizações, é necessário fazer com que os subordinados virem-se contra os do topo”.
De acordo com o advogado Alberto Zacharias Toron, que representa três integrantes da UTC engenharia, as prisões são "uma tentativa clara de extorquir confissões". Toron revelou à ConJur que há mais de um mês os advogados do caso enviaram uma petição a Sergio Moro que "colocava à disposição todos os clientes para colaborar com o caso". No entanto, o juiz não respondeu e deu provimento ao mandado de prisão.
Além disso, não houve acesso à integra dos depoimentos utilizados na decisão, o que, para Toron, é um claro cerceamento do direito de defesa. Segundo o advogado, "causa espanto que o Judiciário entenda assim sem nenhuma necessidade cautelar", afirmou.
Enquanto advogados dizem que empresários, executivos e advogados foram presos nesta sexta por terem se negado a confessar crimes dos quais são acusados, Moro afirma que ninguém foi coagido ilegalmente a colaborar com as investigações. Todas as delações foram “voluntárias, ainda que não espontâneas”, diz o juiz. “Jamais se prendeu qualquer pessoa buscando confissão e colaboração”, garante a decisão.
Moro justifica os mandados de prisão cautelar pelos casos analisados por ele apresentarem “os seus pressupostos e fundamentos, boa prova dos crimes e principalmente riscos de reiteração delitiva dados os indícios de atividade criminal grave reiterada e habitual”.
Mesmo advogados que não estão diretamente ligados ao caso questionam a afirmação do magistrado. "Como um crime que supostamente aconteceu em 2012 justifica a prisão dos acusados?”, questiona Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que defendeu o doleiro Alberto Yousseff no começo da operação, mas agora acompanha o caso sem atuar nele.
“O juiz ignorou a previsão legal para que não se decrete a prisão sem necessidade”, ressaltou Kakay. Para ele, seria mais plausível obrigar os acusados a ficarem no país. Entre as justificativas para as prisões, está a de que alguns dos investigados viajam muito. “Ora, se foi possível notar isso, é porque eles sempre voltam para o endereço deles”, aponta o advogado.
Coniventes com o crime
Entre as críticas feitas por advogados criminalistas à delação premiada, está a de que o MP propõe esse tipo de acordo buscando, na verdade, “esquentar” provas obtidas de forma ilícita, como noticiou a revista eletrônica Consultor Jurídico. A ideia é colocar alguém para falar aquilo que o órgão já sabe, mas não pode afirmar porque obteve de forma ilegal, como por escutas não autorizadas.
No entanto, para o juiz Sergio Moro, quem critica a delação, “é, aparentemente, favorável à regra do silêncio, a omertà [consenso de nunca colaborar com as autoridades] das organizações criminosas, isso sim reprovável”.
Clique aqui para ler a decisão que determinou as prisões, publicada pelo blog do jornalista Fausto Macedo.
Notícia alterada às 20h50 para acréscimos de informação.
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