Parecer da AGU

Extradição de Battisti pode ser decidida por Dilma

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23 de dezembro de 2010, 7h00

Está nas mãos do advogado-geral da União, ministro Luís Inácio Lucena Adams, o parecer que irá tentar manter no Brasil o ex-militante italiano de esquerda Cesare Battisti, condenado na Itália por quatro homicídios. A opinião da AGU, pedida pelo presidente Lula depois que o Supremo Tribunal Federal autorizou a extradição, ainda não chegou ao Planalto, o que deve acontecer até a semana que vem. Guardado a sete chaves, o documento se propõe a fornecer argumento jurídico para não enviar o italiano ao seu país, algo, segundo especialistas, virtualmente impossível.

A tarefa é içar uma justificativa que não tenha passado pela avaliação feita no Supremo em novembro do ano passado, e que ainda se submeta ao Tratado de Extradição assinado entre Brasil e Itália. Além disso, divergências com o que já disse o Ministério da Justiça a respeito também não podem passar. No início do processo, o Comitê Nacional para os Refugiados, responsável por julgar concessões de refúgio político, se dividiu quanto a Battisti. O italiano perdeu por três votos a dois, o que mostra a diferença dos posicionamentos no órgão. O então ministro da Justiça, Tarso Genro, reformou a decisão e concedeu o refúgio, levando o governo italiano a protestar no STF.

Enquanto o conteúdo do parecer da AGU permanece em segredo, pelo menos um dos argumentos tentará esticar a estadia de Battisti nos trópicos. Fontes no órgão afirmam que o presidente Lula não poderá despachar Battisti enquanto a Itália não disser estar de acordo com as exigências feitas pelo Supremo no acórdão pela extradição. Battisti foi condenado a prisão perpétua na Itália, pena que não existe no Brasil. Portanto, uma das condições é que sua pena seja reduzida à máxima permitida aqui, que é de 30 anos. Além disso, o período sob custódia da Polícia Federal também deve ser descontado do total. Battisti está preso desde março de 2007 na Penitenciária de Brasília.

Se essa for a posição de Lula, a decisão final pode ficar com a presidente eleita Dilma Rousseff, para 2011. Esse resultado, segundo pessoas próximas a Lula, contrariaria sua vontade, já que ele teria a intenção de resolver a questão.

Para o advogado do governo italiano no Brasil, Nabor Bulhões, se essa for a justificativa para a não entrega de Battisti, o Planalto estará invertendo a lógica do tratado. “A Itália vai aderir a tudo o que foi determinado pelo Supremo, mas só se manifestará quando for notificada pelo Executivo brasileiro de que pode retirar o extraditando”, afirma. Segundo ele, o Código de Processo Penal italiano não cria empecilhos para a redução da pena nesse caso. “O princípio da detração será aplicado para computar o período de prisão no Brasil.”

Bulhões afirma que a única margem que o governo brasileiro tem para não entregar Battisti é “quando”, e não “se”. “O Executivo pode alegar que ele deve cumprir primeiro outra pena no país, por exemplo. Mas deixar de entregá-lo, não.” Em março, Battisti foi condenado pela Justiça Federal por uso de passaporte falso. A pena original foi de dois anos de prisão em regime aberto, comutada em prestação de serviços à comunidade e pagamento de multa. “O Brasil sequer pode denunciar o tratado e escapar da sua vigência, já que, para o rompimento, a carência é de seis meses”, diz Bulhões.

Novela política
Na Itália, Battisti foi líder da organização de extrema esquerda Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), que atuou na Itália nos anos 60 e 70. Em 1993, foi condenado a prisão perpétua sob acusação de participar dos homicídios do agente penitenciário Antonio Mares Santoro, em Udine, no dia 6 de junho de 1977; de Pierluigi Trregiane, em Milão, no dia 16 de fevereiro de 1979; do açougueiro Lino Sabbadin, em Mestre, no dia 16 de fevereiro de 1979; e do agente de Polícia Andrea Campagna, em Milão, no dia 19 de abril de 1979.

Foi o segundo julgamento contra ele pelo mesmo crime. No primeiro, ele havia sido absolvido definitivamente. Mas novas denúncias feitas por outro ex-ativista e desafeto de Battisti, num programa de delação premiada, deram motivos para a reabertura do processo. Battisti nega as acusações.

Enquanto o processo de Extradição corria no STF, o ministro da Justiça, Tarso Genro, reformou decisão do Comitê Nacional de Refugiados e concedeu o refúgio político ao militante. A alegação foi de que Battisti não teve direito a ampla defesa no seu país e que um eventual retorno colocaria em risco a integridade física do italiano.

Detido em 1979, em Milão, Battisti conseguiu escapar da prisão e fugir para a França. Refugiou-se no México em 1982, mas em 1990 voltou à França. De lá, veio para o Brasil. Em março de 2007, foi preso no Rio de Janeiro e transferido para o Presídio de Papuda, no Distrito Federal. Na França, Battisti trabalhou como porteiro e escreveu romances policiais. Na década de 90, chegou a escrever 10 livros. No Brasil, lançou apenas uma obra, pela editora Martins Fontes: Minha fuga sem fim: dos anos de chumbo na Itália, de leis ao revés na França, ao inferno do cárcere no Brasil.

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