Interesse Público

Quem monitora e avalia políticas públicas?

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1 de maio de 2025, 8h00

A República Federativa do Brasil age para alcançar seus objetivos (nos termos do artigo 3º da Constituição: construir uma sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos) predominantemente por meio de políticas públicas. Sinteticamente, é possível considerar políticas públicas como programas de ação governamental para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados, regulados normativamente em graus variados [1].

Em análise simplista, é possível afirmar que se os objetivos da República não estão sendo perseguidos ou alcançados com a intensidade que a sociedade precisa e espera, há algum problema ligado às políticas públicas. Em se tratando de processos complexos, com participação de atores variados, é necessário que existam instrumentos que permitam a correção de rumos, o aprendizado institucional e a busca de eficácia e efetividade. Trata-se de exigência ligada ao uso eficiente dos recursos públicos e também ao compromisso cogente da administração pública com o respeito aos fundamentos da República e alcance dos seus objetivos.

A figura explicativa conhecida como ciclo das políticas públicas contribui para a compreensão do processo, em sentido amplo: com maiores ou menores diferenças, as fases costumeiramente identificadas na literatura são identificação do problema, inserção na agenda governamental, desenho das possíveis soluções, decisão, implementação da solução escolhida e avaliação. Entremeando todas as etapas do processo se encontra o monitoramento — não se trata propriamente de uma fase, mas de um instrumento utilizado para gestão, implementação e acompanhamento das ações planejadas.

Monitoramento, avaliação, fiscalização e controle — em nossa busca pela compreensão de quem faz o quê para que as políticas públicas possam ser eficientes e eficazes, é importante verificar o enquadramento constitucional dessas atividades. Isso pode ser feito, inicialmente, com uma busca (um “control + F”) pelas palavras citadas, com o foco centrado na ligação direta com políticas públicas, com o seguinte resultado:

Monitoramento – a) a sociedade tem participação assegurada no monitoramento das políticas sociais (artigo 193, parágrafo único), e b) as leis orçamentárias (plano plurianual, lei de diretrizes orçamentárias e lei orçamentária anual) devem observar, no que couber, os resultados do monitoramento (artigo 165, §16).

Avaliação – a) a sociedade tem participação assegurada na avaliação das políticas sociais (artigo  193, parágrafo único), e b) as leis orçamentárias (plano plurianual, lei de diretrizes orçamentárias e lei orçamentária anual) devem observar, no que couber, os resultados da avaliação (artigo 165, §16); c) Os órgãos e entidades da administração pública, individual ou conjuntamente, devem realizar avaliação das políticas públicas (artigo 37, §16) e d) o sistema de controle interno deve avaliar o cumprimento de metas previstas no PPA, a execução dos programas de governo e dos orçamentos, além de avaliar os resultados da gestão orçamentária, financeira e patrimonial da administração, além da aplicação de recursos por entidades de direito privado (artigo  74).

Fiscalização e controle – a) a sociedade tem participação assegurada no controle das políticas sociais (artigo 193, parágrafo único); b) o Legislativo e os Tribunais de Contas, com tarefas específicas, realizam o controle externo por meio de atividades de fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, apoiados pelo controle interno (artigos 71, 71 e 74).

Salta imediatamente aos olhos a presença da sociedade em todas essas atividades. Trata-se de consequência do fato de a sociedade ser, ao mesmo tempo, titular e destinatária de toda e qualquer forma de poder.

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Monitoramento e avaliação são processos distintos, mas complementares, sem contornos excludentes. O monitoramento fornece a base empírica e operacional para ajustes táticos durante a implementação das políticas, enquanto a avaliação visa uma análise estratégica, pois seus resultados podem influenciar decisões sobre continuidade, expansão ou cancelamento de programas [2]. Retomando a figura do ciclo, é possível perceber que a avaliação – até mesmo pelo sentido que a palavra costuma despertar – é geralmente retratada na fase final do processo. Entretanto, a avaliação pode ser vista como uma atividade permanente, realizada com diferentes propósitos e em diferentes momentos:  antes da implementação, para prever impactos e viabilidade (ex ante); durante a política, com base em dados parciais (executiva) e após a conclusão, medindo os resultados finais (ex post) [3].

Como fazer para que a sociedade exerça, de fato, o protagonismo que lhe conferiu a Constituição no monitoramento, avaliação e controle das políticas públicas? A resposta a essa pergunta pode ser buscada com a análise de aspectos políticos, sociais, econômicos e jurídicos. Por enquanto, basta retomar o resultado da busca feita na Constituição para reconhecer aos órgãos e entidades públicas identificados o dever de qualificar e instrumentalizar o controle social, atuando para incrementar transparência e participação.

Participam desses diferentes momentos tanto os órgãos e entidades responsáveis pelo planejamento e implementação de políticas públicas quanto aqueles responsáveis pelo controle — interno e externo — da administração pública. Nesse sentido, deve-se exigir especialmente dos tribunais de contas a produção de informações e análises úteis para a primazia cidadã. Isso deve ser feito sobretudo para permitir o aprendizado institucional por meio das leis orçamentárias — se espera que o cumprimento dos deveres públicos de monitoramento e avaliação, com a posterior comunicação ao Legislativo, permita o debate parlamentar e social mais qualificado a respeito das ações orçamentárias necessárias para a eficácia das políticas públicas.

 


 

[1] BUCCI, Maria Paula Dallari. Fundamentos para uma teoria jurídica das políticas públicas. 2.ed. rev. E atual. São Paulo: SaraivaJur, 2021.

[2] BONIFÁCIO, Robert; MOTTA, Fabrício. Monitoramento e avaliação de políticas públicas no Brasil: abordagem conceitual e trajetória de desenvolvimento jurídico e institucional. Revista de Direito Econômico e Socioambiental, Curitiba, v. 12, n. 2, p. 340-371, maio/ago. 2021. doi: 10.7213/rev.dir.econ.soc.v12i3.28653

[3] Paulo Januzzi define avaliação como o “conjunto de procedimentos técnicos para produzir informação e conhecimento, em perspectiva interdisciplinar, para desenho ex-ante, implementação e validação ex post de programas e projetos sociais, por meio das diferentes abordagens metodológicas da pesquisa social, com a finalidade de garantir o cumprimento dos objetivos de programas e projetos (eficácia), seus impactos mais abrangentes em outras dimensões sociais, ou seja, para além dos públicos-alvo atendidos (efetividade) e a custos condizentes com a escala e complexidade da intervenção (eficiência)” (JANNUZZI, Paulo de Martino. Avaliação de Programas Sociais em uma perspectiva sistêmica, plural e progressista: conceitos, tipologias e etapas. REVISTA AVALIAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, v. 18, p. 38-61, 2020).

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