Reflexões Trabalhistas

A importância da atualização da NR-1: uma nova era para a segurança e saúde no trabalho

Autores

  • é doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal-UDF/mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho consultor jurídico advogado procurador regional do Trabalho aposentado e autor de livros jurídicos entre eles Direito Ambiental do Trabalho e a Saúde do Trabalhador.

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  • é advogado trabalhista mestre em Direito professor da Fatec (Faculdade de Tecnologia) de Campinas membro da (Associação Brasileira de Pesquisadores(as) Negros(as) (ABPN).

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23 de maio de 2025, 8h00

A Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), emitida pelo Ministério do Trabalho e Emprego, é um dos marcos fundamentais da legislação de segurança e saúde no trabalho (SST) do país.

Sua primeira edição saiu em 8/6/1978, editada pela Portaria MTb nº 3.214/78.

Desde sua edição a NR-1 busca estabelecer diretrizes que assegurem ambientes de trabalho seguros e saudáveis para os trabalhadores. Com o cenário laboral em rápida transformação — impulsionado pela Revolução Digital, pelo trabalho remoto e por novas compreensões da saúde mental — tornou-se imperativo que a legislação se atualize para refletir essas realidades.

A nova versão da NR-1, que entraria em vigor em 26 de maio de 2025 não é apenas uma atualização formal; é uma reestruturação necessária para enfrentar os desafios contemporâneos e futuros do trabalho em relação à saúde dos trabalhadores, especialmente em relação aos riscos psicossociais.

A NR-1 define diretrizes gerais de saúde e segurança no trabalho e, com as últimas atualizações em 2024, passou a exigir o Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO) e o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), incluindo fatores psicossociais, como carga excessiva de trabalho e pressão por resultados, que, como sabido, impactam a saúde mental dos trabalhadores.

Mais do que uma obrigação legal, essa atualização reforça a necessidade de as empresas promoverem ambientes de trabalho que priorizem tanto a saúde física quanto a saúde mental dos trabalhadores, definindo responsabilidades, obrigações e direitos dos trabalhadores e empregadores, além de especificar a importância da prevenção de acidentes e de doenças ocupacionais.

Por isso, em 2024 a NR-1 recebeu duas atualizações significativas. Agora, a norma orienta as organizações empresariais a identificar, avaliar e gerenciar riscos psicossociais com o mesmo rigor aplicado aos riscos físicos e químicos. Isso inclui a avaliação da organização do trabalho, das relações interpessoais e de outros fatores ambientais e sociais que possam contribuir para condições de trabalho prejudiciais aos trabalhadores.

Desde a sua elaboração, a NR-1 foi projetada para abordar as condições de trabalho que impactam a segurança e saúde dos trabalhadores. Sua função primordial tem sido reduzir os riscos e promover condições de trabalho adequadas. Entretanto, com as mudanças sociais, econômicas e tecnológicas dos últimos anos, ficou evidente que essa norma precisava de uma revisão, para corrigir lacunas e ampliar seu alcance de proteção da saúde dos trabalhadores.

Desde os anos 2000 o Brasil vem passando por um processo de contínuas reformas no mundo do trabalho, que se acelerou com a pandemia de Covid-19. O surgimento do trabalho remoto e a adesão de novas tecnologias tornaram obsoletas algumas das diretrizes anteriormente fixadas. Nesse contexto, a necessidade de uma atualização que contemplasse as novas realidades e desafios, garantindo a proteção dos trabalhadores, tornou-se inadiável.

A atualização da NR-1 trouxe inovações e aprimoramentos significativos, que visam modernizar as práticas de SST. Vejamos, a seguir, detalhes das mudanças mais relevantes dessa atualização.

a) Ampliação do conceito de ambiente de trabalho

O conceito de ambiente de trabalho foi ampliado, para incluir não apenas espaços físicos, mas também ambientes virtuais. Essa mudança é importante, pois, muitas organizações adotaram o home office como uma alternativa viável. Contudo, o trabalho remoto apresenta desafios de segurança e saúde, que precisam ser enfrentados, como, por exemplo, a ergonomia das estações de trabalho em casa e a necessidade de suporte psicológico, entre outros.

b) Responsabilidades compartilhadas

A nova NR-1 enfatiza que a responsabilidade pela segurança e saúde deve ser compartilhada. Isso implica que não apenas os empregadores, mas também os trabalhadores e trabalhadoras desempenham papéis ativos na promoção e manutenção das condições de trabalho. A participação dos empregados na identificação de riscos e na proposição de soluções é um passo fundamental para a construção de uma cultura de segurança.

c) Enfoque na prevenção

A NR-1, agora atualizada para as novas realidades do trabalho, dá ênfase ainda maior na prevenção de acidentes e de doenças ocupacionais. Com isso, as empresas são incentivadas a implementar Programas de Gestão de Segurança e Saúde no Trabalho (PGSST). Esses programas devem ser adaptados, conforme as especificidades de cada setor e contexto organizacional, permitindo uma abordagem personalizada e eficaz.

d) Integração com outras normas

Com a nova atualização, a NR-1 busca harmonização com outras normas regulamentadoras (NRs). Isso significa que as diretrizes de SST passarão a dialogar de forma mais integrada, o que viabiliza a implementação de ações unificadas e sistemáticas nos ambientes de trabalho. Essa sinergia poderá resultar em práticas mais robustas e interligadas, que favoreçam uma abordagem mais holística da segurança e saúde no trabalho.

Por isso, a importância e necessidade da atualização da NR-1, que, em razão de ter sido adiada a sua aplicação pelo Ministério do Trabalho e Emprego, entrará em vigor somente em 26/5/2026.

De acordo com o ministro do trabalho, o primeiro ano terá caráter educativo e orientativo, permitindo que as empresas se adaptem às novas exigências, sendo que a fiscalização e autuações pela Inspeção do Trabalho terão início somente em 26 de maio de 2026.

O objetivo do adiamento, como assegurou o MTE foi fazer uma transição segura, inclusive, para atender solicitações de empregadores e de trabalhadores, que pediram transição mais segura e estruturada, diante das novas exigências relacionadas à saúde mental nos ambientes de trabalho.

Assim, o governo anunciou também um conjunto de ações para apoiar a implementação efetiva das novas alterações da NR1, como o lançamento de um manual técnico detalhado e a criação de um grupo de trabalho tripartite (GTT), formado por representantes do governo, de empresas e de trabalhadores, com o objetivo de acompanhar e orientar a aplicação da NR-1. Isso é importante, porque a atualização dessa norma foi feita também de forma tripartite.

As mudanças propostas pela nova NR-1 não são meramente burocráticas, mas oferecem uma série de benefícios que podem transformar positivamente os ambientes de trabalho. A seguir, aspectos em maior profundidade.

a) Promoção da saúde mental

Nos últimos anos a saúde mental tem sido reconhecida como uma questão premente nos ambientes de trabalho. A nova NR-1 traz diretrizes que abordam essa temática, ressaltando a importância de ambientes que não apenas minimizem o estresse, mas que, também, promovam o bem-estar emocional dos trabalhadores. Estudos têm demonstrado que ambientes laborais que priorizam a saúde mental dos trabalhadores apresentam menores taxas de absenteísmo e maior satisfação entre os trabalhadores.

b) Adaptação às novas realidades laborais

Com o crescimento do teletrabalho e das plataformas digitais, as empresas vêm enfrentando novos desafios. Por exemplo, como garantir a ergonomia adequada em ambientes domiciliares, ou como monitorar e promover a saúde dos trabalhadores à distância. A nova NR-1 oferece um guia que auxilia as empresas a desenvolverem políticas que atendam às especificidades do trabalho remoto, garantindo que a segurança e saúde sejam priorizadas, independentemente do local de trabalho.

c) Cultura de segurança

A atualização fomenta o desenvolvimento de uma cultura organizacional focada na segurança. Quando todos os trabalhadores — desde a alta gestão, até os operacionais — reconhecerem a importância de sua responsabilidade em SST, cria-se um ambiente colaborativo e proativo. A implementação de práticas de segurança torna-se uma função compartilhada, gerando maior engajamento e comprometimento de todos.

d) Redução de acidentes e doenças

A modernização da NR-1 tem como objetivo a mitigação de acidentes e de doenças relacionadas ao trabalho. Ao tornar as diretrizes mais claras e interconectadas, espera-se que as empresas realmente apliquem medidas mais eficazes de proteção à saúde dos trabalhadores. Isso não apenas reduz o sofrimento humano, mas também promoverá ambientes mais seguros e sadios, com consequências diretas na produtividade, na qualidade dos serviços e na satisfação dos trabalhadores.

e) Fortalecimento da imagem corporativa

Empresas que demonstram compromisso com a SST se destacam no mercado. O fortalecimento da responsabilidade social corporativa não só melhora a imagem das empresas, mas também atrai talentos e clientes que valorizam a ética e a preocupação com o bem-estar dos trabalhadores. A adoção proativa da nova NR-1 poderá gerar um diferencial competitivo e significativo para as empresas, além de promover ambientes de trabalho saudáveis.

f) Melhoria no clima organizacional

Ambientes de trabalho que priorizem a segurança e saúde dos trabalhadores geram clima organizacional muito mais positivo. Trabalhadores que se sentem seguros e valorizados tendem a estar mais satisfeitos com seu trabalho, resultando em aumento de produtividade e de qualidade dos serviços e maior engajamento com os objetivos corporativos. Empresas com bom clima organizacional apresentam menor turnover, economizando em custos relacionados à rotatividade e recrutamento de trabalhadores.

g) Adaptação às normas internacionais

Com a globalização da economia, a competição internacional exige que as empresas se alinhem às melhores práticas do mundo todo. A atualização da NR-1 não só adéqua a legislação às exigências locais, mas também a integra a padrões internacionais, facilitando a atuação de empresas brasileiras em mercados globais, promovendo práticas laborais mais justas e seguras.

Mas é certo que, embora a atualização da NR-1 traga benefícios significativos para os trabalhadores e para as empresas, a implementação de suas novas diretrizes apresenta desafios, que precisam ser enfrentados por todos os envolvidos (empresas, trabalhadores e governo). É importante e necessário que todos se prepararem para esses desafios, garantindo que a transição ocorra de forma eficaz e harmoniosa. Abaixo, estão alguns dos principais desafios.

a) Capacitação dos profissionais

A formação e capacitação dos profissionais de SST são essenciais para garantir que as novas diretrizes da NR1 sejam compreendidas e aplicadas de forma eficaz. O treinamento deve ser contínuo e adaptável, refletindo as mudanças rápidas nas normas e nas práticas de trabalho.

b) Resistência cultural

A transformação de uma cultura organizacional enraizada em métodos antigos e ultrapassados exige tempo e estratégias. Algumas dificuldades podem surgir, como a resistência de setores que já têm práticas consolidadas, mas, fora da atual realidade. Para minimizar resistências à aplicação dos novos comandos da NR1, iniciativas de comunicação clara e envolvimento dos trabalhadores no processo de mudanças são fundamentais.

c) Recursos financeiros e materiais

A adoção das novas práticas trazidas pela nova NR1 pode exigir investimentos financeiros significativos, especialmente para pequenas e médias empresas. Para facilitar essa transição, governo, entidades de classe e associações precisam oferecer apoio e incentivos que auxiliem em melhorias das condições de segurança e saúde no trabalho.

d) Desinformação ou falta de conhecimento

Algumas empresas podem não estar cientes das modificações trazidas pela nova NR1 ou interpretar de forma inadequada a nova norma. Isso torna a comunicação e a disseminação de informações precisas e acessíveis uma tarefa importante, para garantir que todos os empregadores, trabalhadores e líderes estejam cientes das novas responsabilidades.

e) Complexidade na aplicação das novas diretrizes

As novas diretrizes da NR1, por serem amplas e variadas, podem introduzir complexidades na sua implementação nos mais diversos setores da economia. Isso exige que as empresas desenvolvam soluções criativas e adaptativas para implementá-las de maneira que se ajustem às suas realidades operacionais e culturais.

Em conclusão a esse breve artigo, pode-se dizer que a atualização da Norma Regulamentadora nº 1 marca um passo decisivo em direção a ambientes de trabalho mais seguros, saudáveis e adaptados às realidades contemporâneas. Com suas novas diretrizes a NR-1 não somente responde às transformações no mundo do trabalho, mas também antecipa futuros desafios, promovendo uma abordagem proativa na proteção da saúde dos trabalhadores.

À medida que o panorama do trabalho continua a evoluir, a NR-1 permanece como um recurso vital para a promoção de uma cultura de segurança, que envolva todos os empregados de uma empresa.

Portanto, é imprescindível que empresas e profissionais de SST se preparem para essa transição, buscando não apenas a conformidade legal, mas um comprometimento ético e social com a segurança e a saúde dos trabalhadores. Essa visão de futuro permitirá que o Brasil caminhe em direção a ambientes de trabalho mais justos e seguros, em respeito à dignidade dos trabalhadores.

Por fim, o compromisso com a segurança e saúde no trabalho não deve ser visto como mera obrigação legal, mas também como valor intrínseco de qualquer organização que aspire a ser moderna, responsável e sustentável. O sucesso em garantir ambientes de trabalho seguros está diretamente vinculado ao bem-estar e à saúde dos trabalhadores e, consequentemente, à prosperidade das empresas e da sociedade.

Autores

  • é professor titular do Centro Universitário UDF/Mestrado em Direito e Relações Sociais e Trabalhistas, membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, doutor em Direito das relações sociais pela PUC-SP, consultor jurídico, advogado, procurador regional do Trabalho aposentado e autor de livros jurídicos, entre outros, Ação Civil Pública na Justiça do Trabalho.

  • é mestre em Direito pela Unimep-Piracicaba (SP), especialista em Direito do Trabalho pela PUC-SP, professor da Fatec Campinas, advogado, e membro da Associação Brasileira de Pesquisadores (as) Negros (as) (ABPN).

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